Me espera.

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Haviam se encontrado como de costume, dentro do carro de Dalila após uma noite inteira em aula. Como sempre se atualizavam sobre seus dias, assim era quando não podiam dormir juntas, por esse motivo os encontros seguiam sendo no automóvel onde conversavam por um tempo e depois a mais velha deixava a aluna em casa, para logo em seguida pegar a estrada e seguir viagem para outra cidade.

— Você tá ouvindo o que eu estou falando? — Perguntou calmamente, nada agressiva, nunca era.

Rapidamente abaixou seu ânimo e parou para analisar a companheira que olhava fixamente para a janela, logo limpou os olhos e voltou-se a Dalila. Seria impossível não perceber que ela chorava, sua pele era branca demais e logo o nariz já se avermelhou.

— Não. — Respondeu respirando fundo. — Perdão, amor, não ouvi. — Confessou se sentindo culpada.

Eu ainda estou aqui
Perdido em mil versões irreais de mim
Estou aqui por trás de todo o caos
Em que a vida se fez...

— Tá tudo bem com você? — Lila franziu o cenho e a encarou tentando desvendar o mistério, preocupou-se de imediato ao assistir aqueles olhos azuis se enchendo de lágrimas. — Amor? — Pendeu a cabeça para o lado.

— O dono do apartamento foi lá hoje. — Iniciou tentando controlar sua voz que queria embargar. — Reclamou porque eu estava demorando de pagar e disse que o valor do aluguel aumentou. — Respirou fundo mais uma vez, preocupada porque seu salário tinha atrasado e para completar ainda não teria o valor completo para pagar, já que vivia no limite.

— Certo. — Confirmou, sem entender muito bem onde ela queria chegar.

— Você não tem cem reais para me emprestar? — Perguntou apelando para sua última saída, após muito enrolar por pura vergonha. — Eu devolvo assim que possível. — Prometeu com um olhar triste, era destroçante para o seu ego ter que fazer aquilo.

Um silêncio veio e sua companheira até pressionou os lábios, passando um braço por cima do ombro dela e trazendo-a para mais perto.

— Você sabe que não precisa mais estar passando por esse tipo de situação. — Informou insinuando algo e já ouviu o estalo de boca em reprovação.

— Eu tô falando sério, Dalila. — Resmungou um tanto irritadiça, em sua costumeira teimosia.

— Eu também estou falando sério, Elizabeth. — Bateu na tecla porque na sua cabeça tinham um relacionamento consistente e não haviam crises, o convite para que morassem juntas e arranjassem um meio em meio a rotina para seguirem convivendo, ainda estava de pé.

Mais silêncio, ela não respondeu.

— De quanto você precisa? — Lila se deu quase que por vencida, iria retornar com o assunto após.

— Cem reais. — Afirmou lembrando da informação.

— De quanto você precisa de verdade, Elizabeth? — Seguia a encará-la nos olhos, tinha comoção e empatia por sua companheira que estava de bochechas vermelhas e um comportamento acuado. Sabia que ela jamais pediria caso não precisasse de verdade e não lhe restasse mais nenhuma opção. — Vamos, eu sei que é organizada a ponto de já ter colocado todos os cálculos na ponta da caneta e ter reduzido até os gastos que não tinha como, para me pedir somente cem reais, se você pudesse, pediria menos ou não pediria nada. — Pousou sua mão na lateral do rosto da moça e começou a acariciar a bochecha dela com o polegar. — Cem reais dá para você ter o seu armário com alimentos que não sejam macarrão instantâneo de diferentes sabores para passar o mês todo? — Questionou ainda mantendo contato visual. — Dá para você ter outra proteína além de ovo no seu prato? Dá para você comprar um shampoo que seja do seu agrado e não estrague seus cabelos que são sensíveis? Dá pra você comprar verdura ou legume que complete sua refeição ao invés de ficar fazendo lanche porque é mais barato? — As lágrimas de Elizabeth já escorriam pelo rosto dela em um choro silencioso e dolorido.

Olhos de mar, céu e estrelas - Lésbico.Onde histórias criam vida. Descubra agora