Dalila de Oxum.

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Haviam certos momentos da vida de Beth em que tinha sono muito leve e esse era um deles. Tinha acordado da primeira vez no primeiro movimento que Dalila fizera e na segunda, a mesma coisa. Percebendo a claridade, demorou um pouco a abrir seus olhos e os fez, bem devagarzinho. A primeira imagem logo lhe obrigou a continuar fingindo estar dormindo somente para seguir espiando-a.

Acompanhou Dalila deitar de bruços e colar sua testa no chão, colocando uma mão na parte de trás da cabeça e a outra na parte do topo, repetia algo que parecia ser uma oração, mas em uma outra língua que deduziu ser Yorubá. Ficou ali por um tempo, naquela posição, sussurrando e tentando ser o mais silenciosa possível para não acordar a sua companhia, mas Beth já assistia a tudo com um breve sorriso. Era bonito, vê-la de branco, fazendo aquilo, seguindo com sua rotina, honrando sua fé.

Após fazer menção de se levantar, Beth rapidamente espremeu as pálpebras de novo, seguindo a acompanhar disfarçadamente. A mulher se sentou de pernas cruzadas e começou a fazer a amarração do seu ojá na cabeça, em seguida se ajustou em posição de lótus, fechou os olhos e passou a controlar sua respiração. Por ali ficou, completamente focada em sua respiração. Passou tanto tempo imóvel que Elizabeth que fingia dormir, acabou pegando no sono novamente e não a viu levantar de fato.

Quando acordou pela segunda vez, reparou que estava sozinha no quarto e que provavelmente tinha se passado muito tempo, bocejou enquanto esticava-se na cama ativando seus músculos. Suas narinas foram invadidas pelo aroma bem conhecido, o estômago deu sinal de vida o que lhe impulsionou a levantar ainda que cheia de preguiça, fez rapidamente sua higiene matinal e só foi seguindo confiando em seu olfato.

— Nossa que cheiro bom de café. — Expressou bocejando ao chegar na cozinha.

Se deparou com a moça que ainda usava o pano de cabeça, junto a uma blusa folgada branca e uma calça de dormir da mesma cor, estava descalça e coava o café que fumaçava espalhando o cheiro por toda a casa. Logo a loira deduziu que ela ainda estava de preceito ou tivesse alguma ritualística para cumprir.

— Que cheiro gostoso de comida. — Reforçou outra vez acariciando o abdômen e fez Dalila rir. Fazia um certo tempo que não se agradava assim por aromas, costumava não gostar muito de tudo o que cozinhava. — Bom dia. — Desejou educadamente meio sem graça, ainda tinha resquícios de sono em seu rosto.

Elizabeth tinha amado toda a calmaria que aquele lugar e o momento representavam, a simplicidade lhe encantava. O coador de pano, o chão lá fora de areia, as cercas, a porteira, as plantas, a horta, as telhas visíveis, o chão de dentro de cera vermelha, o fogão e a geladeira pequenos, a janela aberta para deixar a luz entrar, a cortina de pano amarrada, o sofá simples, os móveis já meio antigos, era tudo tão acolhedor e cada detalhe não havia passado despercebido.

Era um espaço grande, com área frontal e quintal. No terreno haviam duas casas, a que estavam ficando e uma outra toda fechada bem mais simples, mas que Beth desconfiava que não morava ninguém. Havia todo tipo de plantas, de pé de fruta, folhas para chá, até mesmo flores espalhadas pelo espaço.

— Bom dia, doçura. — Disse cantarolante, expressando um humor radiante. — Eu acabei de passar o café agora e fiz tapioca também, tem suco na geladeira e tem fruta ali. — Apontou para a fruteira e em seguida sentou à mesa,
servindo o café na xícara. — Vem comer.

— Isso daqui já está perfeito pra mim. — Beth aceitou o convite e não conseguia esconder o quanto estava empolgada com tudo, fazia questão de inalar escancaradamente os cheiros dos alimentos. Fazia tempo que não se sentia tão viva assim. — Desculpa não ter despertado para te ajudar a preparar tudo.

— Você estava cansada demais e não foi trabalhoso aqui. — Deu de ombros, bebendo o gole do líquido quente.

— De preceito ainda? — Foi se servindo meio envergonhada.

Olhos de mar, céu e estrelas - Lésbico.Onde histórias criam vida. Descubra agora