4. Preparativos

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POV Becky

Eu passei a semana seguinte à minha ligação com Nam me preparando para sair por algum tempo de Londres. Depois de muito pensar na proposta da minha amiga, achei que seria uma boa para mim. Eu amava a minha profissão, amava as coisas boas que eu conseguia alcançar com ela e através dela, mas os encargos pessoais que ela trazia pesavam em mim também. Eu sempre fui assim, sempre internalizei muito as coisas e eu sabia que seria uma boa solução tirar "férias" daquela realidade pesada que era a advocacia criminal.

Dediquei meu dia a avançar defesas e alguns documentos, adiei alguns compromissos que podiam ser adiados e passei muitos casos para colegas advogados de confiança. Não enrolaria nenhum dos meus clientes.

O mais difícil foi encontrar alguém para me ajudar a assumir o compromisso que eu havia feito com a família de Charlie. Eu sabia que a maioria das pessoas não ia entender e ia até me julgar por aquilo. Eu sabia que aquilo não era exatamente profissional, mas eu não ia voltar atrás por nada. Decidi que a melhor solução seria agendar entrega de compras, já que Mary nunca aceitou nenhum dinheiro que tentei lhe dar. Fui visitá-las duas vezes naquela semana e em uma delas expliquei que sairia do País por um tempo, mas que ia ria continuar ajudando.

"Não precisa, Rebecca, a gente dá nosso jeito, minha filha," disse do jeito humilde que ela sempre me tratava.

"Já está tudo organizado, a senhora não precisa se preocupar," respondi. "Eu só vou precisar que a senhora me faça uma coisa e espero mesmo que a senhora não seja tão teimosa assim, ein?" falei me finginndo de brava e ela soltou uma risada.

"Eu sou teimosa feito uma mula, Becky, você bem sabe disso!"

"Mas tô falando sério, Mary. Eu não vou estar aqui e você sabe que eu me preocupo..." falei com verdade.

"Eu sei, minha filha. Me diz que promessa é essa que você quer, que eu prometo," disse resignada me fazendo sorrir.

"Eu quero que quando chegue a conta de energia e de água você me envie para eu pegar. E..." falei rapidamente quando vi que ela iria me interromper com um protesto. "Por favor, você sabe que eu me preocupo e eu preciso estar concentrada nessa viagem, Mary."

Fiz um pequeno drama porque sabia que isso daria certo com a mulher. No final ela acabou concordando em me mandar as contas e eu fiquei mais aliviada. Eu ia para Bangkok ajudar a amiga de Nam e eu queria me dedicar totalmente aquilo. A mulher parecia muito importante para a minha amiga e eu não queria decepcioná-la. Não podia estar lá dando o meu melhor, se minha cabeça estivesse aqui em Londres o tempo inteiro.

"Antes de eu ir, eu vou tentar arrumar um jeito de você ir ver o Charlie, tá certo?" prometi para a mulher mais velha, que com felicidade pegou minhas mãos na sua e apertou.

"Foi Deus que enviou você para gente, minha filha!" ela disse emocionada e minha garganta se fechou. Eu estava longe de ser uma benção divina, pensei com amargura.

NARRADOR

Depois da briga que tiveram aquele dia, Kirk havia voltado para casa e proferido várias desculpas para Freen. Era sempre assim. Eles se desentendiam, ele falava palavras duras, saía batendo as portas e voltava arrependido. Freen já estava desgastada daquela rotina infeliz e sem fim.

Toda noite que Kirk estava em casa, a mulher se deitava ao seu lado na cama e o observava dormir. Não sabia como o homem conseguia sempre dormir em paz e tão rapidamente. Ela mesma passava horas a fio acordada com a cabeça a mil, se perguntando quando que a vida dela tinha se tornado aquela bagunça. Olhava para o rosto que um dia já amou muito e se perguntava em que exato momento olhar para Kirk tinha se tornado tão difícil. Em que momento todo aquele amor jovial tinha se tornado nesse imenso ressentimento?

Na maioria das noites ela não aguentava nem ficar ali e acabava saindo a passos leves do quarto que dividiam e ia em direção ao quarto da filha. As cores leves, o cheiro de criança e os sons que Li fazia durante o seu sono a acalmavam. Ela sentava na cadeira de balanço que tinha ali desde o tempo que o quarto era um berçário. Era onde ela embalava a filha em seus braços, onde a alimentava na maior parte do tempo e onde criou o laço mais bonito que já conhecera na vida. Ser mãe tinha feito dela uma pessoa melhor, Freen tinha certeza. Não entendia até hoje como Kirk não conseguiu se sentir assim. Ou ao menos algo parecido.

A mulher soltou um suspiro pesado e decidiu que não pensaria mais em Kirk. Durante a conversa com Nam, Freen tinha decidido que pensaria de verdade no divórcio e era isso que ela mais fizera durante essa semana que passou, e sinceramente tudo o que ela queria era um descanso de tudo. Queria pegar sua filha e levar para um lugar onde as duas pudessem ter paz. Ser felizes em paz. Mas quanto mais pensava nisso, mas sabia que teria um caminho árduo até que essa realidade se concretizasse.

"Mãe?" Freen se espantou de seus pensamentos com a voz baixa da filha a chamando.

"Oi, meu amor!" respondeu se levantando da cadeira e se aproximando da cama da filha em passos leves.

"Sonhos ruins?" a menina perguntou na inocência e Freen viu seus próprios olhos escuros a encarando de volta.

"Algo assim," respondeu.

Sem dizer nenhuma palavra, a menina levantou as cobertas e se arrastou para o lado em um claro convite para a mãe se juntar a ela na cama. Freen sorriu com o gesto carinhoso e atencioso da filha e não pensou duas vezes em se juntar a ela na pequena cama e passar seus braços pelo corpo pequeno, a abraçando gentilmente. Li, sem nem pensar, encaixou seu rosto no pescoço da mãe e voltou a dormir como em um passe de mágica. Freen absorveu o conforto que emanava da pequena em seus braços e não demorou a dormir, também pensando consigo: não importa o que venha a seguir, vai valer a pena.

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