MATILDE
O ar campestre refrescara a minha mente e reconduzira todos os meus pensamentos. A caminha fora matinal e duraria cerca de uma hora no (re)conhecimento destes tão belos campos que, em criança, foram percorridos pelos quatro irmãos e todos os dias passeiam nos olhos dos nossos pais.
– Mamã, podemos levar aquela flor para casa? – Joana perguntava entusiasmada enquanto apontava para uma margarida que nascera de forma selvagem num dos campos de pastagem.
– Querida, acho que ela não iria gostar que a retirassem do seu habitat natural – ela caminhava de mãos dadas comigo, sempre questionando acerca do seu redor, parecendo abstraída do assunto que assombrara a sua noite. – Quando chegarmos à casa de Lisboa, escolhemos uma flor para ti, sim? –
– A minha antiga professora disse que as plantas eram como nós, humanos, precisavam de ser cuidadas para não -mu-cha-rem e ficarem tristes. Eu quero cuidar d'uma planta – a família que caminhava a passos afastados de nós parara e contemplava de repente a menina de quatro anos que corou com toda a atenção dada.
– Oh, Joaninha – não sabia o que lhe dizer, apenas recebi o seu abraço pequenino na minha cintura, tentado esconder-se dos rostos que a observavam ternurentos.
– Ma-mã! – Madalena largou a mão do progenitor com uma habilidade impressionante e correu até mim. Filipe ainda demorara a recuperar do susto de perder a menina de vista, respirando de alívio quando a viu abraçada a mim, do lado contrário à mais velha.
– Não precisam de ser ciumentas, chego para as duas e para mais – sorri para baixo onde as suas faces queridas me encaravam. Era impossível não me derreter com os olhos claros e as bochechas preenchidas que elas tinham.
Voltei a focar-me no nosso regresso pelo caminho que percorríamos, e ainda faltavam algumas centenas de metros para chegar a casa, pelo que contemplei a pequena cascata que atravessava os campos, transportando água de uma ribeira que já trazia alguns quilómetros de Espanha.
– Perfeito! – oiço alguém dizer e quando levanto o meu olhar encontro Catarina encarar-me com a sua câmara fotográfica. – Preciso é de um novo cartão de memória – a mulher comenta, fazendo o marido rir. Ele conhecia-a demasiado bem. Uns meros oito gigabytes de memória não serviriam para as que ela quereria manter em fotografias que guarda nos álbuns de recortes que tanto se concentra em realizar.
– Logo sempre vamos às festas de Freixa*? – Duarte questiona, parando o seu trajeto e o da namorada, que iam a uns largos metros de nós. – Não trouxe a Alice para ver animais da quinta –
– Mas eu gosto... – ela sussurra mais baixo, no seu ar tímido e envergonhado pelas palavras do meu irmão mais novo.
– Duarte, não sejas tão insistente. Nós vamos sim, mas é porque estamos todos juntos e merecemos – João responde roubando qualquer argumento ao irmão quinze anos mais novo.
– Tudo bem, eu só precisava de confirmar – abana os ombros em desistência e recomeça a rota. Consegui reparar no pequeno pormenor de Alice recolher de novo as suas mãos e os seus músculos tensos cederem lugar ao relaxamento total e a um sorriso mais genuíno, aquele que sempre caracterizara Duarte desde bebé.
– Mimo, mamã! – Madalena pedia, entretanto, depois de ter trocado de papéis e ter deixado o pai com Joana. Com alguma dificuldade consegui pegá-la no colo.
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(desa)sossego
RomanceEm plena época balnear, Matilde fica um pouco aflita quando tenta gerir o seu pequeno negócio e conciliar com o que a vida lhe concedera devido a erros do passado. O calor e a inquietação obrigaram-na a procurar um novo funcionário para o café qu...