Matilde
Repousava a minha cabeça sob o banco, observando as paisagens pelas quais passávamos nesta longa jornada. Nas minhas mãos um simples caderno onde eu escrevia as palavras que tanto queria dizer e simplesmente não saiam. A uma certa altura as rochas tornaram-se mais visíveis, o reconhecimento desta área fez-me acender uma pequena luz sob a minha mente vazia até ao momento.
"Poderia eu pedir por mais?
Entraste por aquela porta em busca de novas oportunidades, surpreendeste-me em todos os aspetos positivos. Todos os truques que precisavas saber foram captados em segundos e já trabalhavas como um profissional em menos de nada.
A primeira vez que Joana se moveu ao teu toque senti uma ligação forte para com a menina de sete meses de gestação, jamais me ocorreu que isto se tornaria em algo tão ESPECIAL.
Os dias passavam, e a cada minuto Joana crescia e desejosa para nascer. Obrigada por teres estado lá nos momentos mais tristes para nós, porque compreendeste a nossa situação, porque vieste trazer sossego à nossa vida.
Não quis acreditar quando vieste com a conversa que eu me tornara mais do que uma amiga, afastei-te, e só não mereceste um estalo por te estares a apaixonar por mim pois daria nas vistas. O momento em que soube que não estavas a brincar e aceitarias a Joana com todo o coração, sabes o que aconteceu.
Ela ainda era uma bebé, quando iniciámos um novo caminho, desta vez JUNTOS e eu nem sonhava que a nossa história estava ainda por escrever. "
O toque delicado da caneta sobre a folha de papel, anteriormente branca, que fora tomando cor e um novo aspeto neste pequeno percurso até eu reconhecer os grandes portões e as paredes de pedra antiga repletos de flores que eu tanto adorava. Olhei para os bancos detrás do carro e sorri quando vi as duas meninas adormecidas durante todo este tempo.
– Vou acordá-las – disse, entusiasmada com a nossa chegada, e levantei-me assim que ele estacionou o automóvel. – Princesas? Chegámos aos avós – fiz pequenos carinhos nas bochechas de cada uma, recebendo somente movimentos mínimos dos seus corpos pequeninos.
– O teu irmão acabou de estacionar – Filipe informa, enquanto retirava as malas e olhava para o carro de Francisco.
– Meus amores, vamos lá. Não queriam ver os avós? – sei que elas resmungam quando abrem os olhos e estranham o ambiente ao seu redor, sentindo-se confusas por segundas. – Vocês adormeceram em Lisboa, e agora estamos aqui – Joana foi a primeira a raciocinar direito e, já sem quaisquer ajudas, retira-se do seu lugar e sai do carro. Madalena levantou os seus braços e o seu esforço foi nulo até que eu a pegasse nos meus braços e a retirasse do seu pequeno ninho.
O relógio marcava as nove horas da manhã, relembrando-me das longas quatro horas de viagem até à aldeia onde nascemos. Francisco deixara a cidade mais cedo que eu, mas dada a gravidez da mulher, as paragens tornavam-se frequentes e acabaria por chegar quase ao mesmo tempo que nós.
– Estou exausto – Duarte reclama, e recebe um raspanete de Francisco; o mais novo dormira e não ajudou o mais velho na condução do veiculo. – Ninguém vos mandou sair de casa às cinco da manhã, poderíamos ter vindo logo à tarde –
– Duarte, as pessoas não têm culpa da tua rabugice – Alice diz, e de forma delicada, une as mãos à do namorado que parece recuperar do momento anterior e sorri fraco. – Isto é deslumbrante – era a sua primeira vez aqui na quinta, e os seus olhos estavam bem abertos à natureza contemplativa do local.
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(desa)sossego
RomanceEm plena época balnear, Matilde fica um pouco aflita quando tenta gerir o seu pequeno negócio e conciliar com o que a vida lhe concedera devido a erros do passado. O calor e a inquietação obrigaram-na a procurar um novo funcionário para o café qu...