Capítulo 1 - Thomas

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   Acordei em uma manhã comum de segunda-feira e fiz o que costumava fazer há anos, todos os dias, em cada momento. Levantei cedo, passei um café forte e sentei na varanda do meu apartamento, no Leblon. O céu estava limpo e o sol estava sorrindo de uma maneira sarcástica. É claro, quem não acharia graça da minha vida pacata e parada de um cara sem graça e sozinho? Tenho 25 anos e nasci por essas bandas mesmo. Minha vida é apartamento e faculdade, nada tão excitante.

   Com a xícara na mão direita e meu livro preferido na esquerda, eu não ouvia nada além de meus barulhentos pensamentos que não paravam de martelar minha cabeça. A solidão novamente se fez presente, resolvi sair do prédio e tomar um ar puro. Vesti minha camiseta branca, minha bermuda esportiva e calcei minhas havaianas. Caminhei até um bar que havia perto do meu apartamento e, no meio do percurso, pensei em como é quente esse lugar. Gostas de suar percorriam o meu corpo enquanto o mesmo clamava pelo ar-condicionado daquele barzinho o qual eu me dirigia. No caminho, carros e mais carros trafegavam de um lado para o outro e me faziam perceber o quão a vida é injusta. A praia estava repleta de pessoas que, saiam de suas pobres cidade em busca de diversão e alegria enquanto os próprios moradores desse lugar viajam para longe. Cheguei ao bar e me sentei, mantendo a postura e serenidade de alguém que não sorri há tempos. Depois de algumas horas sentado, conversando com um garçom que ali conheci há alguns meses quando, voltando de uma balada que fui forçado a ir pelos meus colegas de faculdade, me embebedei de propósito e acabei entrando em declínio me abrindo para ele, decidi que não foi uma boa ideia sair de casa, que nada mudou e que ainda não estava livre de meus malditos pensamentos. 

Tratei de desgrudar a mão daquele café que, assim como todos os meus sentido, estava frio há muito tempo. Me levantei e caminhei até a porta do estabelecimento. 

Meus pensamentos não cansavam de me atormentar, a rotina tinha tomado completamente todas as partículas do meu organismo enquanto eu lamentava e minha simples existência. Parece melancólico e hipócrita um homem chorar tanto pela vida que leva. Tenho um apartamento bonito, frequento uma boa faculdade e tenho pessoas que me chamam de amigo. Acho que o maior culpado por esse melancolismo que carrego no bolso é o amor. Talvez seja rancor ou algo do tipo.

Quando me dirigia em direção à porta, a mesma se abriu sem que eu percebesse, e uma moça esbarrou em meu ombro.

- Desculpa! - Pedi enquanto evitei olhar em seus olhos.

- Desculpa! Retrucou ao mesmo tempo.

Segui de volta para o meu apartamento, minha empregada já deve ter feito o almoço. 

Rosa é uma senhora de 63 anos, que trabalha há 36 anos para a minha família. Quando os meus pais morreram, Rosa prometeu que não me abandonaria, e até hoje continua no emprego.

É, eu sou um órfão. Agora não parece tão dramático o meu jeito de falar. Parece? Apesar de todas as nomenclaturas padrões, não trato Rosa como apenas uma senhora que trabalha para mim. É a minha segunda mãe. 

- O que vamos comer hoje, Rosa? - Perguntei enquanto jogava as chaves da portaria em cima da mesa.

- Eu preparei um fricassê de frango, sei que você adora. - Respondeu sorrindo

- Que ótimo!

Me sentei e comecei a comer devagar, saboreando um de meus pratos preferidos. Esse é um dos poucos prazeres a que tenho direito.

Já ouvi alguns banhistas, na areia da praia em frente ao meu apartamento, falarem uns aos outros que "alegria de pobre dura pouco". Após isso, comecei a me perguntar o que torna uma pessoa pobre. Até porque, existem pessoas tão pobres, mas tão pobres, que só têm dinheiro.

Sem poder ao menos saborear por muito tempo minha comida - alegria de "pobre" dura pouco - Benjamim começou a me ligar, impaciente.

Eu estou atrasado, como sempre. Entrei em meu carro e saí com pressa. Em uma velocidade a cima da que costumo andar, eu cortava os carros e olhava para o meu relógio. Até que, ao virar em uma rua, fui obrigado a frear bruscamente. Uma moça atravessava a rua, desatenta, com os fones de ouvidos e sua calça legging. Não achei tão ruim, era a minha oportunidade de descontar nela tudo que me angustiava. É egoísta, mas vou poder justificar pondo a culpa nela. Quando ia descarregar toda minha fúria por meio de palavrões, fiquei sem reação ao ver aquilo. Ela parecia não se importar, atravessava de um lado para o outro com passos lentos, mexendo em seu celular e sorrindo sozinha para uma suposta mensagem que acabara de receber.

Quando ela finalmente atravessou a rua, eu acelerei devagar enquanto a acompanhava com o olhar. Seu corpo continha curvas parecidas com a de uma modelo. Era bonito de se ver, pena que deve ser mais uma dessas mulheres burras e vaidosas que não ligam para ninguém além de si. Odeio esse tipo de pessoa, me lembra eu mesmo.

Benjamim viu o meu carro e não fez outra cara senão a de raiva, ele não perde tempo. Já deve ter começado a elaborar os sermões sobre responsabilidades.

- Você não tem juízo, cara? - Gritou enquanto abria os braços enquanto me observava sair do carro

- Benjamim, foi só um pequeno atraso. Não precisa de tanto drama. -Falei revirando os olhos.

- Um pequeno atraso? - Perguntou - Estou há horas te esperando.

- Ok! Me desculpe. O que quer falar comigo?

- Tenho uma festa para ir, quero te levar. - Falou abrindo um enorme sorriso.

- Não gosto de festas, você sabe. - Respondi enquanto dava as costas e caminhava.

- Você não sai daquele prédio, só sabe estudar e ser arrogante, Thomas!

- Isso não é verdade. - Falei, injuriado - hoje eu fui tomar um ar. Sabia?

- Eu não vou insistir, cara. - Respondeu - Você não é criança, pode ficar enfurnado naquele lugar. Eu não quero mais saber! - Falou enquanto virava as costas e seguia em direção oposta à minha.

- Prometo que pensarei em respeito, não precisa fazer tempestade em copo d'água. - Gritei parado feito estátua.

Em um ato de descontentamento, Benjamim, sem olhar para trás, acenou para mim. - Ok! Ok!

O amor que encheu a barrigaOnde histórias criam vida. Descubra agora