Capítulo 14
MATILDE
As minhas pernas tremiam à medida dos sons provocados pelos meus saltos a embater no asfalto. Sentia-me a ferver, mais nervosa que nunca. Tudo aconteceu demasiado rápido. Fora notificado ontem para comparecer hoje numa esquadra da polícia desta zona, fazer algumas declarações, logo depois ser ouvida pelo tribunal e um advogado. Era tudo ainda muito escuro para mim, só sei que viajaram ao passado, remexeram, e agora querem a verdade.
Tenho muito medo do que possa vir a acontecer. O pior dos cenários assombrou a minha noite e eu passei-a ao lado da minha menina, enquanto chorava pelas possibilidades infinitas.
– Calma, Matilde – Francisco viera comigo, pois não ficaria sossegado sem saber o porquê disto agora. – Não te faz nada bem estares assim – nada respondi, enquanto ouvia, desta vez, o som das rodas do seu carrinho sob os paralelos.
– Bom dia. Eu sou a Matilde Moreira Silva e fui notificada para a comparência em favor de fornecer algumas declarações na investigação do homicídio da família Clemente. – estremeci ao mencioná-los.
– Bom dia, pode aguardar aqui, os nossos inspetores vêm já – sentei-me, e a minha perna ainda tremia. Joana também sentia que se passava algo, pois estava de novo bastante irrequieta desde que chegáramos.
Alguns minutos se passaram até que eu ouvisse passos na nossa direção. – Matilde Moreira Silva – levantei-me. – Inspetor Hugo e Inspetora Sara – apresentaram-se. – Suponho que já saiba porque está aqui – neguei, cabisbaixa. – O curso das investigações do homicídio foi um caso encerrado logo uns dias após ter acontecido. Recentemente surgiram novas provas que nos levaram a reabrir a investigação e contactar os familiares próximos e amigos – a minha Joana começa a chorar e eu peço a Francisco que a acalme.
– Eu não sei como posso ajudar. Eu apenas tratei do funeral da família, não tenho conhecimento de mais nada –
– Esse é o ponto que a traz aqui hoje. Enquanto recolhemos de novo as provas surgiram provas de existência de um seguro de vida familiar. Como sabe, os Clemente eram uma família abastada em dinheiro, mas não em constituição por essa mesma razão a nossa última opção é você – Inspetora Sara explica-me e eu sinto-me cada vez mais perdida.
– Pelo que sei eles tinham um tio de família... –
– Ele já faleceu, entretanto. – interrompe-me Hugo. – As cláusulas do seguro cobrem na totalidade o caso de homicídio, pelo que todos os rendimentos da família iriam para um familiar ou amigo mais próximo. Aquando da sua renovação, o seu nome foi adicionado. –
– O quê? Porquê? –
– Pelo que soubemos através de amigos comuns, a senhora Matilde e o Bruno Clemente eram bastante próximos. Tinham até um projeto em iniciação quando tudo se descambou naquela família. Eles eram muito protetores em relação ao seu dinheiro, pelo que somente você era a única não familiar inscrita no seguro caso algo lhes acontecesse –
– Matilde – oiço o meu irmão chamar-me e aponta para Joana. – Acho que é a altura de lhes dizeres –
– Dizer o quê? Está a ocultar algo? –
– A minha filha, a Joana, é filha do Bruno Clemente – ambos os inspetores parecem em choque e interrogam-se com o olhar.
– Mas isso muda todo o rumo da situação. Nesse caso a senhora vai ser automaticamente detentora dos valores mensais do seguro caso se confirme ser mãe do neto deles. –
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(desa)sossego
RomanceEm plena época balnear, Matilde fica um pouco aflita quando tenta gerir o seu pequeno negócio e conciliar com o que a vida lhe concedera devido a erros do passado. O calor e a inquietação obrigaram-na a procurar um novo funcionário para o café qu...