— Boa noite.
Entro em casa e me deparo com Lúcia assistindo TV no sofá, distraidamente.
— Ah, minha nossa! — Ela se levanta em um pulo. — Helena, me perdoe, eu... Eu só...
— Ei, — interrompo-a, sorrindo — relaxa Lúcia, está tudo bem. O que você está assistindo aí? — Jogo minha bolsa sobre a mesa e me sento ao seu lado.
— A novela, menina. — Ela sorri, animada. — Está pegando fogo!
— Jura? O que aconteceu?
— O bonitão mau caráter foi desmascarado. — Ela aponta para a TV. — Agora está ali, tentando levar a coitadinha da mocinha no papo.
— Só para variar, né? — Ironizo.
— Pois é. E não duvido nada que ela vá cair.Ficamos em silêncio assistindo a cena, até que o casal da novela se beija.
— Ah lá, não disse? — Lúcia bate uma palma.
— Por que sempre tem um bonitão sem caráter que engana a mocinha? — Pergunto, ainda inconformada com a ingenuidade da personagem.
— Porque mulher é bicho bobo. E adora um mau caráter.
— Ai, Lúcia. — Dou uma risada. — Só você mesmo.
— Mas eu falo sério. Experiência própria.
— Já se iludiu com um desse tipo?
— E como, menina! — Ela suspira. — Se tem uma coisa em que eu sou boa, é para escolher homem ruim. Ô dedinho podre! — Ela brinca, olhando seu dedo indicador.
— Está falando do pai dos seus filhos?
— Ele também. Mas comecei minhas más escolhas ainda na adolescência. — Lúcia se lembra.Me ajeito no sofá para ouvir sua história.
— Meu primeiro namorado era bonito de doer. Mas o que tinha de beleza, tinha de safadeza.
— Sério?
— Seríssimo. O pilantra me traiu com minha melhor amiga, minha vizinha e até com minha prima.
— Não acredito! Que cretino! Aliás, que cretinos!
— Pois é, menina. Mas eles me fizeram foi um favor, sabe? Me livrei de uma cambada de cobras de uma só vez.
— É isso aí, mandou bem, Lúcia! — Faço um toque com ela.
— Depois de uns namoricos aqui, outros ali, conheci meu ex-marido. E esse eu encho a boca para falar: foi a pior cagada da minha vida! Desculpa o vocabulário.
— Sem problemas. — Dou uma risada.
— A única coisa boa que o traste me deixou foram meus filhos.
— Por quanto tempo vocês foram casados?
— Dez anos. E desses dez, nove foram os piores da minha vida! No começo tudo era lindo, sabe? Mas depois ele mostrou sua verdadeira face. Fazia questão de me humilhar todos os dias, me tratava feito lixo. Não desejo o que eu passei nem para meu pior inimigo.Acaricio sua mão com carinho.
— Como você aguentou ficar dez anos com um cara desses?
— Eu acreditava que ele pudesse mudar, voltar a ser o homem por quem um dia eu me apaixonei. Mas, — Lúcia suspira — isso nunca aconteceu. Só Deus sabe o que eu passei, Helena... O quanto sofri. Mas graças a Ele, consegui me livrar daquele traste.Sorrio fraco.
— E seus filhos?
— Moram com minha mãe, na Paraíba. Quando me separei, voltei para a casa dela, mas a situação por lá não ia nada bem, mal tínhamos comida para pôr no prato. Foi quando decidi buscar por condições melhores aqui em São Paulo.
— Entendo. — Me lembro que vim pelo mesmo motivo e isso de certo modo me emociona.
— Deus têm sido tão bom comigo, que logo que cheguei, consegui um trabalho na casa do Senhor Gama. — Sorrindo, completa: — Todo mês agora mando um bom dinheirinho para eles.
— Há quanto tempo você está aqui?
— Cinco anos.
— Faz cinco anos que você não os vê?Lúcia consente com a cabeça.
— A dor da saudade, às vezes, é quase insuportável. — Uma lágrima corre por seu rosto. — Mas ainda vou trazê-los para cá, tenho fé em Deus!
— É claro que vai. — Sorrio, abraçando-a de lado.
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Plano B
RomanceHelena perdeu seus pais em um trágico acidente, ainda muito nova. Desde então, trabalha duro para sustentar a casa e oferecer uma vida digna à sua irmã, Alice. As dificuldades a fizeram ter sede de vitória e traçar um plano para sua vida: se formar...