jantar em (quase) família

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Kelvin

Entrei devagar no quarto de Antonella, observando ela de costas para a entrada, brincando com suas boneca e ursinhos.
– Antonella, por que você ta chorando? – ela pegou um ursinho, fazendo uma voz gossa.
– Eu estou triste porque não tenho papai e nem mamãe – imitou a própria voz com uma boneca.
– Não se preocupe – ela voltou com o ursinho – o titio Ramiro e o tio Kelvin podem ser seus novos papais
Ela pegou dois outros ursos, que representavam eu e Ramiro, aparentemente.
Antonella levou a boneca que a representava até o colo dos ursos.
– Papais, eu amo vocês – fez um barulhinho de beijo – também amamos você, Antonella
Quis interromper sua brincadeira para abraçá-la e tomar ela pra mim mas preferi não invadir sua privacidade. Bati de leve na porta e ela olhou para ver quem era.
Um sorriso instantâneo surgiu em seu rosto quando ela me viu.
Largou suas bonecas e correu até onde eu estava.
– Tio Kelvin! – exclamou, abraçando minhas pernas.
Ri e a afastei para conseguir ficar de joelhos no chão, abraçando-a com mais facilidade.
– Oi, princesa – deixei um beijinho em sua cabeça – te atrapalhei?
– Não, eu só tava brincando com as minhas bonecas
– E tava brincando de quê?
Ela pensou por uns segundos.
– De casinha... – mentiu.
Assenti, fingindo que acreditei na mentira.
– Adoraria brincar com você mas eu trouxe um presente
– Que presente?
Mostrei a caixa colorida que escondi atrás de mim e ela arregalou os olhos.
– O que é isso?
– Abre – entreguei para ela, que levou a caixa aos tropeços até a cama.
Quando pensei que ela abriria a caixa com determinação, ela volta correndo até mim, segurando a minha mão e me puxando até sua cama.
– Abre junto comigo, tio Kelvin
Sento na cama baixinha e a auxílio para abrir o presente, observando a expressão em seu rosto, a ansiedade se esvaindo e dando lugar à felicidade, à surpresa.
Ela suspirou, encantada.
– Você comprou pra mim?
– Comprei – assenti e ela tirou o unicórnio da caixa, com cuidado.
– Ele é perfeito – sorriu para a pelúcia, tocando com delicadeza os detalhes – eu sempre quis um desses, titio
– Agora você tem!
Ela colocou o animal com cautela na cama, pulando em mim para me abraçar.
– Obrigada, tio Kelvin
Abracei seu corpinho pequeno, sentindo o amor dela chegar até mim.
– De nada, princesa
Ela se afastou, voltando a admirar o unicórnio e tocar com dedinhos curiosos cada detalhe.
Ela apertou o botão, onde reproduzia um som que eu havia gravado no ato da compra.
Eu não sabia muito o que dizer, então o lindo unicórnio se limita à frase "oi Antonella, você é especial".
Um pouco estranho por ser minha voz, mas parece que ela amou.
– Brinca comigo? – ela me olha e logo percebo que eu faria qualquer coisa se ela me redirecionasse esse olhar em especial.
Peguei o ursinho mais próximo de mim e entrei em sua brincadeira, afinando até a voz para ser meu "personagem" na história.
Não muito tempo depois, Ramiro bate na porta do quarto, nos avisando que o jantar já estava servido.
A garotinha se animou e segurou minha mão, prometendo um tour pela sua casa depois.
Rindo, concordei, ela estava mesmo animada comigo ali.
Se tinha uma coisa que eu admirava muito em Antonella, era a educação. Ela sabia muito bem se comportar sem parecer uma criança robô programada pelos pais.
Sabia ser educada e ser criança ao mesmo tempo.
E o jantar foi realmente incrível em todos os aspectos.
A comida gostosa, o clima leve, as conversas, Antonella. Tudo estava colaborando para que a noite fosse perfeita.
E realmente foi. Depois de sua segunda fatia de torta, Antonella avisou estar muito cansada.
Ramiro pediu licença para colocá-la para dormir e eu esperei, aproveitando pra colocar as louças na lava louças.
– Ei, não era pra você estar fazendo isso, você é convidado
Estalei a língua no céu da boca.
– Não ligo pra isso, pelo menos te poupa um trabalho
– Obrigado, de qualquer forma – Ramiro deu de ombros, me puxando para fora da cozinha até o sofá da sala.
– Encontrei com a sua vizinha – comentei.
– A Luana?
– Aham
– Que legal, ela é uma querida
– Estava ela e o namorado junto
– Deviam estar fazendo alguma programação juntinhos
– Naquele dia você não me contou que ela era comprometida, na verdade você não me contou nada
– Ta com ciúmes, é? – ele riu e eu revirei os olhos.
– Claro que não
– Sei... – ele deu uma risadinha, certamente não acreditando em mim.
– Ei, Ramiro, sobre a Antonella... – comecei devagar – hoje eu vi ela brincando com suas bonecas tal, ouvi ela falando dos pais
– É sério? – ele franziu a testa – ela evita tocar nesse assunto, na verdade
– Pois é. Na brincadeira ela lamentava que seus pais não estavam mais e ela tinha dois novos pais
Ele me olhou sem entender.
– Dois novos?
– É. Não surpreendentemente, se chamavam Kelvin e Ramiro
Ramiro riu.
– Já deu pra perceber que ela gosta da ideia de nós juntos – Ramiro falou.
– Mas não deveria ser uma opção pra ela. Se não seguirmos com esse nosso lance, ela vai se frustrar. E acho que talvez sofrer porque nos idealizou como pais
– E o que você acha que a gente deve fazer?
– Ter os nossos pequenos encontros mas nada que deixe tão na cara. E você pode começar a conversar com ela, impor esses limites e explicar que eu sou o professor, não o pai dela, e ela não poder me ver dessa forma
– Isso vai ser complicado, Antonella tem uma imaginação e tanto
– É, ela é bem criativa mesmo, mas é uma conversa necessária
– Vou pensar em possíveis abordagens depois – Ramiro falou – mas vamos falar disso outra hora, podíamos aproveitar essa noite gostosinha
– Aproveitar como? – perguntei cheio de segundas intenções.
Sem responder nada, Ramiro me puxa para si, me posicionando sentado em seu colo e me beijando.
– Sem muitas provocações, seu Ramiro, a gente não pode transar aqui
– Quem falou em transar? – se fez de desentendido – a mente poluída aqui é a sua
Deixei mais um beijo em sua boca.
– Você é um sonso
Ele riu.

Ramiro

– Não quer mesmo que eu te leve em casa? – pergunto pela milésima vez desde que Kelvin anunciou que tinha que ir embora.
– Juro que tô bem, vou pedir um uber
– Tudo bem, mas compartilha a localização comigo e me avisa quando chegar em casa
– Pode deixar – ele assentiu.
Me aproximei dele, que estava na porta do meu apartamento, quase no corredor.
Minhas mãos fizeram o caminho conhecido até sua cintura e eu abaixei para beijá-lo.
– A noite foi ótima, eu adorei o jantar – murmurou ao final do beijo.
Acho que estávamos presos demais na nossa bolha que mal ouvimos Luana chegar com Rodrigo.
Só percebi quando ela coçou a garganta, nos olhando.
– Oi, Luana – ri sem jeito – não tinha te visto aí
– Mas eu vi vocês – ela sorriu e Rodrigo deu risada de seu tom.
– A gente tava... – Kelvin começou, sem enrolando na própria mentira.
– Tava dando umas aulas de reforço, né? Eu entendo, eu entendo – Luana encerrou o assunto, mas eu sabia que ela falaria algo uma hora ou outra.
– É, tipo isso – Kelvin murmurou envergonhado.
– Bom, vamos entrar, não queremos atrapalhar. Boa noite pra vocês! – mandou um beijinho e entrou no próprio apartamento com o namorado.
– A Luana conseguiu te deixar tímido – zoei.
– Quem disse que eu tô tímido? – voltou a virar para mim.
– Essa bochecha vermelha não me engana – toquei suas bochechas ruborizadas.
– Bochecha vermelha pode ser outra coisa, ué
– E o que pode ser, então?
Ele se aproximou para sussurar em meu ouvido:
– Tesão – aproveitou a aproximação para morder levemente minha orelha e se afastou abruptamente – boa noite, Rams! Tenha bons sonhos – sorriu, andando em direção ao elevador.
Neguei com a cabeça enquanto observava ele dentro da caixa metálica, rindo de forma maliciosa.
Antes da porta fechar completamente, ele me jogou um beijinho, me dando muito espaço para imaginação.

Antes da porta fechar completamente, ele me jogou um beijinho, me dando muito espaço para imaginação

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overnight (não revisada)Onde histórias criam vida. Descubra agora