Trinta e quatro ✈︎

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O processo de desembarcar, cruzar a alfândega e pegar as malas foi meio como aqueles sonhos estranhos em que tudo em volta parece confuso e irreal, mas parte de nós, lá no fundinho da mente, sabe que não é de verdade.

Só que, daquela vez, era.

O tum, tum, tum da pulsação martelando alto em meus ouvidos era a prova cabal disso.

E ainda assim, por mais que uma parte de mim repetisse que eu logo acordaria e que meu coração gritasse que eu já estava acordada e que a situação estava mesmo acontecendo, no instante em que avistei a porta do desembarque, meu corpo inteiro paralisou.

As rodinhas da minha mala derraparam no chão quando estaquei no lugar. Com a respiração presa na garganta, vi a porta automática abrir e fechar, deixando as pessoas à nossa frente saírem.

Olhei para Becky, que andava alguns passos à frente, não mais ao meu lado. Minha mala cheia demais pendurada em seu ombro de novo.

- Becky. - resmunguei, o tum, tum, tum ficando cada vez mais alto. - Não vou conseguir.

Com a sensação de estar com os pulmões cheios de cimento, levei a mão ao peito e suspirei.

- Aí, Deus. Ai, meu Deus.

Como eu havia deixado aquilo chegar tão longe? O que eu faria se a coisa toda fosse por água abaixo? E se eu piorasse ainda mais a situação?

Eu estava louca. Não: eu estava sendo burra mesmo. Quis socar minha própria cara. Talvez isso me fizesse cair na real.

Vasculhei o saguão em desespero, provavelmente em busca de uma rota de fuga. Não dava para ver nada além das portas que nos separavam dos meus pais e engoliam um passageiro após o outro.

- Não posso... - resmunguei, sem reconhecer minha própria voz.- Não
consigo fazer isso, Becky. Simplesmente não consigo sair e mentir para a minha família inteira. Eu... Isso não vai dar certo. Eles vão descobrir e eu vou fazer papel de idiota. O papel da idiota que eu sou porque...

Becky tocou meu queixo, levantando meu rosto para encontrar seu olhar. O castanho em seus olhos brilhou sob a luz fluorescente que iluminava o terminal, atraindo toda a minha atenção.

- Ei... Calma.

Incapaz de pronunciar absolutamente nada sem perder as estribeiras, assenti devagar. Becky continuou segurando meu queixo.

- Você não é uma idiota. - disse, olhando em meus olhos.

Fechei os olhos por um instante, sem querer enxergar qualquer que fosse o sentimento nos olhos dela porque sabia que aquilo me faria perder o controle de vez.

- Não consigo. - sussurrei.

- Sarocha, deixa de ser ridícula. - disse ela, soando mais firme.

Ao contrário do toque suave, o comando saiu brusco. Insensível, considerando que Becky se dirigia a uma mulher prestes a surtar.

Alguma coisa em suas palavras, no entanto, me obrigaram - me permitiram, na verdade - respirar fundo pela primeira vez nos últimos minutos. Inspirei, soltei o ar.

O tempo todo, Becky ficou olhando nos meus olhos com algo que deveria ter me deixado muito ansiosa, mas que aos poucos foi me trazendo de volta.

- Nós vamos conseguir. - disse ela, confiante.

Nós.

Aquela palavrinha simples de três letras de algum jeito soou um pouco mais alta que as demais. E então, como se ela já esperasse que eu estivesse preparada para ouvir, Becky soltou o golpe mortal.

Uma Farsa de Amor na TailândiaOnde histórias criam vida. Descubra agora