A outra

DELEITE E DESPRAZER

Ainda não tenho a sensação de lar na casa de meus pais, tudo é estranho, como tê-lo ao meu lado no carro durante a volta para casa, conversando e interessado em saber da minha vida, percebo o quanto envelheceu, por muitas vezes enquanto fala mantém os olhos fechados, outras repousa a cabeça na porta do carro.

Apesar de ele como pai não ser flexível, as vezes até severo quando se fazia presente em minha vida, não via isso como defeito, sua ausência e sua atenção excessiva a minha mãe sempre me incomodou. Ter sua atenção nem que fosse por pouco tempo para mim é puro deleite. Ao estacionar o veículo na lateral da casa, de onde se tem a visão da cozinha. Não deixo que ele vá para o quarto sem jantar.

-Vamos comer antes de subirmos para nossos quartos e não aceito sua recusa como resposta.

-Sim, senhorita. Minha cabeça dói mais que meu estômago. -escuto pela primeira vez se queixar.

Dando atenção às suas reclamações, ordeno que me acompanhe para a cozinha, onde vejo a Mariana debruçada em seu notebook concentrada que nem percebeu nossa entrada, toco em seu ombro.

-Desculpa, não queria assustá-la, onde estão as crianças, a casa está em silêncio.

-Estão com o Dominic, quer ajuda? -ela levanta ao me ver indo para o fogão.

-Você teria algum remédio para dor de cabeça? Meu pai precisa relaxar e dormir depois de jantar. -falo pausadamente para que entenda o que realmente eu falo.

-Claro, vou pegar agora. -responde e pisca o olho antes de ir ao seu quarto.

-Filha, não põe muita comida. -ele senta à mesa com um copo d'água.

A Mariana retorna e põe o remédio na sua mão pedindo que tome antes da refeição, ele toma sem nos questionar. Por um momento me senti satisfeita por persuadi-lo a comer e descansar um pouco.

-E os meus bebês comportaram-se ou fizeram alguma traquinagem?

-Meus netos são uns anjos e lindos!

Olho para o homem à minha frente gesticulando com o talher enquanto fala dos netos, convencida que é uma mera coincidência, pois o calmante que tomou ainda não fez efeito.

-Concordo seu Joel e ainda posso acrescentar que são uma boa influência para o Luís, nem reconheço o menino calado e sem alegria que era antes.

Não consigo evitar o sorriso ao ouvi-los concordando e meu pai falando que repassou para minha mãe a energia que recebeu dos netos. Parecendo saciado agradece e vai para o quarto.

-Obrigado, não queria fazer isso, mas ele necessita dormir.

-Ele está andando arrastado de tão cansado, mas com certeza irá dormir essa noite bem e amanhã acordará renovado.

-Você estava estudando? Eu vi na tela texto em inglês, não te atrapalhamos?

-Não, estava revisando algumas aulas -fala com um grande sorriso indo para a frente do seu notebook e acrescenta. -Dominic me dispensou e ficou com as crianças por isso não perdi tempo, aproveito cada momento para aperfeiçoar meu inglês.

Dominic deve gostar disso nela, pois admira pessoas que buscam conhecimento, ele fez o mesmo comigo.

-Eu morei fora do país por mais de um ano, depois mando para seu email algumas aulas se quiser.

-Adoraria dona Emily, muito obrigada. Por isso os gêmeos falam muitas palavras em inglês, eles estavam ensinando o Luís.

Enquanto lavo os pratos dou dica de como estudar e ela tira algumas dúvidas.