POV Hyoga

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Flash back

- Mamãe! Mamãe! Posso te ajudar a fazer a mala?
- Claro, meu lindo. Vem aqui. – minha mãe me pegou no colo e me sentou ao seu lado na cama. – Eu dobro as roupas e você coloca na mala pra mamãe, ok?
- Tá bom. – respondo animado.
- Está feliz, meu filho? Finalmente você vai conhecer seu papai. – ela falava, enquanto dobrava as roupas.
- Tô sim, mamãe! Será que ele vai gostar de mim?
- Não tem como não amar você, meu lindo. – ela falou, enquanto me deu vários beijinhos no rosto, me fazendo rir.
- Mas você disse que ele é bravo.
- Hum... Bravo não é exatamente a palavra. Seu pai é bem sério, sabe? E também não gosta de desobediência e indisciplina. Também não é muito de conversar, nem muito de abraçar e beijar.
- Tô ficando com medo. – eu falei e ela riu.
- Desculpa, não quero colocar medo em você. Deixa eu te explicar um pouco melhor. – ela me pegou e me sentou em seu colo. – A mamãe adora te abraçar, te apertar e te encher de beijinho e carinho. Não é que o papai não vai fazer isso, mas provavelmente será muito menos do que eu. O que não quer dizer que ele não vai te amar. Ele só tem um jeito diferente de mostrar isso. Entende? – eu não entendi muito bem o que ela falou.
Vi minha mãe me olhando carinhosamente. Ela se levantou, comigo em seu colo ainda, foi até o móvel onde ficavam as roupas. Em cima dele, tinha um pequeno baú onde ela guardava algumas coisas. Ela o abriu e tirou uma foto de lá. Depois sentou-se comigo na cama, novamente.
- Olha, esse aqui no meio é o seu papai. – ela me mostrou um homem com a cara bem fechada, de longos cabelos azuis.
- Essa aqui é você, mamãe? – perguntei.
- Isso, meu anjinho.
- E quem é esse aqui? – perguntei sobre a outra pessoa.
- Esse é meu melhor amigo. Parece meu irmão, não é?
- Titio? – ela riu com a minha pergunta.
- Ele vai adorar ter você o chamando de titio. – ela riu ainda mais com aquilo.
Fiquei olhando para a foto. Meu papai parecia muito assustador. Fiquei um pouco desanimado, ele não ia gostar de mim. Acho que minha mamãe percebeu, porque ela me abraçou bem forte.
- Vai dar tudo certo, meu anjinho. Eu sei que seu papai parece meio assustador, mas ele é uma pessoa maravilhosa. E eu tenho certeza de que ele vai ser o pai mais babão do mundo. Afinal, você é um menino tão bonzinho, tão especial. Ele vai derreter todo.
- Derreter? Que nem a neve no verão? – fiquei confuso e ela riu de novo.
- Não exatamente como a neve. O que quero dizer é que ele vai amar muito você, do jeitinho dele. Você vai amar seu papai, mesmo que ele não seja tão carinhoso e beijoqueiro como a mamãe?
- Eu já amo meu papai! – falei, sorrindo largo.
- É mesmo? Quanto?
- Um tantão assim óh! – falei, abrindo meus braços o máximo que conseguia. Ela me levantou no ar e soprou minha barriga, me fazendo cosquinhas. Eu caí na risada.
- E o papai e a mamãe vão te amar um tantão muito maior! Vamos ser muito felizes, meu anjinho!

Fim do Flash Back

Estávamos a caminho do shopping. Aquela lembrança fez meus olhos marejarem. Eu não entendia muito bem o que minha mãe falava sobre meu pai. Tudo que eu sabia é que ele parecia muito assustador, bravo e rígido. E minha avó reforçava essas coisas também, pois era a visão que minha mãe passava pra ela sobre ele. Quando fui ficando mais velho, fui entendendo melhor algumas coisas. Entendi que existiam diversas formas de demonstrar amor por alguém. Mas a imagem de um pai rígido e frio foi o que ficou na minha cabeça. Tanto que eu pensei que se fosse rebelde, meu pai não se apegaria a mim e tudo seria mais fácil. Sinceramente, só depois de conhecer Camus é que fui entender o que minha mãe queria me dizer naquele dia. Ela sabia que meu pai era uma pessoa carinhosa e gentil, mas não demonstrava isso com frequência, apenas para quem ele amava. Ela estava apenas querendo me alertar, para que eu não me assustasse com uma primeira má impressão. Porém, ela sabia que ele acabaria cedendo com o tempo e acabaria se tornando um pai atencioso e afetuoso. E era exatamente isso que ele estava sendo. Não entendia como eu tinha esquecido desse dia. Talvez, se eu tivesse me lembrado dessas palavras antes, eu nem teria arriscado tê-lo conhecido. Porque eu sabia que se ele demonstrasse amor para comigo, eu sofreria muito de ter que deixá-lo. Pra falar a verdade, eu sequer esperava que ele seria tão... tão... compreensivo. Eu podia jurar que ele me rejeitaria se descobrisse o que eu tinha feito e como tinha vivido até então. E ele não só me aceitou, como também disse que sentia orgulho de mim! Ele disse que me amava e que me protegeria! Isso era muito mais do que eu poderia ter imaginado nos meus mais doces sonhos! O que eu faria agora? Será que eu deixaria meu pai resolver tudo por mim? Eu deveria simplesmente relaxar e acreditar que tudo ficaria bem? Senti um sorriso irônico brotar em meus lábios. Claro que eu não faria isso! Eu queria muito! Queria poder permitir que meu pai apenas me protegesse. Afinal, eu estava cansado, exaurido de tanto lutar pra sobreviver. E tudo que consegui nessa luta foi tornar-me ainda mais detestável do que antes. Eu tinha que admitir que falhara miseravelmente em ser alguém digno. Eu deveria apenas me recolher em minha insignificância e aceitar que pessoas mais competentes tomassem conta de tudo. Mas eu jamais me perdoaria por isso. Por mais cansado que eu estivesse, eu não me conformava em deixar que meu pai lutasse minhas próprias batalhas. Não era justo com ele! Eu que tinha me enfiado naquela sujeira, então por que ele é quem tinha que limpar? E pra que? Pra que ele faria isso por alguém como eu? Perda de tempo! Perda de recursos! Por mais que ele dissesse o contrário, eu sabia bem qual era meu lugar. Eu não podia me aproveitar de seus sentimentos daquela forma. Eu não queria que ele pensasse que eu era alguém tão patético assim, por mais que eu o fosse. Eu só não sabia o que fazer.
Estava olhando a paisagem pela janela. Aquela cidade era muito iluminada à noite, bem diferente de onde eu morava. Na Sibéria, éramos guiados basicamente pela luz da lua e das estrelas. Não que não houvesse eletricidade, mas a cidade era tão pequena, que nem dava pra falar que iluminava muita coisa. Lá, realmente, parecia um lugar mais apropriado para mim. Um lugar frio e de escuridão. Eu não devia ter saído de lá. Como eu quem controlava o dinheiro da minha avó, eu simplesmente poderia continuar dizendo que não tínhamos condições até que ela não pudesse mais viajar ou até que ela partisse desse mundo e eu ficasse sozinho. A quem eu estava tentando enganar? Eu jamais conseguiria fazer algo assim com ela. Ela partiria tão triste por não conseguir cumprir o que prometera para minha mãe. Eu não era cruel a esse ponto. Ou talvez eu não fosse forte o suficiente pra isso. Eu estava confuso com tudo. Também não adiantava ficar remoendo o que eu poderia ou não ter feito. Eu precisava focar no que fazer dali para frente. A questão é que eu estava tão cansado de tudo que nem tinha forças para raciocinar. Aquela conversa de mais cedo tinha me baqueado muito. Meus pais pareciam tão empenhados em proteger Isaak e eu. Sentia-me comovido pelas palavras de meu pai e Milo. Não importava o que eu dissesse, eles pareciam ter resposta para tudo. E meu coração estava inclinado a aceitar aquele cuidado, mas meu cérebro me pressionava a me afastar. Eu queria muito poder me jogar nos braços do meu pai e implorar para que ele me ajudasse, para que ele me tirasse daquele poço fundo onde eu havia caído. Eu queria poder me enxergar como ele me enxergava. Mas eu sabia que ele só me via daquela forma bonita porque não me conhecia totalmente. Eu não tinha mostrado nem metade das coisas horríveis que passavam na minha cabeça. O que ele pensaria se soubesse que eu já havia planejado minha morte de várias maneiras e em várias situações? O que ele pensaria se soubesse que eu me submeti a realizar os desejos mais grotescos dos clientes apenas para ganhar uns trocados a mais? E se ele soubesse que toda vez que eu via uma faca, meu corpo arrepiava de prazer e ansiedade ao pensar que eu poderia me cortar com ela? Eu não o fazia, porque Nikolai me espancaria se começassem a aparecer cicatrizes pelo meu corpo. Mas eu ansiava por sentir a lâmina rasgando minha pele. E se eu contasse que eu me forçava a vomitar logo após receber um cliente? Não era bulimia, era nojo. Eu me punia por ser aquela pessoa repulsiva. E eu sentia alívio ao me punir daquela forma. O que meu pai pensaria se soubesse disso? Ele ia chorar? Ele me rejeitaria? Eu não queria nem saber. E por isso, mesmo que eu quisesse muito, não poderia ficar com ele. Eu preferia ir embora com o sofrimento de que estava abandonando alguém que me amava a ter que ficar para ver o desgosto em seus olhos.
Olhei para frente e vi Milo falando algo com meu pai, que dirigia. Eu não prestei atenção no que era. Ele parecia empolgado. Sorri. Ele se tornou alguém especial para mim. Desde o dia que nos conhecemos, eu sabia que me apegaria a ele. Sim, era irritante o fato de que ele parecia ler a minha mente. Mas ele era tão carinhoso e atencioso. Ele se preocupava genuinamente comigo. Sua empatia me assustava às vezes. Eu não conseguia tirar da cabeça o dia que ele me levou naquela faculdade. Aquilo tinha sido um dos gestos mais carinhosos que já havia recebido de alguém. Eu sabia que se fugisse, ele se sentiria muito magoado. Eu sabia que toda vez que eu chorava, ele ficava extremamente preocupado. Ele parecia sofrer junto comigo. E quanto mais tempo eu passasse com ele, mais eu acabaria amando-o. Chamá-lo de pai já estava quase que automático na minha mente. Eu não queria admitir, mas eu sabia que aquele sentimento já estava ali a algum tempo. Eu me esforcei para não demonstrar, mas estava ficando tão forte que eu já não conseguia combatê-lo. E ele parecia tão confiante de que resolveria tudo. Do jeito que ele falava, toda aquela situação parecia brincadeira de criança para que ele resolvesse. Será que era? Será que ele estava subestimando Nikolai? Ou será que eu é que estava subestimando-o? Eu não queria pagar para ver.
- Chegamos, meninos. Seu pai vai só estacionar, ok? – disse Milo, tirando-me de meus devaneios.
Olhei para Isaak e ele parecia deslumbrado com tudo. Eu sentia-me feliz de pensar que ele poderia ter aquela vida. Talvez o motivo mais forte para que eu pensasse em ficar com meus pais era que Isaak também poderia. Eu queria tirá-lo daquela vida muito mais do que queria sair eu mesmo. Seria uma forma de retribuir todo o cuidado que ele teve comigo durante aqueles quatros anos no inferno. Mas eu não conseguiria enganá-lo de forma a fazê-lo ficar e ele me deixar partir. Ele me conhecia muito bem. Suspirei. Eu parecia estar encurralado. Eu precisava escolher o que fosse causar menos estrago, porque todas as alternativas seriam devastadoras.
Assim que meu pai estacionou, nós descemos do carro e entramos no shopping. Estava cheio de gente andando pra lá e pra cá, sorrindo, carregando um tanto de sacola. Aquele ambiente parecia tão distante pra mim, da minha realidade. Eu via famílias conversando e se divertindo. Via casais abraçados e sorrindo. Parecia tão inalcançável. Mesmo que eu decidisse ficar com meus pais, eu não conseguia me imaginar vivendo despreocupadamente daquela maneira.
- E então, meninos? O que querem fazer? Podemos comer primeiro e depois dar umas voltas para comprarmos algumas coisas. Ou podemos dar as voltas primeiro. O que preferem? – Milo perguntou.
- Pra mim tanto faz. – Isaak falava, enquanto andava com os braços cruzados atrás da cabeça.
- Estou sem fome agora. – falei.
- Então podemos dar umas voltas. Tem uma loja de roupas que eu adoro por aqui. Podemos ir lá primeiro. – disse Milo.
- Assim, sem querer ser abusado, mas vocês vão pagar as roupas? Porque eu não tenho dinheiro. E acho que já devo muito pra querer novas dívidas. – Isaak falou, fazendo Milo rir. Ele andava atrás de nós, de braços dados com meu pai, mas se soltou e veio entre a gente, nos abraçando.
- Deixa de ser bobo, meu filho. Nenhum dos dois vai ter que pagar mais nada agora. É tudo por nossa conta. – Milo sorria.
- Tipo, de graça? – Isaak parecia não acreditar.
- Claro, moleque. Assim que pais normais fazem. – ele bagunçou os cabelos de Isaak, que ficou um pouco vermelho.
- E como eu saberia disso? – ele virou o rosto, sem graça, fazendo Milo gargalhar.
- Eu tô te falando agora pra você saber, oras. Não precisa fazer essa cara emburrada.
Eu ri de leve daquela cena. Isaak não era de ficar sem graça daquele jeito. Era até engraçado ver como ele ficava vermelho com as coisas que Milo dizia. E, realmente, Milo sabia deixar uma pessoa sem graça, disso eu sabia bem.
- É bom vê-lo rindo assim, meu filho. – Milo tirou-me de meus pensamentos.
Eu apenas olhei em seus olhos e sorri docemente. Eu estava devastado, mas ainda tinha o mínimo de forças para dar um sorriso sincero. Era tudo que eu conseguia fazer por ele naquele momento.
- Mon ange, não é essa loja que você gosta? – disse meu pai, se aproximando de nós.
- Ah! É essa sim! Vamos entrar, meninos. Vocês podem escolher as roupas que quiserem. – disse Milo, nos puxando pra dentro.
Meu pai ficou do lado de fora. Acho que aquele não era o programa que ele mais gostava de fazer.
- Podem olhar à vontade. Se quiserem experimentar alguma coisa, o provador fica pra lá. – Milo apontou pro canto direito no fundo da loja.
- Cara, tem muita roupa aqui! Não sei nem por onde começar. – disse Isaak. – Ali são tênis? Posso olhar, Milo?
- Pode sim, vai lá.
- Beleza. – Isaak se afastou de nós. Milo virou-se para mim.
- E você, meu filho? O que deseja?
- Não quero nada. Estou bem com minhas roupas.
- Nem vem, Hyoga. Eu vi que você tem poucas e estão bem surradas. Vamos doá-las ou jogar fora e comprar novas.
- Mas... – nem tive tempo de protestar e Milo já estava me puxando pela loja.
- Vem, vamos ver algumas blusas e calças.
Suspirei. Milo era incontrolável. Quando ele cismava com uma coisa, não tinha quem o fizesse mudar de ideia. Eu não me sentia confortável com ele gastando dinheiro comigo. Mas ele parecia tão feliz naquele momento. Será que se eu cedesse pelo menos naquela vez, eu seria pior do que já era? Eu apenas queria que ele pudesse continuar feliz daquele jeito, pelo menos uma vez. Eu podia devolver o dinheiro depois ou não ficar com as roupas, sei lá. Mas só naquele momento, eu poderia fingir estar feliz e permitir que ele agisse como o pai que queria ser.
- Olha essa blusa azul e essa calça jeans escura. Gosta? – ele me mostrou.
- São bonitas. – falei.
- Então segura aqui pra gente levar pro provador. – ele me entregou as duas peças. – Que cores você mais gosta? Pode ser blusa estampada? Você tem bermuda pra usar em dias de calor? Prefere roupas mais justas ou mais largas? – ele perguntava sem parar, o que me fez rir de leve.
- Uma pergunta de cada vez, pai. – saiu sem querer. Fiquei extremamente vermelho, quando o vi sorrindo de orelha a orelha.
- Você não tem ideia de como me faz feliz quando me chama de pai. – ele me abraçou, mas logo me soltou e segurou em meu rosto. Seus olhos estavam marejados. Ele ficou emocionado com aquilo? – Hyoga, eu amo você, meu filho.
Senti meus olhos se encherem de lágrimas novamente. Senão me enganava, aquela era a primeira vez que ele dizia que me amava. Eu devia ficar feliz com aquilo, não é? Mas senti uma tristeza enorme invadir meu coração. O que eu diria pra ele? Eu o amava também? Não tinha outra forma de explicar porque conseguia chamá-lo de pai de maneira tão natural. Claro que eu já o amava! Depois de tudo que ele fez pra mim em tão pouco tempo, seria estranho se eu sentisse o contrário. Mas eu sabia que o magoaria muito ainda. Eu sabia que ele também seria afetado pela podridão que emanava do meu ser. E provavelmente seria muito pior que meu pai, porque Milo tinha muitas expectativas sobre mim e Isaak. Afinal, ele mesmo disse que estava realizando o sonho de ser pai. Eu provavelmente acabaria destruindo seus sonhos. Senti uma angústia enorme tomar conta do meu peito. Apertei minha blusa na altura do coração, como se aquilo pudesse aliviar a dor.
- Está tudo bem? – ele segurou em meu ombro, preocupado.
- Desculpa, não queria preocupá-lo, está tudo bem. – respondi, tentando sorrir.
- Hyoga, fique tranquilo, meu filho. Você não precisa dizer que me ama também. Eu sei que isso leva tem...
- Mas eu amo! – interrompi-o. Não sabia o que raios eu estava fazendo, mas senti que não devia deixar que ele pensasse o contrário. Ele me olhava espantado, acho que devo tê-lo assustado. – Desculpa, acho que isso foi meio brus... – dessa vez, ele que me interrompeu, me abraçando bem forte.
- Obrigado, meu filho! Obrigado por retribuir meus sentimentos! Eu prometo que vou corresponder à altura.
Não me aguentei e o abracei de volta. Eu não queria pensar naquele momento. Eu apenas queria que ele ficasse feliz, mesmo que só naquele momento. Eu queria que ele soubesse que o amava, que o queria como pai. Mesmo que depois eu fosse obrigado a deixá-lo, pelo menos poderia deixar claro meus sentimentos.
Ele se afastou de mim e limpou algumas lágrimas que saíam de seus olhos.
- Eu te trouxe aqui pra que você se distraísse, mas aqui estou eu te fazendo chorar de novo. – ele limpou as lágrimas que também corriam por minha face. - Vem, vamos experimentar essas roupas.
Ele me levou até o provador e me entregou as roupas que tinha pegado.
- Vai lá e experimenta. Quando terminar de se trocar, vem aqui pra que eu veja, ok? Vou ficar aqui fora, olhando algumas outras que eu acho que você possa gostar.
Entrei no provador e comecei a tirar minha roupa. Olhei para a quantidade de peças que tinha e ri de leve. Eu tinha que admitir que a empolgação de Milo era fofa. Claro que eu não precisava daquele tanto de roupa. Sempre fui uma pessoa muito simples. Ficava me perguntando se eu aceitasse ficar com eles, se eu levaria uma vida mais agitada, que justificasse aquela quantidade de roupas. Esperava que não, poi...
- Fica quieto! – meus pensamentos foram interrompidos. Alguém entrou no provador e tapou minha boca, para que eu não gritasse.
Fiquei olhando no espelho, apavorado. Eu não reconhecia aquele homem. Era alto, estava de moletom preto, com o capuz. Não dava pra ver a cor de seus cabelos, mas seus olhos eram castanhos e sua pele era clara. Ele me pegou por trás, segurando um dos meus braços para trás e tapando minha boca com a outra mão. Eu estava apenas de cueca, o que me deixou ainda mais assustado. Aquilo não me trazia boas lembranças. Meu coração estava acelerado e minha respiração estava pesada. O que aquele cara queria comigo?
- Então é você o cachorrinho do Nikolai? – estremeci ao ouvir aquilo. – Agora entendo porque ele quer tanto te ter de volta. Realmente, é um gostosinho. – vi ele passando a língua nos lábios, com lascívia, enquanto olhava meu corpo de cima a baixo.
Ele me pressionou contra o espelho de maneira brusca. Senti meus olhos marejarem. Não era possível que ele queria me estuprar ali dentro! Ou era? Claro que sim! Não era pra isso que eu servia? Eu não passava de um puto, objeto de prazer alheio. Senti meu corpo relaxar, resignado. Eu já sabia o que aconteceria. Já sabia o que fazer. Era só não pensar em nada. Logo aquilo ia passar. Eu só precisaria aguentar até o final e ele ia embora.
- Ele pediu pra te avisar que está perdendo a paciência. É bom que você volte logo ou ele virá atrás de você pessoalmente. Entendeu? – eu apenas afirmei com a cabeça. – Bom, recado dado. Acho que vou aproveitar e me divertir. Afinal, ele não disse que não podia.
Senti ele pressionando o corpo dele contra o meu. Ele estava bem excitado, dava pra sentir. Ele soltou minha mão e pegou no cós da minha cueca para abaixá-la. Fechei meus olhos, mas só pude ouvir a cortina do provador se abrindo.
- Tire as suas mãos do meu afilhado, seu covarde!
Aquela voz... Abri meus olhos a tempo de ver Saga puxando o cara para trás, o jogando com violência para fora do provador. Ele caiu sentado no chão e logo Saga me abraçou, meio que me protegendo.
- Quem você pensa que é, coroa? Não se meta! – o cara disse, se levantando e encarando Saga.
- Eu que te pergunto quem você pensa que é para agarrar um menor de idade, seu pedófilo desgraçado! – Saga falava com a voz grave e incisiva.
- Hah! Você não sabe que esse moleque não passa de um pu...
Ele não teve tempo de terminar, só sentiu o soco em sua face, jogando-o no chão violentamente. Era Milo!
- Lava a sua boca antes de falar qualquer coisa do meu filho, seu traste!
O cara tentava se levantar, enquanto limpava o sangue que escorria de sua boca. Com o corpo tremendo, ele ficou de pé, meio cambaleando. A pancada deve ter sido bem forte.
- Vocês não sabem com quem estão mexendo! Vão ver só!
Ele tentou fugir, mas foi impedido por outra pessoa, que era idêntico ao Saga, por sinal. Ele pegou o cara rapidamente, segurando suas duas mãos para trás.
- Qual é, Milo?! Querendo se divertir sem mim? – ele falou e riu em seguida.
- Me solta, seu otário! – o cara falou, mas logo o ouvi gemendo. Acho que a cópia do Saga deve ter torcido mais os braços dele.
- Cala a boca, seu verme! Vou levar você pro segurança! E, Milo... – ele voltou-se pro meu pai. – Quando eu voltar, quero saber esse negócio de filho direitinho! Como assim eu tenho um afilhado e você não fala nada?
- Longa história, meu caro. Quando você voltar eu explico direito.
Vi a cópia do Saga empurrando o cara pra fora da loja, sob protestos dele.

Continua...

Doce Fruto de um Passado AmargoOnde histórias criam vida. Descubra agora