69_ O meu adorável inimigo.

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Torry Jasper

"O seu avô tá aqui..."

Nunca pensei que ouviria isso e nunca pensei que ficaria nervosa por ouvir. Tento ajeitar o meu pijama e o meu cabelo, não quero que ele pense que sou feia. Merda, ele decidiu vir num péssimo dia.

Do topo da escada vejo o senhor na sala, sentado no sofá encarando o nada. Ele esfregava as mãos umas nas outras como se estivesse nervoso. Eu não conseguia ver o seu rosto direito, mas daqui eu conseguia ver os seus cabelos pretos misturados com brancos. A sua pele era como a minha.

Meu Deus, será que eu me pareço com ele?

Desço mais um degrau de vagarosamente com medo dele me escutar. O que eu vou dizer quando ele ficar na minha frente? Será que eu devo chamar ele de vovó ou de senhor? O meu pai nunca me falou dele, nem uma foto ele me mostrou.

Que estranho.

Será que eu devo abraçar ele? Ou fazer o aperto de mão é o suficiente? Por que ele decidiu me procurar só agora? Ele sequer foi ao enterro do Anthony.

Caralho, nunca me fiz tantas perguntas assim.

Chego no fim das escadas e respiro fundo antes de começar a andar na direção do senhor. Eu paro quando chego perto o suficiente mas ele parece não notar a minha presença.

A sua cabeça ainda estava voltada para baixo e eu encarei ao redor pensando no que fazer. Talvez eu devesse gritar mas acho que isso acabaria com a audição do velho.

Ou talvez eu devesse cutucar ele mas quem sabe assim eu não acabe quebrando os ossos do coitado.

Limpo a garganta alto e no mesmo segundo o senhor levanta a cabeça e sinto a minha barriga revirar quando os seus olhos encontram os meus.

Ok, ele não é tão velho assim.

Os seus olhos se arregalaram e eu não sei se foi pelo susto que tomou ou foi porque ele viu uma fantasma, ou seja, eu.

Ele se colocou de pé ainda me encarando com os olhos arregalados. Eu acho que deveria correr...

Eu sempre conseguia correr mais que o Levi. Ok, só quando ele estava com vontade de cagar.

Só estávamos nós naquela sala, o silêncio naquele momento gritava mais do que eu poderia gritar. E realmente eu queria gritar, o senhor na minha frente tinha uma pinta na pálpebra do olho esquerdo. O Levi também tinha.

Eu quase abri um sorriso, esse senhor realmente é o meu avô.

- B-bom dia. - Gaguejou chacoalhando a cabeça, parecendo sair de um transe. Ele tinha olhos pretos tal como o meu pai, vendo melhor agora, ele só tem isso em comum com o Anthony. - Você é tão linda. - Ele disse abrindo um pequeno sorriso fazendo algumas rugas no seu rosto aparecerem.

Eu sorri.

- Obrigada. - Falei baixo.

- Eu posso te dar um abraço? - Pediu e eu ergui as sobrancelhas surpresa.

Eu vou me cagar.

- Claro. - Falei e no segundo seguinte eu senti braços a volta do meu pescoço. Eu abri a boca ainda surpresa e retribui o abraço.

Ele me abraçava como se precisasse daquilo e de repente eu senti ainda mais o peso do seu corpo, ele suspirou como se tivesse se aliviado.

Dois minutos e dezasseis segundos depois ele se afastou do abraço e pareceu limpar uma lágrima no seu rosto.

- Está tudo bem? - Perguntei apreensiva e ele sorriu assentindo.

- É tanta emoção. - Disse e eu soltei uma pequena risada. - Você é a Torry certo?

Eu assenti.

- Eu sou o...

- O meu avô. - O interrompi. - É, eu sei. - Apontei para o sofá onde nos sentamos depois. - Por que o senhor só apareceu agora? - Questionei e ele sorriu.

- Você é bem directa. - Comentou mas eu não disse nada, eu continuei encarando ele esperando que ele continuasse a falar. Ele suspirou e casualmente inclinou-se para a frente, apertando as mãos na frente. - Todos esses anos eu vivi amargamente.

Será um longa história.

- A sua avó morreu quando o seu pai nasceu. Eu fiquei tão destroçado que culpei o seu pai pela morte dela. - Eu ergui as sobrancelhas chocada. - Eu fiquei maltratando o Anthony por anos, achando que ele foi o grande culpado pela morte da mãe sendo que ele nunca teve culpa. O Anthony com os seus 19 anos resolveu ir embora de casa, não suportando mais aquilo e eu fui tão idiota que não fui capaz de impedir ele.

Isso é tão pesado. Nunca imaginei que o meu pai viveu algo assim. E sabendo que ele viveu isso, como ele foi capaz de me culpar pela morte do Levi? Ele praticamente me fez viver o que ele viveu.

Será que por estar tão perturbado ele quis que eu sentisse na pele o que ele sentiu?

- Eu fui um pai horrível, Torry. Eu fiquei tão arrependido que eu não tive coragem de ir atrás dele, eu fiquei com medo dele não me perdoar, dele me odiar...

- Eu não sei o que dizer... - Sussurrei e ele voltou o olhar para mim.

- Sabe, eu aprendi que o perdão é libertador para quem é perdoado. Eu gostaria que você me perdoasse, e que me permitisse estar na sua vida. Eu quero recuperar o tempo perdido assim talvez o Anthony me perdoe, onde quer que ele esteja.

Mordi o lábio inferior.

- Lamento muito pelo o que aconteceu com o meu outro neto mas fico feliz por saber que ele foi um bom garoto.

- É, ele foi. - Eu sorri. Meu Deus, aquele sorriso foi tão sincero... - O perdão também é libertador para quem perdoa. Eu consigo ver que o senhor está arrependido. - Toquei as suas mãos e ele apertou as mesmas. - Eu gostaria muito de ter o senhor na minha vida, eu sei que o meu irmão e a minha mãe ficariam muito felizes assim também como o Anthony. Além do mais, você é o meu avô.

O senhor abriu um sorriso enorme, revelando os seus dentes brancos. Nunca vi tantos dentes na minha vida.

- Obrigado, minha neta. - Ele me abraçou e eu retribui o abraço fechando os olhos. - Você não faz ideia do quanto estou feliz.

- Eu também estou feliz. - Falei.

É, eu realmente estava conseguindo ser feliz.

- A Vanessa vai ficar muito feliz. - Ele disse e eu me afastei do abraço encarando ele com o cenho franzido.

- Quem é Vanessa? - Perguntei confusa.

- É a minha esposa, ela que me deu forças pra vir até cá. - Disse orgulhoso e eu assenti com um sorriso. - Ela vai adorar conhecer você.

- Que-

Eu não consegui terminar pois a porta foi aberta brutalmente revelando a imagem da barbie de quinta categoria.

- Torry Jasper, você vai voltar com o Thales agora! - Gritou fazendo nós nos levantarmos do sofá.

Ela entrou sem fechar a porta e parou a nossa frente colocando as mãos na cintura enquanto respirava pesadamente.

Ela encarou o meu avô e sorriu para o mesmo que parecia não entender nada.

Voltou o olhar para mim, me encarando com os olhos semicerrados.

- Boa tarde, Ana Liz. - Sorri falsa.

- Volta com o Thales! - Mandou.

- Quem é o Thales? - Perguntou o meu avô confuso.

Eu mordi o lábio inferior tentando esconder o sorriso.

- O meu adorável inimigo.

Continua

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O Meu Adorável Inimigo Onde histórias criam vida. Descubra agora