Capítulo 7

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MATILDE

00.00. O meu corpo não cedia ao sono, os meus olhos a querer fechar. A minha mente em alerta. Os meus pais já se haviam deitado à algum tempo e eu queria ter a certeza que este era o momento. Senti a primeira contração à vinte minutos, quando subia os pequenos degraus de acesso ao meu quarto. Desde então não consegui sossegar. Andava de um lado para o outro, e segundo o que o espelho revelava, o meu rosto demonstrava um imenso cansaço.

00.10. Segunda contração. Com um menor espaçamento desta vez. O meu olhar preso no relógio enquanto ainda circulava pelo apartamento. A pressão exercida era cada vez maior. A respiração tornava-se difícil de controlar dado o nervosismo e as pontadas que sentia pelas minhas costas.

00.20. Primeiro grito de socorro. Embora me parecesse mais um sussurro. As contrações eram regulares. Cada vez diminuíam o seu tempo e aumentavam a intensidade. Estava a começar ser insuportável manter-me em pé. A parede era a minha âncora neste momento. O escuro impedia-me de saber onde estava neste momento. Era o corredor.

00.30. Dei um murro na parede, com a esperança que as dores desaparecessem. Nesse momento soube que era hoje que ia conhecer Joana. As contrações cada vez menos espaçadas. Regulares, intensas, dores nas costas e um sufoco enorme na parte inferior da minha barriga. Decidi gritar mais alto.

00.32. Os meus pais aparecem na porta do quarto de hóspedes. A minha mãe despenteada e o meu pai estava com os olhos mais fechados do que abertos. A luz foi acesa e assim que eles me olharam correram. Os meus punhos cerraram-se assim que senti de novo um aperto demasiado doloroso. Engoli em seco e tentei explicar-lhe o que estava a acontecer. A minha mão logo percebeu.

- Cinco em cinco minutos - rugi e agarrava com mais força a parede, com medo de perder as forças e cair mesmo ali.

- Ai... António Valente! Vai buscar as malas e vestir-te. A nossa netinha vai nascer. A qualquer momento - já não conseguia manter-me em pé. O meu pai deu outra corrida até ao quarto onde estavam hospedados.

- Dói muito, mãe! - ela sentou-me na cama e escolheu uma roupa confortável. Após se trocar com um fato de treino meu, ela despiu-me e voltou a vestir-me um vestido bastante largo.

- Respira comigo - os exercícios de respiração começaram. O controlo era essencial, e manter a calma também. - Isso, querida. Não tarda nada já tudo isto passou -

00.45. Um líquido desceu pelas minhas pernas no momento em que atravessávamos a ponte vinte e cinco de abril. O meu pai conduzia, e eu pedi-lhe que mesmo assim não excedesse limites e fosse com calma.

Quase uma hora da manhã quando fui recebida numa cadeira de rodas pelas enfermeiras responsáveis pelo nascimento da minha pequena. Por surpreendente que pareça, a mãe de Filipe era uma delas. A cama não parecia nada confortável enquanto me virava para um lado e para o outro tentando a todo o custo aliviar as dores. O meu pai ficara lá fora a enviar algumas mensagens para os meus irmãos que se encontravam num hotel da zona onde vivo. A minha mãe segurava uma das minhas mãos e acariciava as minhas costas.

- Matilde, a sua dilatação está a completar os sete centímetros. - 03.30. - Gostava de lhe poder dizer que podemos administrar a epidural, mas já é tarde demais - Marta mostrou-me o seu melhor sorriso reconfortante.

05.40. O desespero já era muito. O calor dentro deste estabelecimento e fora não me ajudava. O meu corpo estava todo molhado do suor que o percorria. A minha médica havia chegado mesmo agora e a minha dilatação estava quase completa.

- É agora, Matilde - a minha mãe beijou a minha testa repetidas vezes. - Queres que fique aqui a assistir? - logo disse que sim e o meu pai também deixou alguns beijos sobre a minha frente e saiu disparado da sala de partos. Eu sempre soube que ele não conseguira assistir aos nossos nascimentos pois ficava muito aflito e chegava mesmo a desmaiar só de ouvir os gritos da minha mãe.

(desa)sossegoOnde histórias criam vida. Descubra agora