²⁴O jogo de mentiras

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Eu sabia. Havia semanas desde que descobri a verdade. Bruce Wayne era o Batman, e Damian, o arrogante Damian, era o Robin. Quando desci para a Batcaverna durante aquela batalha com o Espantalho, tudo foi revelado diante dos meus olhos. Eles tentaram esconder de mim, até o último segundo. Mas agora, depois de tanto tempo, não dava mais para voltar atrás.

O que eu não esperava era o peso que essa verdade traria. Desde aquela noite, Damian estava mais irritadiço, mais reservado — como se, de alguma forma, minha presença fosse um lembrete constante de que seus segredos estavam à vista. Odiávamos isso. Ele, porque foi forçado a aceitar minha presença em seu mundo secreto. Eu, porque ele não confiava em mim o suficiente para compartilhar isso antes.

Os dias que se seguiram foram marcados por silêncios desconfortáveis e trocas de farpas. Por fora, éramos parceiros — eu como sua guarda-costas, e ele como o filho insuportável do homem mais poderoso de Gotham. Mas por dentro, havia uma batalha constante. Eu estava determinada a me provar útil, e ele estava decidido a me manter à distância.

Era noite quando tudo começou a desmoronar novamente. Estávamos na sala de treino da Mansão Wayne, ou pelo menos eu estava. Damian, claro, havia desaparecido como sempre, provavelmente em alguma missão noturna. Eu não conseguia dormir, então decidi extravasar no saco de pancadas.

Cada golpe que desferia no saco de pancadas era uma tentativa de afogar minha frustração. Ele estava se escondendo de novo. Mesmo depois de tudo que passamos juntos, depois de enfrentar o Espantalho, e de eu quase morrer sob os efeitos da toxina, Damian continuava agindo como se eu não pertencesse àquele mundo.

Enquanto meus punhos acertavam o saco com força crescente, a porta da sala de treino se abriu. Damian. Ele estava sem o traje de Robin, mas era como se ele nunca se despisse da máscara completamente.

— Se você vai continuar socando dessa forma, vai acabar se machucando. — Sua voz ecoou na sala, fria como sempre.

Eu o encarei, ofegante, limpando o suor da testa com o braço.

— Talvez eu não me machucasse tanto se tivesse alguém para treinar comigo, — retruquei, sem tentar esconder o sarcasmo.

Damian cruzou os braços e se encostou na porta, com aquele olhar que sempre parecia julgar cada movimento meu.

— Você realmente acha que pode me acompanhar, Astrid? — Ele sorriu, mas não era um sorriso amigável. Era provocador.

— Por que não tenta descobrir? — O desafiei, dando um passo à frente, sentindo o calor da irritação crescendo dentro de mim.

Ele não se moveu por um momento, mas pude ver seus olhos verdes brilhando com um misto de desafio e frustração. Então, sem dizer mais nada, ele entrou na sala e se colocou à minha frente. Ele ergueu as mãos, como se me convidasse para atacá-lo.

— Tudo bem. — Sua voz era baixa e controlada. — Mostre o que você tem.

Eu não hesitei. Ele queria uma luta? Ele teria uma luta.

Avancei rápido, tentando pegá-lo desprevenido, mas Damian era incrivelmente ágil. Ele esquivou facilmente do meu primeiro soco, agarrando meu pulso e me puxando para baixo, me fazendo perder o equilíbrio. Com um movimento fluido, ele me jogou no chão.

— Precisa ser mais rápida, — ele zombou, mas havia uma rigidez em sua voz que não estava lá antes. Ele também estava testando seus próprios limites, tentando controlar o impulso de me subestimar.

Levantei-me rapidamente, ignorando a dor que subia pela minha coluna. Avancei de novo, dessa vez misturando os socos com chutes. Damian se defendeu, bloqueando a maioria dos golpes, mas eu consegui acertar um chute em suas costelas. Ele recuou alguns passos, o que me deu uma pequena sensação de triunfo.

— Boa, — ele disse, sem emoção, mas seus olhos mostravam algo diferente. Talvez respeito? Ou talvez irritação por ter sido atingido.

A luta continuou, mas com o tempo, comecei a perceber que não estávamos apenas lutando fisicamente. Cada golpe era uma tentativa de provar algo. Ele, tentando mostrar que não precisava de mim. Eu, tentando mostrar que não desistiria tão facilmente.

A tensão entre nós estava crescendo a cada segundo, até que finalmente explodiu. Durante uma troca rápida de golpes, Damian agarrou meus pulsos e me prendeu contra a parede, sua respiração pesada batendo contra meu rosto.

— Por que você insiste nisso? — Ele perguntou, o tom exasperado.

Eu o encarei, meu coração batendo acelerado tanto pela luta quanto pela proximidade. Ele estava muito perto. Perto demais.

— Porque você continua me tratando como se eu fosse um peso morto. — Respondi, minha voz cheia de raiva. — E eu estou cansada disso, Damian.

Seus olhos verdes perfuraram os meus por um momento, e pude ver algo passar por eles. Algo que ele estava tentando esconder, mas que era impossível de ignorar.

— Eu não pedi para você estar aqui, — ele murmurou, sua voz mais baixa agora, quase como se estivesse falando mais para si mesmo.

— Não, você não pediu, — admiti, minha voz suavizando um pouco. — Mas estamos nisso juntos agora, quer você goste ou não.

Houve um momento de silêncio. Seus olhos estavam fixos nos meus, como se ele estivesse considerando algo. Talvez fosse a primeira vez que ele realmente me enxergava como alguém que poderia estar ao seu lado, e não apenas como alguém que ele tinha que suportar.

Mas antes que qualquer outra coisa pudesse ser dita, o alarme da Batcaverna soou. Aquele som que indicava que algo estava acontecendo em Gotham.

Damian me soltou imediatamente, dando um passo para trás.

— Isso não acabou, — ele disse, antes de virar as costas e sair da sala.

Fiquei ali por um momento, ofegante e frustrada. Ele ainda estava tentando me afastar, mesmo depois de tudo. Mas algo naquela troca me dizia que eu estava começando a quebrar a parede que ele havia construído. A questão era: ele iria deixar?

Mais tarde naquela noite, Damian saiu em patrulha como Robin. E, como de costume, eu fiquei para trás. Eu sabia que não fazia parte daquele lado da vida dele, mas isso não significava que eu não me importava.

Enquanto ele estava fora, fiquei na Batcaverna, olhando os monitores e tentando entender o que ele enfrentava todas as noites. As ruas de Gotham estavam sempre cheias de caos, e Damian estava lá fora enfrentando isso sozinho, ou pelo menos era assim que ele queria que parecesse.

Eu queria ajudá-lo, mas sabia que ele jamais admitiria que precisava de mim.

Quando ele voltou, horas depois, estava exausto, mas claro, fingia que estava tudo bem. Ele passou direto por mim, tirando o traje de Robin e se preparando para subir de volta à mansão.

— Como foi? — Perguntei casualmente, tentando começar uma conversa.

— Nada com o que você precise se preocupar, — ele respondeu friamente, sem me olhar.

Eu suspirei, sentindo a frustração voltar. Era sempre assim. Ele continuava erguendo barreiras, tentando me manter à distância.

Mas desta vez, eu não deixaria passar.

— Damian, isso não pode continuar assim. Nós precisamos conversar, de verdade.

Ele parou no meio da escada, mas não se virou para me encarar. Havia algo entre nós, algo que crescia a cada dia, mas ele estava determinado a ignorar. E, enquanto ele continuasse fugindo, nós jamais seríamos realmente parceiros.

— Amanhã, — ele disse, antes de desaparecer pelas escadas.

E ali, sozinha na Batcaverna, fiquei imaginando quanto tempo mais levaria até que ele finalmente admitisse que precisava de mim tanto quanto eu precisava dele.

A Guarda de Damian WayneOnde histórias criam vida. Descubra agora