Capítulo 32

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MATILDE

Ajustei o casaco à sua barriguinha, calçando-lhe em seguida os sapatinhos de renda que já pertenceram à sua irmã. O seu olhar estava fixado em nós, e eu não pude deixar de reparar o quanto a cor se alterara desde o nascimento. Desde o cinzento claro, ela agora possuía um verde marinho, que já fora azul.

Beijei a sua testa antes de a colocar no seu carrinho e suspirar porque finalmente iríamos para casa. Senti que em dois anos da minha vida, tudo se repetira, como num ciclo. Vivia como gerente de um café à beira mar para ser mãe de Joana e ainda ter tempo para conhecer o amor da minha vida que me ajudou a criar este ser humano pequenino nos meus braços.

Madalena dormira durante todo o trajeto de regresso a casa. Com algumas dificuldades por conta do trânsito, uma hora mais tarde estávamos frente a frente à nossa moradia, e eu retirava o cesto da bebé.

Abrimos a porta de entrada, e tudo se voltara a reviver. Surpreendida pelas decorações de "Bem-Vinda Madalena" e "Feliz UM ano da Joana" deixei que as lágrimas agradecessem. Joana pegara num dos dedos de Francisco, e com uma coroa de flores, veio até mim, sempre naqueles passos descuidados.

Mama! – soltou uma risada, e eu pousei o cestinho da bebé Madalena no sofá antes de pegar na minha miúda mais velha. – Pa-pá! – era a palavra que ela soletrava melhor, e encostando-se ao meu ombro, apontou a sua mão até Filipe, que também não a via fazia uns dias. Os seus cabelos loiros estavam apanhados num capucho.

Olá, filhota ele murmurou, num momento só deles. Passei-a para o seu colo para poder cumprimentar as famílias.

Reparei na presença dos pais de Filipe e da sua irmã, que decidira fazer-lhe esta surpresa. Dei-lhes a conhecer Madalena e um pouco mais da sua história ao longo destas semanas.

– Ela ainda é tão pequena – Beatriz falara, enquanto acariciava a nuca morena da bebé. – Posso arriscar e dizer uma coisa? – assenti e ela prosseguiu. – Ela tem muitos traços do meu irmão. Os olhinhos são tão verdes, e o nariz e a sua boquinha são toda elas do Filipe –

– Já tinha reparado nesses detalhes – rio. – É tão giro quando cada um deles sai a apenas um dos pais. A Joana é Silva pura, a Madalena é parecida com vocês –

– Obrigado por esta prenda na família. Já sentíamos que estava na hora do nosso Filipe se responsabilizar inteiramente por algo. – o olhar de Marta para com o seu marido deu-me, mais uma vez, a entender que havia ali algo que não encaixava. – Oh, peço desculpa – disfarçou, entregando-me Madalena que havia passado para o seu colo. Sorri, fraco, mas a minha mente não conseguia parar de montar esquemas para compreender o que se passara.

– Desculpa, pelos meus pais. Eles estão a ser demasiado misteriosos, não queremos, de todo, assustar-se com os segredos de família. Adoramos-te e admiramos-te imenso, Matilde. – Bea disse-me ao ouvido, já com o seu filho ao colo. – É melhor pousá-lo sobre o chão. Ele parece adorar a companhia da Joana, sempre adorou – fala, enquanto o bebé esperneia em direção a Joana e Filipe. – Até logo –

Perdi-me um pouco entre conversas com os meus pais acerca da minha saúde e da saúde de Madalena, que estavam estáveis neste momento, e as novidades partilhadas com Catarina, João e Duarte, que haviam passado estes dias a passear por Lisboa e os seus arredores, conhecendo mais um pouco a cultura da capital do país.

– O palácio de Sintra sempre foi um sonho, adorei o dia que passámos lá. – João contava entusiasmado, e eu queria desculpar-me pois perdera o ritmo da sua conversa a meio quando vi Filipe transportar Madalena, e os nossos olhares fixaram-se sem dizer quaisquer palavras. – Matilde, estás a ouvir-nos? –

(desa)sossegoOnde histórias criam vida. Descubra agora