Vinte ✈︎

476 80 12
                                    

As últimas palavras pareceram ecoar em minha cabeça, misturando-se ao frio na barriga, fazendo minha pele se arrepiar. Tive que dar um passo atrás, literalmente, para me obrigar a assimilar o que ela tinha acabado de dizer.

Se dependesse da minha conta bancária, eu não teria como doar mais do que algumas centenas de dólares, então que bom que Becky tinha arquitetado aquele plano considerando a conta dela, não a minha.

O que me fez considerar duas possibilidades: ou Becky se importava mesmo com a causa, ou era rica o bastante para não ligar para quanto eu doaria em seu nome desde que a poupasse de um encontro.

Um encontro que aconteceria comigo se seguíssemos as regras. Mas que também não seria de verdade. Porque nada daquilo era. Era tudo encenação.

– Bom, trato é trato, Armstrong.

Dei de ombros sem jeito, afastando o pensamento estranho e nebuloso de um encontro com Becky. Em um abrigo de animais.

Ela brincando com um monte de filhotes fofinhos. De uniforme de futebol americano com… Pelo  amor de Deus, preciso parar com essas imagens mentais.

Becky abriu a boca, mas, antes que pudesse falar, uma mulher veio até nós e colocou a mão no ombro dela. Becky virou e pareceu relaxar assim que viu a mulher ao seu lado.

– Não acredito no que estou vendo. – disse a sujeita, dando tapinhas firmes nas costas de Becky. – É mesmo Rebecca Armstrong nos agraciando com sua companhia esta noite? Deve ser meu dia de sorte.

Becky bufou, um som curto e leve, mas eu ouvi.

– Com certeza não é o meu agora que você está aqui. – murmurou, o canto direito dos lábios curvado pela sombra de um sorriso torto.

A mulher – que imaginei ser próxima de Becky, ou pelo menos ter sido em algum momento, dada sua reação – balançou a cabeça.

A sujeita levou a mão ao peito e a pele em volta de seus olhos se enrugou.

– Ui, essa doeu. Há quanto tempo não vejo essa sua cara feia?

– Menos tempo do que eu gostaria, se quer minha opinião.

O rosto geralmente inexpressivo de Becky ficou mais amistoso. Seu corpo pareceu relaxar.

– Como estão as coisas, Tee?

Percebi o calor em sua voz. A intimidade.

– Nunca estive melhor. – respondeu Tee, assentindo. – Estou feliz por estar de volta, acredite se quiser. Cara, nunca achei que fosse sentir falta dessa cidade.

Soltei um sorriso discreto ao testemunhar aquela troca, absorta por aquela Becky completamente nova e diferente à minha frente.

Uma Becky relaxada – o bastante para quase sorrir – e que estava brincando, ou quase, com alguém que parecia ser uma velha amiga.

– Mas ora, ora. Vejo que a Sra. Solitária está acompanhado esta noite. Olá.

Tee se endireitou e um sorriso cheio de dentes dominou seu rosto. Estimei que tivesse a mesma idade de Becky, mais ou menos. Seus olhos me observaram com um interesse que me pegou de surpresa. Não achei que estivesse interessada em mim, na verdade, ela parecia tão espantada como eu com o fato de Becky ter companhia.

– Não vai me apresentar, Big B? Cadê sua educação? – perguntou ela, cutucando as costelas de Becky.

O empurrão amigável não surtiu efeito algum e Big B permaneceu o mesmo muro imóvel de sempre. Certamente eu perguntaria sobre o apelido.

Uma Farsa de Amor na TailândiaOnde histórias criam vida. Descubra agora