MATILDE
Apertava os últimos botões da sua camisa, os dedos trémulos nas suas ações. A dificuldade em dar o nó final levou-me até ele, e em silêncio, fi-lo para que ele não se sentisse, ainda mais, atrapalhado. Plantei um pequeno beijo na sua bochecha, levantando a palma dos meus pés para o conseguir fazer. Ele fechou as suas pálpebras, e respirou fundo. Quando as suas mãos desviaram a sua atenção para a minha cintura, sentia-as ainda frias, com algum suor do nervosismo recorrente do que aconteceria dentro de momentos.
– Filipe, por favor, olha para mim – pedi, delicadamente trazendo o seu rosto na minha linha de observação, memorizando cada detalhe deste e a sua barba aparada. – Não tens porquê estar assim, apenas chegando lá saberás do que se trata. –
– Prometo-te a tentativa, apenas – beijou a minha testa, alcançando os meus cabelos lisos. – Volto na hora do almoço, ficas bem? –
– Sim, amor – e com um longo beijo deixou-nos esta manhã para uma reunião que lhe estava a causar cabelos brancos.
Procurei pelas duas traquinas da casa, encontrando-as já preparadas para mais um dia de aulas, cada uma com o seu animal de estimação ao colo, enquanto o canal preferido desta casa estava acionado na televisão da sala. Para ser mais precisa – Panda –. O relógio da parede deixava-me saber que eram pouco mais do que as oito horas da manhã.
– Vamos para a escola, meninas? – as mochilas preparadas no dia anterior foram pegadas por mim, colocando da mesma forma a mala ao meu ombro.
– Já? – a mais velha questiona, olhando-me. – Mas a Barbie 'tava a dar –
– Eu sei, meu anjo. Mas vamos ter com os teus amigos e da mana, e quando chegares vemos todos juntos, pode ser? – Madalena estava a leste de tudo. Joana levantou-se, sem qualquer protesto, e trouxe Madalena com ela, que com alguma dificuldade em equilibrar-se com o gesso ainda, teve de ser ajudada por mim.
A viagem fora nada mais do que cinco minutos até ao seu infantário, onde as deixei junto àquelas que iria cuidar delas por mim durante o dia. Hoje, especialmente, não iria trabalhar para o café, consultas de rotina chamavam por mim. Omiti todo o nervosismo desde o meu acordar até deixar as pequenas junto das educadoras, mas o tremer das minhas mãos enquanto atravessava a ponte sob o rio tejo e me aproximava do hospital da luz denunciava a minha situação. É agora ou nunca. E o nunca? O nunca assustava-me.
– Bom dia, eu tenho uma consulta com a Dra. Sofia dentro de quinze minutos – a secretária anotou a minha presença, e eu fui para a sala de espera, demasiado conhecida por mim durante o decorrer destes anos.
Fui trocando algumas mensagens com o meu marido, que também se encontrava à espera de ser chamado, e com a minha melhor amiga e grávida preferida que me dizia em como já não conseguia mover-se na sua própria casa sem ficar exausta por longos dias. Sorri, sabendo que estávamos prestes a conhecer o bebé Lourenço, o qual esperámos por mais de três anos, e eles esperaram por mais de cinco.
– Matilde Silva. Consultório 2, por favor – indicavam e a minha caminhada parecia feita em câmara lenta.
A mesma porta, as mesmas recordações; o receio dos resultados finais do pior momento das nossas vidas. Abri a mesma e a mulher sorridente cedeu-me a entrada. Desde o primeiro momento estivera lá a acompanhar-me.
– Bom dia, Matilde. Muito gosto em ver-te – sentei-me frente a frente a ela, reprimindo a ansiedade num sorriso. – Já tenho o resultado dos exames que realizaste à umas semanas. E verifiquei no teu processo o teu calendário, e queria conversar contigo sobre o DIU (dispositivo intra-uterino). –
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(desa)sossego
Storie d'amoreEm plena época balnear, Matilde fica um pouco aflita quando tenta gerir o seu pequeno negócio e conciliar com o que a vida lhe concedera devido a erros do passado. O calor e a inquietação obrigaram-na a procurar um novo funcionário para o café qu...