Ela estava acordada. Acordada o suficiente para sentir que o seu quarto estava iluminado, para ouvir os passos no seu chão de madeira, as janelas sendo abertas, os sons de roupa sendo tiradas, para o calor, para o peso que surgiu do seu lado e para identificar a mão que percorreu as suas costas de maneira carinhosa, tanto é que não a assustou.
Ninguém mais poderia ser, ninguém mais se aproximaria dessa forma.
— Bom dia. — Surgiu cantarolante, dessa vez mais de pertinho.
— Hum... — Veio de resmungo e um choramingo, enfiando seu rosto no travesseiro. — Não.
— Ih, quando ouço esse choramingo das duas, uma... — Informou pensativa, ainda arrastando suas unhas por cima do tecido do blusão que Beth vestia. — Ou você está muito manhosa, ou não está de bom humor... Espero que seja a primeira opção, porque eu posso resolvê-la. — Sugeriu roçando a ponta do seu nariz na borda da orelha dela.
— É as duas. — Informou se negando a levantar.
Queria muito ignorar os arrepios que lhe causavam, mas ela sabia fazer um carinho tão gostoso. Tinha algum tipo de feitiço em seu ser que tomava ligeiramente a mente de quem lhe fazia companhia, o cheiro dela já era capaz de tornar tudo mais agradável, até mesmo seu humor.
— Diga-me o que aconteceu. — Se afastou mais, ainda que sua vontade fosse se aproximar, seguia em seu carinho singelo nas costas. — Fiquei sabendo que você andava ansiosa demais. Novas situações no caminho, não é?
— Não vou me abrir pra você. — Beth se recusou, sentando na cama para encará-la.
Não recebeu um olhar de assombro, na verdade foi mais um fitar compreensivo. Ela nunca vinha agressiva, exceto nas vezes em que brigavam, ainda sim era alguém calma demais até em discussões.
— Achei que já tinhamos passado da fase de implicâncias. — Pontuou pensativa, amarrando seus cabelos.
— Eu posso querer ser rebelde às vezes, para tentar lhe arrancar alguma informação. — Cruzou os braços e ouviu uma gargalhada.
— A informação que precisa é que nós sempre voltamos. — Respondeu de maneira calma, cruzando suas pernas e repousando as mãos no joelho.
Odiava esses enigmas. Elizabeth sabia que a aparição da moça, e sua turma, significavam algo espiritual. Sempre tentava pegar alguma informação a mais durante os sonhos e apesar de não lembrar deles por completo quando acordava, não ia atrás daquilo que havia descoberto. Sempre era levada pela rotina e acabava perdendo na memória as informações fornecidas para que ela chegasse a algum mínimo ponto.
Em seu coração, de maneira extremamente escondida conscientemente, Beth sentia que algo grande lhe esperava, algo que não era da ordem física, mas mesmo assim negar-se a desvendar os tais mistérios eram sempre a sua saída.
Havia entrado em contato com o espiritual, mas somente pelo lado ruim que ele lhe trazia e por isso tinha pavor de ir mais adentro, porque achava que coisas ruins lhe rondavam e quando começasse a pesquisar por tal, tudo pioraria em sua vida e os tais seres se apresentariam para si. Isso era tudo o que não queria, afinal o não visto, também era o não sentido.
Carregava o pensamento que pessoas boas poderiam passar por grandes provas. Tinha uma visão totalmente deturpada da própria imagem, se achava alguém extremamente azarado e que dava má sorte a quem estava ao seu redor, quase como uma própria praga. Mas tinha plena noção que seu coração era muito bom e por isso pessoas que precisavam de direcionamento simplesmente brotavam em sua vida.
Entendia que poderia ser um dom, talvez, ajudar outras pessoas, mas que havia algo de muito errado em si. Sabia que tal dom vinha do espiritual, mas carregava o medo de justamente ir atrás dele porque imaginava que acender uma luz, também era se deixar visível para outras coisas que não eram do seu agrado.
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Olhos de mar, céu e estrelas - Lésbico.
RomansElizabeth desde a sua infância tem sonhos questionáveis com pessoas específicas a quem não conhece, mas a medida em que foi crescendo, receber a visita de uma determinada moça por meio dos seus devaneios tornou-se bem mais frequente. Como não podia...