Rain ficou em silencio enquanto eu narrava o pequeno e incômodo encontro com Jean, com os braços cruzados na frente do corpo, os músculos dos ombros e dos braços ridiculamente ressaltado por baixo da blusa preta de manga comprida era uma linda e inconveniente distração.
Ele apenas balançava a cabeça de vez em quando com as feições sérias na luz baixa que escapava pelas cortinas de seda.
Quando enfim terminei de falar encolhi um pouco os ombros como quem se desculpa.
Rain fez um muxoxo e se curvou novamente sobre a amurada, olhando lá embaixo alguns carros se movimentando na rua.
- Esse cara é um idiota mesmo - comentou em tom sarcástico. Mas então ele empertigou as costas e uniu as sobrancelhas, me olhando. - Espere aí - disse levantando as mãos - você ficou em dúvida.
Minha boca secou ao mesmo tempo que puxei mais as cobertas ao meu redor.
- Não Rain, é que... - tentei falar com a voz falhando levemente.
- Não, você ficou realmente na dúvida - ele deu um passo de leve pra trás e agarrou a borda da amurada. - Você considerou a possibilidade. Por isso as perguntas. Por isso essa atitude estranha.
- Eu só queria entender o que foi que aconteceu - tentei explicar.
- E você simplesmente deduziu que o problema era eu ? - disparou magoado. - Achou que eu poderia ter sido um marido agressivo mesmo quando há meses eu disse que não suportava homens covardes.
Fiquei imóvel no mesmo lugar. Era realmente ridículo. Era totalmente ridículo. Eu via a expressão enjoada de Rain toda vez que estávamos na instituição e ele me ajudava a tomar notas dos relatos das mulheres, quando elas contavam o que lhes fora feito, a forma como seus maridos as espancavam, Rain sempre parecia prestes a vomitar. Sempre parecera prestes a abraçar as mulheres também, apesar de nunca ter sequer se aproximado.
Fizera apenas uma vez quando ele disse a mulher que sentia muito e ela simplesmente cairá no choro em sua frente e quando ele passou a mão em seu ombro para tranquiliza-la ela se entregara aos braços dele. Agradecendo depois pelo apoio.
Nada daquilo fora ensaiado ou pra impressionar ninguém. Era a reação natural de um ser humano que sentia realmente por aquelas mulheres. Como eu sentia. Como todos ali sentia.
- Quando você diz assim soa pior do que parecia ser - justifiquei sem jeito.
- Você me conhece Lis, mas mesmo assim duvidou de mim.
Ele parecia realmente decepcionado. Com raiva. Seus passos andando em círculos, o barulho dos contornos raspando no chão, foram os únicos sons além daqueles vindo da rua muito longe.
- Eu achava que conhecia o meu ex-marido e quando percebi ele estava me traindo e tinha um filho que eu desconhecia - murmurei baixinho.
Rain balançou a cabeça e seus olhos brilharam um pouco.
- Não venha com essa desculpa ridícula- disse parecendo ainda mais ofendido. - Não sou como aquele filho da puta. Você o conhecia muito bem, conhecia sua índole podre, só ignorou. Escolheu ignorar.
- Achei que você não me julgasse - retruquei com voz firme.
- Você me julgou Lis, mesmo depois de tudo. Depois de tudo que te contei você me julgou por algo que eu nunca seria capaz de fazer.
Engoli em seco mais uma vez, sem encará-lo. Mas sentia seus olhos em mim.
- Eu não sabia o que pensar.
- Não é porque o seu ex é um porco da pior espécie que todos os outros homens do mundo também são. Eu sinto muito que você tenha que ter passado por tudo Lis, sinto mesmo, mas entenda que eu não sou como ele.
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Flores para Lis
RomanceLis é uma das mais renomadas advogadas de sua cidade, com éticas de trabalho pessoais que conquistou a confiança de seus clientes, junto de seus outros quatro irmãos advogados. Mas alguns deles parecem não mais compartilhar das mesmas opiniões. Uma...
