Dias depois da "Grande Catástrofe", como eu resolvi batizar os últimos acontecimentos da minha vida, boa parte de mim ainda acredita que a última semana inteira não passa de um grande pesadelo do qual eu vou acordar em breve, então me recuso a sair da cama.
Eu sei, pela Sarah e pela Beatrice, que o meu nome tem sido cochichado pelos jardins e corredores do campus. Todo mundo quer saber o que uma caloura de padrão de beleza mediano tem de tão especial para chamar atenção do maior astro do rock da atualidade.
Lily Adams sabe muito bem que as pessoas estão intrigadas e curiosas. Acho que a mulher tem uma veia na publicidade, e está disposta ao que for necessário para garantir o sucesso do reality, então me envia uma mensagem reforçando a proposta que fez na gravadora.
— Como assim Lily Adams te mandou um DM? — Sarah entra no meu quarto sem bater.
Eu estou largada na cama de pijama e cabelo embolado, sem nenhuma motivação para levantar e abrir a janela. Então Sarah faz. Empurra a cortina pesada e deixa a luz do dia invadir o pequeno mausoléu da minha reputação. Ela também tem cuidado das minhas redes sociais — que agora já contam com algumas centenas de milhares de seguidores — já que, eu mesma, não tenho coragem de entrar na internet desde a Grande Catástrofe.
— Ela me queria no Reality Show dela — comento, apática.
— Tá brincando? Você já sabia?! — Sarah pula na cama, sentando-se sobre o próprio pé. — Por que não disse nada?
— Não pensei que fosse importante. — Chacoalho os ombros.
Minha amiga arregala os olhos.
— Nada importante?! — Parece chocada. — Você tem noção da oportunidade que quase deixou passar?
— A oportunidade de ser a palhaça no circo do Pedro? Não, obrigada.
— Você nunca ouviu aquele ditado? Se a vida te der limões, faça uma limonada. Sei que você não queria essa exposição, mas veja o lado positivo: você tá semi-famosa, e isso é mais do que a maior parte das pessoas que se mudam para Los Angeles em busca de sucesso podem dizer.
— Grande coisa. E o que eu faço com essa "semi-fama"? — Faço aspas com os dedos. — Porque eu continuo sem nenhum dinheiro, e até onde eu sei ninguém constrói uma carreira baseada em ser a ex-namorada de alguém.
— Se a Kim Kardashian construiu uma carreira baseada em uma sex tape — ela diz —, dá pra fazer uma carreira a partir de qualquer desastre. Ser a ex do Pedro é o que a gente tem pra agora. Vamos trabalhar com isso e depois a gente traça um plano para afastar a sua imagem da dele. Um passo de cada vez. O primeiro é você ligar pra Lily Adams e negociar um cachê bem gordo pra colocar essa bunda no reality, porque, até onde sei, você precisa da grana e ela, da audiência.
— Acha que a grana vai ser boa?
O eco da minha própria voz é o que me faz perceber que estou realmente considerando.
— Mais do que uma vaga de garçonete ou secretária. Com certeza.
Suspiro longamente. Claro que é tentador, mas...
— Eu não sei se eu sou interessante o suficiente para um reality... tipo, eu não sou uma modelo ou uma socialite rica. Eu só trabalho, estudo e preciso de grana, como 90% da população. Se eu tivesse uma vida mais legal, tipo a sua...
— A minha vida não é diferente da sua — Sarah rebate.
— É sim! Você vai pra festas de vez em sempre, tira fotos e tem um blog! Eu queria ter um blog, mas nunca teria tantos seguidores que nem você.
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Ninguém mais que nós dois
ChickLitAo abrir mão de sua vida pacata para trabalhar e cursar faculdade, a aspirante a jornalista Julie Affonse irá descobrir que, na frenética Los Angeles, nem tudo será tão fácil quanto esperava. Mas, de todas as coisas que poderiam dar errado, ela não...