Quarenta e oito

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Tinha demorado três chamadas da lista de espera, mas Bia e Julie finalmente haviam sido convocadas para a matrícula na faculdade! Correndo com os documentos e a ansiedade a mil, o tão temido momento pelo grupo enfim havia chegado: por ter escolhido uma faculdade diferente dos demais, Bia iria mudar para a cidade de São Paulo, passando a ficar a 2h de distância de toda a banda.

-São só duas horas, gente... E não é como se vocês não fossem toda hora para lá. - Bia tentou explicar para os amigos na noite de despedida dela.

Despedida essa que estava acontecendo em mais uma edição da festa do pijama no apartamento dos garotos.

-Bia, se fossemos toda hora para lá, Félix e Manu se veriam com frequência, e não teriam essa coisa estranha que eles têm. - Martin constatou o óbvio, bebendo do seu refrigerante enquanto se esparramava pelo colo de Shizuko, que não dava a menor importância para ele.

-Eu preciso concordar com ele, Bia. - Félix não pestanejou. - São situações diferentes, mas preciso dizer que somos muito mais acostumados a sua presença do que a de Manu.

-Você está acostumado com a presença dela, Félix. - Martin apontou mais uma vez, não recebendo uma réplica em resposta.

Quer dizer, tinha uma diferença enorme entre ser amiga e estar acostumado com a sua presença - diferença essa que beirava a linha do perigo. Todos eles sentiriam falta de Bia nas reuniões e nos finais de semana, mas ser retirado de uma presença constante com quem já estava acostumado por quase dois anos, alguém que era muito mais presente em sua vida do que a própria namorada?

-A gente pode não se ver todo dia mais, mas você ainda vai voltar para cá, e nós com certeza vamos viajar até São Paulo... - Julie tentava segurar as lágrimas junto de Shizuko, mas estava difícil.

Também pudera, estudavam juntas desde o ensino fundamental! Aquilo era para ser uma festa, mas estava se transformando em um clima de velório muito rápido - e tudo o que os garotos menos queriam era participar de um coletivo desse jeito, ainda mais quando Bia estava vivíssima.

-Vocês precisam ver por um ângulo diferente, gente. - Daniel opinou. - Todos nós já fizemos muito sacrifícios pela banda, não é? Eu apanhei da sanguessuga para conseguir voltar com a Apolo, vocês aguentaram todo aquele tempo de pausa, morremos pela banda e ressuscitamos por ela. A Bia só está fazendo o mesmo, mas em uma escala muitíssimo menor. Quando ela se formar, vai poder começar a nos produzir.

O discurso era todo muito bonito, mas Daniel só tinha se esquecido de duas coisas.

-Você sofreu violência doméstica, Daniel?! - Beatriz ficou horrorizada.

-Vocês sofreram um acidente de quase morte?! - E Shizuko quase teve uma síncope nervosa.

Félix e Martin apenas fecharam os olhos, preocupados sobre como Daniel se livraria daquela. Estavam todos reunidos na sala do apartamento deles naquele sábado à noite, com comida chinesa espalhada pela mesinha de centro (agora o apartamento já completamente mobiliado), e se ele não se consertasse naquele momento, teriam um problemão pela frente.

Um término regado a pavor profundo, com um baixista sendo arremessado do colo em que estava deitado, para ser mais exata.

-Não, você resolve isso sozinho. - Julie avisou, deixando claro que não mentiria para Shizuko.

Respirando fundo, Daniel tentou arrumar a confusão da melhor maneira que podia.

-O acidente pode ser interpretado figurativamente nesse caso, Shizuko. Todos nós nos sentimos mortos quando nossos pais morreram, e apenas voltamos a viver para a banda com Julie. - Daniel rezava para que aquilo fizessem sentido, já que era Martin quem mentia deslavadamente.

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