Five

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A leve claridade matinal atinge os meus olhos assim que estes se entreabrem ligeiramente. Inspiro profundamente, esticando os meus braços na lateral.

Vejo as horas no pequeno relógio de pulso instalado na mesa-de-cabeceira. São sete da manhã. Um pouco cedo talvez. Porém, por muito que a cama seja um bom local para pensar, eu não quero ser invadida por sentimentos que me irão deprimir. Eu mudei-me para alcançar um pouco de paz e tranquilidade na minha vida. E isso é o que pretendo realizar.

Impulsionei-me para fora da cama e senti a pele das minhas pernas arrepiar-se, não estando acostumadas ao ambiente relativamente frio. Apresso-me a vestir algo simples e cómodo para montar.

 Na casa de banho, faço a minha higiene diária e predo o meu cabelo num rabo-de-cavalo normal de modo a que possa colocar o toque. As olheiras por baixo dos meus olhos diminuíram visivelmente, permanecendo apenas os meus olhos bassos e cinzentos em contraste com a minha pele pálida. 

Atravesso a casa, descendo as escadas vagarosamente, evitando o mínimo ruido possível. As minhas botas de borracha executam pequenos sons agudos enquanto caminho, tornando o insignificante barulho bastante notório por entre o silêncio da casa.

Acabo por encontrar a porta principal, abandonando a habitação e dirigir-me num passo mais descontraído até aos estábulos. Inspecciono o ambiente a meu redor. Tudo se encontra na maior das passividades. Questiono-me se ainda estarão a dormir, o que eu penso ser pouco provável.

Caminho até à box do meu garanhão que se encontra desperto. Ofereço-lhe um sorriso caloroso e algumas caricias no seu focinho macio. Alcanço uma corda e amarro-a no seu cabeção negro, retirando-o cuidadosamente da box e prendendo-o no padock. Procuro o material de limpeza, acabando por encontra-lo na secção dos arreios onde, inclusive, se encontram os meus.

Limpo as suas patas com brio, escovo o seu pelo e desemaranho as suas crinas cuidadosamente. Elejo um suadouro aleatório e coloco-o no seu dorso, seguindo-se a minha sela preta. Aperto a cilha devidamente e coloco a cabeçada, fazendo a habitual manobra para passar as suas orelhas irrequietas entre as extremidades. Dou-lhe uma pequena pancada na garupa antes de o guiar até ao picadeiro exterior, onde o prendo ao cercado enquanto coloco os obstáculos, num tamanho razoável.

- Vamos ver do que somos capazes. —Murmurei, assim que me ergui no seu dorso. Incentivei-o com os calcanhares e este logo começou num trote concentrado que eu fui alargando até passar para um galope curto e calculado. Deixei dar umas voltas à pista para que aquecesse, evitando assim alguma lesão que pudesse eventualmente surgir. Apontei-o ao primeiro obstáculo e deixei que Sun corresse ao seu ritmo, incentivando-o perto do salto. Sinto uma enorme sensação de orgulho quando ambos ultrapassamos o obstáculo sem qualquer dificuldade. Percorremos o resto do percurso sem problemas. Quando aterramos do último salto deixei que ele abrandasse gradualmente, enquanto desferia caricias no seu pescoço.

-Bom trabalho!- Alguém felicitou, eu julgava-me sozinha. Olho em volta, acabando por decifrar três figuras no cercado.

-Obrigado.- Respondo um pouco embaraçada devido a ser apanhada desprevenida. Desmonto Sunlight, caminhando até ao cercado com ele.

-Por favor.- O loiro rompe a sua expressão neutra para demonstrar desprezo evidente.

-Niall.- Greg avisa, quase esperando algum tipo de reacção por parte dele.

-Era mesmo isto que querias ver? Um cavalo sem qualquer tipo de prestígio, sem qualquer proximidade a talento? Era mesmo esta vulgaridade que queres para cobrir a Dreamer?- Indaga, como se ofendido.

-Desculpa?- Interrompo-o, sentindo a raiva fervilhar nas minhas entranhas.

- Bem deves pedir desculpa. Como é que alguém pode sequer pensar que este cavalo seria algo de ...

- Chega Niall.- Greg corta-o, tentando acabar com a tensão.

-Terei dito algo de mal?- Inquere venenosamente.

- Sabes o que disseste de mal? Tudo. Tudo a partir do momento em que tocas no nome do MEU cavalo. Nem tu nem ninguém têm direito a dizer seja o que for dele. Tu não o conheces, não nos conheces. Tu não tens o direito de dizer absolutamente nada, percebes?- Eu subo o meu tom de voz, consumida pela gana crescente.- Ninguém diz algo sobre o meu cavalo à minha frente.  Entendo que não percebas o que nos une, entendo que não percebas o quão especial ele é mas não o desconsideres. Porque tu és muito pior do que qualquer defeito que ele tenha.- Atiro grosseiramente, abrindo o portão e caminho furiosamente.

-Summer, espera!- Kayla chama.

- Eu não consigo. Greg, pode despedir-me mas não será qualquer emprego que me fará baixar a cabeça e engolir barbaridades sobre o meu cavalo. No nome dele ninguém tem o direito de tocar.- Declaro em voz alta.

Olho para a floresta no horizonte. Monto Sunlight rapidamente e, sem pensar mais nada, arranco a galope em direcção às árvores. Avisto um caminho de terra e dirijo-nos por lá e entro nos confins da floresta. Deixo sunlight cavalgar à sua vontade seguindo sempre o caminho em linha recta. Vários pensamentos atingem a minha mente e lagrimas de revolta são expulsas pelos meus olhos. Eu posso ter de voltar à Austrália por causa do que lhe disse mas não me sentiria bem se não falasse. Ele pode dizer as mais diversas tiranias sobre mim que não me atinge minimamente. Mas a partir do momento a que se dirige ao meu cavalo eu não suporto. Simplesmente não suporto.

Fecho os olhos e inspiro. Sunlight começa a abrandar gradualmente, eu faço-lhe pressão sobre as rédeas para que ele abrandasse e assim caminhe lentamente num passo agradável.

O Niall não sabe o que este cavalo significa para mim. Ele não sabe o que passamos os dois. Ele não sabe que este cavalo é a única família que me resta. Ele não sabe que este cavalo é o meu melhor amigo. Ele não sabe porra nenhum senão ser um idiota. Nem há dois dias cheguei e a única coisa que ele fez até agora foi enervar-me e tratar mal o meu cavalo. Ele não tem o direito. Ninguém tem

 Ao longe ouvi galopadas fortes, não liguei e continuei o meu caminho. As galopadas aproximaram-se e senti uma presença parar abruptamente ao meu lado. Virei-me lentamente, não encontrando ninguém. Olhei em volta e por momentos fiquei com medo. Poderia eu estar a entrar em paranóia?

- Aqui em baixo!- Uma voz falou/gritou. Olhei mais abaixo, dando de caras com Kayla num pequeno pónei.- Foi o que consegui arranjar okey?- ela resmungou.

- Não precisavas de ter vindo.- Digo num tom de voz leve e sem emoção evidente devido a tentar controlar os meus nervos para com o loiro.

- Eu vim para ver como estavas.- Ela constatou.

-Não terás vindo dizer-me que fui despedida?- Atiro ironicamente.

-Nem por isso. O Greg ficou a dar um sermão ao Niall. Ele, de facto, foi ignóbil.- Explicita.- Tu estás bem?

- Porque não haveria de estar?- Dou de ombros.

- Ninguém gosta que insultem o seu cavalo e da maneira que reagiste acho que não estás como dizes.

-Apenas não admito qualquer tipo de críticas ao meu cavalo. Muito menos da parte dele.- Profiro.

- Aconteceu algo mais entre vocês para dizeres isso?

-Não. Eu apenas... não sei. Ele é um parvo a tempo inteiro. Por muito que não me queira enervar ele arranja sempre uma maneira.Isso é frustrante.- Exaspero.

- Ele é mesmo assim, não tem volta a dar.- Meio que soa num lamento.

-Ele sempre foi como é?- Inquiri.

-Nem sempre. Mas agora é, infelizmente, tornou-se num ser frio, calculista, rude e um pouco insensível.

Niall era de facto alguém abstraído. Alguém cujo único sentimento que prevalecia no pouco que vi do seu olhar fosse frieza. A frieza glacial de um oceano gélido.

Talvez ele fosse alguém frio por destino.

Ou talvez, ele tivesse sido obrigado a mudar com o passado. Tal como eu fui.

Eu não sei se alguém irá ler as minhas notas ou não mas... espero que estejam a gostar, principalmente porque estou a editar a Fic and... Espero que sonhem com unicornios :3

Votem e comentem se gostarem :) Obrigada.


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