POV Camus/POV Hyoga

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POV Camus

Eu acordei antes que o despertador tocasse. Olhei para o lado e vi que Hyoga e Milo ainda estavam dormindo. Hyoga virara para Milo durante a noite e os dois estavam abraçados. Sorri. Queria que fosse assim a partir de agora. Talvez fosse melhor que Hyoga dormisse conosco, pelo menos por enquanto. Se ele estava ali, eu podia garantir que dormiria. Deixá-lo no quarto sozinho não estava dando certo. Ele acordava no meio da noite e não dormia. Ficava chorando o tempo todo. Não sabia se isso ia melhorar a partir de então. A data da morte de Natássia passou, mas agora vinha esse desafio da doença da avó. Além disso, ainda tinha aquilo que Hyoga escondia de nós. Eu não sabia o quanto aquilo ainda o afetava. De acordo com a teoria de Milo, provavelmente era algo que ainda mexia com ele. Como não sabíamos o que era, não dava pra dizer até que ponto isso interferiria.

Não queria levantar, pois tinha medo de acordar Hyoga. Faltava pouco tempo pro despertador tocar, mas não queria que ele perdesse nem um minuto de sono. No dia que ele chegara, eu não sabia se ele tinha conseguido dormir. No dia seguinte ele não dormiu muito. E no dia anterior, mesmo que ele tenha dormido durante o dia, não sabia dizer que horas ele acordou e por quanto tempo ficou chorando sozinho. Pelas olheiras que ele tinha, parecia estar bem cansado. Não podia culpá-lo. Aconteceram tantas coisas ao mesmo tempo. Eu, sinceramente, não sei se conseguiria lidar com aquilo na idade de Hyoga. Quando eu tinha 14 anos, não tinha muitos problemas. Tive pai e mãe, embora não me desse muito bem com meu pai, mesmo ele não tendo sido muito presente em minha vida. Mas não tinha nenhum trauma envolvido. Ele sempre foi muito rígido e desnecessariamente agressivo. Eu não costumava dar motivos pra que ele me batesse, mas não me agradava o modo como ele tratava minha mãe. Volta e meia lembro-me de vê-la com hematomas no rosto, braços, pescoço. Quando eu era criança, não entendia muito bem. Comecei a desconfiar depois que fiquei mais velho. E então passei a defendê-la. Claro que isso me trouxe alguns problemas, mas foi por pouco tempo. Ele faleceu muito novo. Depois que ele partira, minha vida foi a mais normal possível. E eu não podia só reclamar do meu pai. Apesar dos pesares, ele nunca deixou que nos faltasse nada e, querendo ou não, sua rigidez me tornou um homem muito disciplinado e focado. Cheguei onde cheguei graças a sua criação. Claro que não me espelhava nele, mas aprendi com ele que a vida não me daria folga. Não foi o melhor pai, mas estava longe de ter sido o pior. Já minha mãe era praticamente um anjo. Graças a ela eu não virei um ser completamente frívolo. Claro que eu era contra violência, mas pela maneira que fui criado eu não deveria ser a pessoa mais emotiva do mundo. E embora eu mantivesse a postura, se eu tinha qualquer tipo de empatia, era graças a minha mãe. Melhorou muito, também, depois que conheci Natássia e mais ainda depois que me envolvi com Milo. E agora, com Hyoga, estava desenvolvendo um lado que sequer sabia que existia em mim. Perguntava-me se eu sempre quis ser pai e apenas fingia que não. Será que de algum modo eu senti falta de uma figura paterna mais presente e mais amável? Não sabia dizer e também não me importava mais. Eu não tinha medo de me tornar como meu pai, porque eu sabia que isso jamais aconteceria. Poderiam pensar que era arrogância, mas eu sabia que me tornara um homem muito melhor que ele, em todos os aspectos. E eu tinha Milo ao meu lado, que me manteria com os pés no chão. O questionamento correto é se o pai que eu era, seria suficiente para Hyoga?

O despertador tocou e eu logo desliguei. Vi Hyoga acordando lentamente. Logo que viu que estava abraçado com Milo, seu rosto ficou extremamente vermelho. Ele acabou se levantando bruscamente, acordando Milo. Tive que segurar para não rir.

- Bom dia! – falei, já me levantando. – Conseguiram dormir bem?

- Que nem uma pedra! – disse Milo, se espreguiçando. – Fiquei mais tranquilo com Hyoga aqui.

- Não se acostume com isso. – Hyoga falava com desinteresse, mas seu rosto continuava corado.

- Deixa de marra, garoto. – Milo agarrou Hyoga em um abraço e fez ele se deitar novamente. – Deixa eu ver se você sente cócegas.

Doce Fruto de um Passado AmargoOnde histórias criam vida. Descubra agora