Eu ponderei por horas a fio se deveria ir para casa. Enquanto encarava o teto alto e branco do escritório, com a cabeça apoiada no encosto estofado da cadeira, discuti comigo mesma se eu deveria enfrentar logo o que estava por vir.
Decerto não era nada bom.
Mas eu sabia de uma coisa, a partir de hoje minha vida não seria mais a mesma. Eu tinha demorado muito tempo para enxergar, mas agora a decisão estava mais clara do que nunca. Mesmo que isso quebrasse meu coração. Mesmo que a situação era pior do que nunca para eu tomar essa decisão. Mas eu não seria feita de boba de novo. Eu não aceitaria ser enganada, não com algo que era tão importante para mim.
E ele sabia disso. E pensar que Jean não deu a mínima se eu ficaria chateada, se isso mexeria comigo de alguma forma... Era devastador.
Virei o pescoço, que já estava dolorido por ficar na mesma posição, olhei para janela, e contemplei o céu noturno com algumas nuvens cinza chumbo. Distraidamente até me perguntei se iria chover.
O escritório estava escuro e silencioso quando enfim deixei minha sala e caminhei para o elevador. Cada ruido parecia ampliado com o quietude do local vazio. Tão diferente do dia que tinha conversar para todo lado, juntamente como barulho de teclados de computador e até mesmo farfalhar de papeis.
Eu não sabia o que diria quando chegasse em casa. Não sabia como ele reagiria. Ele pediria desculpas isso eu sabia. Talvez pedisse que eu reconsiderasse, e sinceramente eu tinha medo de ouvi-lo. Eu tinha medo que ele me convencesse a perdoá-lo. Como ele sempre fizera.
Eu quase não percebi o trajeto até em casa. Dirigi o carro automaticamente, até parar na garagem de casa, onde o carro de Jean já estava estacionado.
Os grandes portões de ferro se abriram com um rangido baixo e eu estacionei na minha vaga.
Enquanto subia os degraus para a porta da frente procurei as chaves na minha bolsa. Quando encontrei, enfiei na fechadura e suspirei antes de gira-la com um clique.
Estava silencioso, e o cheiro recente de limpeza me alcançou. Tinha um ruído pulsante insistente. Ou talvez fosse dentro da minha cabeça.
- Onde você estava ? - perguntou aquela voz que eu menos queria escutar naquele momento. Vinha da poltrona mais próxima à janela, a que estava mais na penumbra.
Em qualquer outro momento eu iria querer chegar em casa depois de um dia de merda e só ouvir a voz do meu marido. Sentir seu cheiro e deitar em seu peito. Mas não hoje, talvez nunca mais.
Todas as vezes que eu fechava os olhos eu escutava ele dizendo como eu não sabia de nada. Como eu era uma menina mimada e cheia de vontades., Escutava Ray dizendo para ele colocar limites em mim.
- Onde estava Amarílis. Sabe que horas são ? - insistiu, parecia até um pouco irritado.
- Eu estava trabalhado - falei.
- Até às 22 horas ?
- Só você pode chegar tarde em casa ? - retruquei.
Joguei a bolsa no sofá, chutei os sapatos de salto agulha para fora dos pés e fui direto para cozinha. Peguei a garrafa de vinho na geladeira que estava pela metade e enchi um copo. Eu ia precisar.
- Ross disse que você tinha saído fazia horas - insistiu ele.
- Pedi que ela dissesse - dei um gole no vinho doce e gelado.
- Por que você faria isso ? - perguntou, ainda da poltrona. Ainda irritado.
Respirei fundo, cansada.
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Flores para Lis
RomanceLis é uma das mais renomadas advogadas de sua cidade, com éticas de trabalho pessoais que conquistou a confiança de seus clientes, junto de seus outros quatro irmãos advogados. Mas alguns deles parecem não mais compartilhar das mesmas opiniões. Uma...