Lucas
Marina continua sem dizer nada. Estou com vontade de rir da situação, pois acho que ela é do tipo de garota que não sabe lidar com momentos como este, em que ela é literalmente posta contra a parede. Vejo uma lata de lixo próxima a nós e jogo a embalagem do chocolate lá dentro. Eu já sabia que iria sujar as minhas mãos, por isso coloquei dois lenços de papel no outro bolso para poder limpá-las. Ofereço o outro a ela, que aceita, mas ainda sem me responder.
— Obrigado. Lucas, ainda é cedo para falarmos de amizade, não acha? — ela diz por fim.
— Claro. Tudo em seu tempo, Marina. Não querer ser minha amiga é um direito seu.
— Eu não disse isso.
— Eu sei. Só quis dar uma de coitadinho.
Rimos ela levanta-se primeiro.
— Preciso voltar e ajudar a minha mãe. Sei onde você mora, então talvez nós nos esbarremos por aí.
— Espero que sim. E também espero que você me dê uma resposta. Mas sem pressão, ok?
Ela assente e se despede. Antes me perguntou se eu iria conseguir voltar e eu disse que sim. Sou ótimo em decorar caminhos. Ela vai para um lado. E eu, para o outro. Atravesso a pista novamente e a vejo caminhar. Neste momento estou sentindo algo que nunca senti antes. Não é fome e nem sede. Muito menos medo. É algo que é concreto, eu tenho certeza. Meu coração está batendo sem parar e eu nem corri. Sorrio ao vê-la de costas no meio de muitas pessoas e volto para casa.
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À tarde enquanto assisto TV com meu irmãozinho, meu pai aparece e coloca seu paletó no braço de sua poltrona verde e senta-se, aparentemente cansado. Aceno e ele faz o mesmo. Rapidamente ele se levanta e toma Luís em seus braços, que ri um pouco. O desenho que está passando em algum dos canais da TV a cabo é muito interessante. Mas não consigo parar de pensar nela. Por que isso está acontecendo, afinal de contas? Nos conhecemos mais cedo e conversamos por alguns minutos. Até dividi meu chocolate com ela. Mas por que raios ela não sai do meu pensamento?
É como se ela fosse uma atmosfera que me mantivesse preso. Ou parte do ar que meus pulmões necessitam. Ora, ela é tão bonita. Parece uma atriz. Uma atriz global que não me lembro o nome, mas que atua em novelas sempre que possível. Marina é o tipo de garota que poderia trazer fim ao mal que assombra o mundo. E ela é tão simples e humilde. Por que estou sentindo vontade de me perder dentro de seu mundo e nunca mais sair de lá? Nem sei se lá é habitável, mas eu seria um náufrago sem arrependimentos. O que está acontecendo comigo?
Volto à tona quando minha mãe aparece e conversa com meu pai. Ela me chama e eu rapidamente coço os olhos.
— Senhora?
— Não é nada, filho. Só achei que você estava fora de órbita.
E eu realmente estava. Ainda estou.
— Ele está todo bobo assim por ter encontrado o bendito sétimo volume, querida. — por isso também pai, mas há outra coisa. Porém não respondo e meu pai me pergunta: — Não é isso, filho?
— Sim, isso mesmo.
Estou um pouco sem graça. Por quê? Eu nunca me senti assim antes por causa de ninguém.
— Vou me deitar um pouco antes do jantar. Com licença. — subo as escadas e apanho um brinquedo do chão e o coloco próximo ao corrimão.
Entro em meu quarto e me deito. É como se tudo houvesse parado. Pego uma revista sem olhar para manter um suspense. É o terceiro volume de Homem-Aranha. Que já li tantas vezes.
Eu me pergunto o que Marina está fazendo agora mesmo.
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Um Amor Em 94
RomanceEm algum lugar do Brasil, 1994. Marina Lopes é uma bondosa garota de 17 anos que sonha em se tornar jornalista e cobrir uma Copa Do Mundo. Administra com a mãe uma pequena banca de revistas que já vira dias melhores. Fã de música internacional, a jo...