CINCO ANOS DEPOIS...
Já se passaram cinco anos desde que cheguei ao Brasil para viver sob a tutela do Miguel. Com o tempo, fui me aclimatando à nova rotina: meu português, antes travado, agora fluía com mais naturalidade, e embora meu sotaque inglês ainda se fizesse presente em algumas palavras mais difíceis, ele já não era tão marcante. Fiz amizades que trouxeram alegria e descontração aos meus dias, e com elas aprendi a explorar e me locomover pela cidade com uma independência que antes não possuía. No entanto... havia uma coisa que não se encaixava nesse cenário: o meu relacionamento com o meu tutor. O Miguel, aquele desgraçado, passava a maior parte do tempo tentando controlar a minha vida, vigiando cada passo que eu dava, me sufocando com suas regras. Ele vivia me colocando de castigo, me deixando sem dinheiro, me proibindo de ver meus amigos e ainda teve a audácia de contratar um motorista particular só para me vigiar. E eu... bem, eu não era de levar desaforo para casa. Então... eu fazia questão de infernizar a vida dele sempre que podia, não aceitava suas ordens sem resistir, e o resultado disso era que vivíamos brigando feito cão e gato!
As coisas pioraram ainda mais quando após concluir o ensino médio ele me obrigou a estudar economia, alegando que eu não teria responsabilidade para administrar a herança do meu pai, que eu receberia em breve. Isso foi um desastre, pois eu nunca conseguia tirar boas notas. Eu odiava aquele curso, não entendia nada do que era ensinado, e também... não me esforçava para aprender. Eu só queria me livrar daquilo o mais rápido possível.
O zero redondo marcado com caneta vermelha na avaliação que eu segurava era a prova disso. Eu sabia que ele ia ficar furioso quando visse aquilo. E, eu podia até imaginar a cena:
— Como você tirou zero em uma avaliação tão simples? — ele perguntaria, com a voz alterada e os olhos arregalados.
— Não sei, não entendi nada — eu responderia, com indiferença.
— Como não entendeu nada? Você não estudou? Não prestou atenção nas aulas? Não fez os exercícios? — ele continuaria, me bombardeando com perguntas.
— Não, não e não! — eu diria, sem paciência.
— Você não tem vergonha na cara, menina? Você não tem noção do que está fazendo com o seu futuro? Você não tem respeito por mim, ou pela memória do seu pai — ele gritaria, perdendo a compostura.
— Não, não e não! — eu repetiria, provocando-o.
— Chega! Você está de castigo! Vai ficar trancada no seu quarto até aprender a ser responsável! — ele decretaria, enquanto furioso me olhava como se quisesse me queimar viva.
— Ah, é? E quem vai me obrigar? Você? — eu desafiaria, rindo debochadamente.
— Sim, eu! E se você não for agora, vai se arrepender! — ele ameaçaria, apontando na direção do meu quarto.
— Quer saber de uma coisa, Miguel! Vá pro inferno! — eu gritaria e subiria as escadas para o segundo andar da casa batendo o pé, quando entrasse no meu quarto, bateria a porta com toda força e me jogaria na cama, roendo as unhas de raiva, pensando em uma possível retaliação.
E assim começaria mais uma das nossas brigas intermináveis, que só terminariam quando um de nós se cansasse. Era assim que a nossa convivência funcionava. Nós nos odiávamos, e nada mudaria isso. Ou pelo menos era o que eu pensava...
— Ayara — ouvi o sussurro vir de trás de mim.
O burburinho dos alunos conversando na sala de aula pareceu voltar aos meus ouvidos quando notei que minha amiga me chamava.
Virei meu corpo discretamente para trás e encarei os olhos castanhos amendoados da minha melhor amiga Bárbara, que me olhava com um ar de preocupação, ela segurava sua avaliação, mas diferente de mim, sua nota estava desatacada com caneta azul.
— Oi — respondi, sem ânimo e um pouco frustrada.
— Quanto você tirou? — ela perguntou, curiosa.
— Zero, Bárbara! Zero! — exclamei, esticando um biquinho, já conseguia sentir algumas lágrimas se formando nos meus olhos.
— Amiga, você disse que tinha estudado! — minha amiga exclamou, claramente desapontada. Eu tinha garantido a ela que havia estudado muito para a avaliação, mas a verdade é que, quando peguei meus livros, vi uma postagem de um garoto no Instagram e acabei passando horas assistindo aos reels. E, minha miga sabia que tirar uma boa nota naquela avaliação era importante para mim.
— E, eu estudei, amiga! Mas deu branco na hora da avaliação. A culpa é do maldito Miguel e desse professor também — enchi o pulmão de ar e murmurei, indignada.
Ah, a troca de professores... quem diria que o substituto temporário do professor Joaquim, aquele homem calvo e sem graça, se tornaria o centro das atenções de muitas alunas, inclusive o meu.
O professor Sebastian Miller não era apenas um professor exigente; ele também possuía uma beleza estonteante, como se fosse a própria encarnação de um deus grego. Seu porte atlético e ombros largos eram realçados pelas roupas sociais bem cortadas que usava. Sua pele bronzeada brilhava sob as luzes da sala de aula, e seus olhos verdes tinham um brilho hipnotizante que capturava a atenção de todos.
Quando ele entrava na sala de aula, era como se uma aura de carisma o acompanhasse, desviando minha atenção de qualquer outra coisa. E confesso que, por vezes, me perdia em devaneios sobre aulas particulares com ele, sem camisa, com suspensórios e abotoaduras nos pulsos. Confesso que era difícil me concentrar nas matérias com alguém tão atraente à minha frente.
Minha amiga me avaliou com a expressão confusa.
— O quê? — perguntou, perplexa.
— É isso mesmo! A culpa é dele! Quem consegue prestar atenção na aula com um professor desses? — comecei a falar alto demais, gesticulando como uma louca e chamando a atenção da turma toda para mim. — É por isso que não consigo me sair bem nas provas! Olha para aqueles olhos verdes, os lábios se movendo, aquele corpo... Deus do céu! Que tipo de professor vem dar aula em uma faculdade usando roupas como essas? Ele deveria ser menos bonito!
— Ayara, pelo amor de Deus! Cale essa boca... — minha amiga sussurrou entre os dentes, mas eu a ignorei e continuei falando, sem noção.
— ... Ele fica com essa pose de professor exigente quando na verdade não passa de um cretino exibido!
— Ayara! — Minha amiga me chamou, em um sussurro nervoso, e virou a minha cabeça, com a ponta do dedo em direção a mesa do professor e ele estava lá na frente da turma com os braços cruzados, encostado em sua mesa me encarando com uma feição nada amigável.
Oh, My god!
— Senhorita, Arantes... — o professor fez uma pausa me avaliando por um tempo, com uma feição levemente severa. — Parece que está com dificuldade em se concentrar, não é mesmo? Suas notas dizem por si.
Não disse que ele era um cretino exibido?
— E-eu? Não, professor! Eu só estava comentando aqui com a minha amiga sobre um capítulo... da... bem... da... nossa série favorita. Onde o professor é lindo, mas também um cretino, arrogante e não ensina nada... enfim... — Sorri sem graça, tentando disfarçar. — O que o senhor dizia?
— Venha comigo — me deu as costas e saiu da sala, deixando claro que teríamos uma conversa séria.
Eu engoli em seco, sentindo o olhar de todos sobre mim. Eu sabia que estava encrencada. Era só o que me faltava chegar em casa com uma punição por ter sido desrespeitosa com o professor Miller.
Droga! A minha vida não podia ser mais difícil?
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Entre Segredos e Paixões 1 - Raízes do Destino
RomantikAyara Arantes, herdeira de um vasto império, é obrigada a deixar seu país para viver sob a tutela de Miguel, um homem fechado e austero devido ao luto que carrega. A convivência entre eles é tensa até que Ayara começa a receber aulas particulares de...