I

106 5 1
                                    

— Já pensou que isso pode ser psicológico? — disse minha irmã nem tão querida. — Até agora não conseguiram achar o seu problema e você só vive reclamando.

— Priscila! — minha madrasta chama sua atenção. — Sua irmã não tem um problema psicológico.

Estávamos vindo do hospital, pela décima quarta vez essa semana fui convocada para fazer exames, quem sabe assim eles descobrem o que tenho. Olho pelo vidro do carro, vejo algumas pessoas brincando no parque do centro da cidade, que mesmo com o pouco de neve e o frio que ainda resta, estava lotado. Suspiro e sinto meu celular vibrar, desbloqueio e leio a mensagem de Abner que me chamava para dar uma volta mais tarde.

— Posso sair mais tarde? — pergunto olhando para meu pai, que dirigia o carro. — Abner me chamou para sair.

— Não vejo problema nisso. — disse minha madrasta. — O que acha querido?

— Por mim, tudo bem. — respondeu meu pai olhando para a rua.

— Se ela vai sair, eu também vou. — Priscila olhou para sua mãe. — Juro que não vou chegar tão tarde assim.

— Você disse isso da última vez. — disse meu pai.

— E realmente você chegou cedo. — digo olhando para ela. — Seis horas da manhã é bem cedo.

Priscila me olha e mostra a língua enquanto revira os olhos. Respondo à mensagem de Abner e pergunto aonde vamos. Sinto meu braço esquentar novamente, estico ele, movimento meus dedos, abro e fecho a mão e lentamente ele vai voltando ao normal. Esse é o tal problema que Priscila havia dito ser psicológico.

— Chegamos meninas. — disse meu pai parando em frente ao restaurante da família. — O que querem para o almoço?

— O de sempre, como sempre. — minha irmã desde o carro.

Pego minhas coisas que estavam em cima do banco e abro a porta, papai me ajuda a descer e fecha a porta logo após. Ultimamente estou muito fraca, não sinto fome e às vezes passo dia sem comer nada.

— E você, meu amor, vai querer o quê? — ele deposita um beijo em minha testa.

— Estou sem fome. — digo sentindo meu celular vibrar novamente.

— Desculpe, mas dessa vez você vai comer. — disse minha madrasta vindo até nós. — Faz dois dias que você não come nada.

— Assim você vai acabar desmaiando... — papai abre a porta do restaurante para que eu entre. — Outra vez.

— Tudo bem, eu como qualquer coisa. — reviro os olhos e me sento em uma mesa um pouco mais reservada.

— Boa menina. — ele abriu um sorriso e me abraçou. — Já peço para trazerem teu almoço.

Ele vai em direção da cozinha, meu pai é chef e minha madrasta ajuda na administração do restaurante, minha mãe ajudava meu pai na cozinha até o dia em que ela morreu, depois disso o restaurante ficou fechado por uns anos, até Cinthia entrar nas nossas vidas com sua querida filha Priscila. Desde então, ela cuida de papai, do restaurante e da nossa família.

— Uma comida especial para uma pessoa especial. — disse Lucas colocando meu almoço na minha frente.

— Obrigado. — sorrio de leve. — Hoje não era a tua folga?

— Sim, mas como David teve que te levar no médico, ele pediu para eu vir. — ele se senta. — E como foram os exames dessa vez?

— Normais. — suspiro e pego o garfo. — Até agora não acharam nada, Priscila até acha que isso é psicológico.

— Aquela garota. — ele revira os olhos.

— Respeita minha irmãzinha querida. — digo olhando para ele. — Enfim, quer comer? Meu pai exagerou no prato.

— Não, você vai comer tudinho. — Lucas encosta seu corpo no acento da cadeira. — E teu lance com Abner?

— Que lance? — olho para o prato, para a parede, menos para Lucas.

Essa conversa tinha mesmo que acontecer justo hoje?

— Você sabe. — ele dá de ombros. — Amigos? Namorados? Amizade colorida?

— Não temos nada. — olho ele, como um pouco do arroz e pego uma cenoura que estava no prato.

— Não é isso que parece. — ele sussurra.

— Temos mesmo que conversar sobre isso? — olho ele. — Tipo, Abner me dá maior apoio, sempre que preciso ele está do meu lado. Se você soubesse o quanto ele me faz bem.

— E se você soubesse o quanto ele te engana. — ele me encara. — Eu só quero o seu bem.

— Não parece que quer o meu bem. — falo baixo. — Vive me desanimando.

Um silêncio se formou entre nós, Cinthia chama por Lucas e ele se levanta, se aproxima de mim e deposita um beijo na bochecha. Pego o celular e começo a ver as notificações, havia duas mensagens de Abner e umas cinco mensagens de Aline.

"Combinado, princesa."

"Te busco às oito."

Respondo ele e passo para as mensagens de Aline, que estava desesperada.

"AMIGAAAAA"

"Lucas me falou dos exames hoje"

"Não fique brava com ele"

"Mas me conta! Já saíram os resultados?"

"Me responde mulher!"

Sorrio e ligo para minha amiga, que estava desesperada por notícias.

"Até que enfim você apareceu!" — disse ela assim que atende o celular. — "Me conta tudo."

"Oi Line." — digo sorrindo e como mais um pouco.

"Pela sua voz, as notícias não são boas." — ela suspira. — "Pode falar."

"Não acharam nada, disseram que precisam de mais exames, exames mais profundos." — respondo enquanto bebo um pouco do suco de laranja que Lucas também havia trazido.

"Sério amiga? Poxa, estou triste por você." — ela responde. — "O que você pensa que pode ser?"

"Eu realmente não sei mais." — suspiro. — "Já pensei que fosse LER ou tendinite, mas os exames negaram tudo isso."

"Está doendo agora?"

"Não, só um pouco enquanto eu estava vindo para casa." — olho para frente e vejo o restaurante se enchendo. — "Preciso da sua ajuda, vou sair com Abner mais tarde e não sei o que vestir."

"Você deveria vestir a sua dignidade e tomar vergonha na cara e largar esse homem." — disse minha querida amiga me dando um belo conselho. — "Preferia mil vezes o Lucas."

"Não tenho, nunca tive e nunca terei nada com o Lucas." — reviro os olhos. — "Coloca isso na tua cabeça."

"Não sou eu que tenho que colocar coisas na cabeça." — ela dá uma pausa. — "É você, e isso se chama juízo."

"Enfim, vai me ajudar?" — digo tomando mais um pouco de suco.

"Sim, eu vou." — disse ela. — "Mas agora vou lavar umas louças e brigar com umas crianças aqui."

"Obrigada, até depois."

MariposaOnde histórias criam vida. Descubra agora