13- No jardim

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Estava sentada na sala de estar, os olhos fitos na janela, mas a mente turva demais para que eu prestasse atenção em qualquer coisa a minha volta.

Foi quando senti uma mão tocar em meu ombro que despertei da viajem sombria por meus pensamentos.

Tulip tinha razão, traumas não superados viram tormentos para a mente.

— Oi, mãe. — Sorri para disfarçar minha situação.

— Estava distraída, sente-se mal? — Sentou ao meu lado com um olhar de preocupação.

— Apenas uma indisposição, nada que deva preocupá-la. — Endireitei a postura e deixei meus problemas de lado. — A senhora disse que precisava me contar algo, de que se trata?

— Ah, sim! Iremos mudar nossa visita à escola para o domingo, acabo de ser informada que vamos receber a visita das princesas de Estaryn no sábado, as moças vão passar alguns dias conosco.

— Que maravilha! Será ótimo rever a Lis. — Me animei com a notícia, a jovem princesa era uma companhia muito agradável.

— A Lis e a Talita, não se esqueça que são duas — repreendeu.

— Claro. Mas não posso negar que tenho um grau de intimidade maior com a princesa mais nova. — Saí em minha defesa.

Minha mãe estava a ponto de voltar a falar quando a chegada do meu pai a interrompeu.

— Patrick já chegou? — Se adiantou em perguntar.

— Não, mas chegará em breve, queria tratar de algo com você antes da reunião — respondeu depois de beijar o topo da minha cabeça em um cumprimento.

— Já estou indo. — Virou-se para mim. — Continuamos a conversa mais tarde. E não fique aí no mundo da lua, que tal ver seu irmão? Ele está treinando no jardim.

Assenti, sabendo que o melhor que fazia era ocupar minha mente, e os acompanhei até seguirmos direções opostas.

O jardim do castelo por si só já era um lugar excelente para espairecer, não me surpreendi quando li que foi para lá que Assuero foi após aquela tremenda revelação de Ester. Minha mãe era bastante apegada aquele espaço, cuidava para que fosse mantido de forma excepcional.

Em um lugar mais afastado, perto da área dos estábulos, encontrei meu irmão concentrado em acertar uma flecha em um alvo a sua frente.

Foi inevitável não sorrir lembrando daquela pequena aula que recebi em Cristyn.

— Um exímio arqueiro — elogiei ao vê-lo acertar o centro do alvo.

— Fico feliz que seja do agrado da platéia. — Sorriu passando o braço pela testa suada.

— Esse estado foi alcançado apenas atirando umas meras flechas? — Arqueei a sobrancelha.

— Claro que não, eu tive treino de esgrima antes. O arco e flecha é mais por prazer, me ajuda a relaxar e me concentrar —explicou. — Aliás, você deveria tentar, lembro que quando era pequena sempre pedia para que lhe ensinasse, mas a nossa mãe proibia categoricamente.

— Sabe, é uma boa idéia, mas de tanto observar já devo até conseguir acertar o alvo na primeira tentativa. — O lancei um olhar desafiador.

— Duvido!

— Quer apostar? — Ergui a mão para ele, que a analisou antes de apertar com um sorriso convencido.

— Se você conseguir, fico lhe devendo uma, mas se errar, você fica me devendo — sugeriu com a certeza que ganharia.

— Combinado! — Tirei o arco de suas mãos e com toda a graciosidade retirei uma flecha da aljava, colocando-a no arco em seguida.

Deixei que ele me ensinasse como fazer, mesmo que eu já soubesse, só para contribuir com minha pequena encenação.

Fiz tudo como havia aprendido, dobrando minha concentração só por via das dúvidas.

Comemorei quando a flecha fez seu percurso esperado e acertou o alvo, não foi no centro, mas já valia.

— Mas como? — Se perguntou olhando para o alvo com descrença. — Você deve ser uma boa observadora mesmo, Ellen.

— É o que parece — respondi segurando o riso. — Vou guardar meu prêmio para um momento oportuno, meu caro Nate.

Passamos mais algum tempo conversando e atirando, até ele se despedir afim de tomar um banho, o qual era bastante necessário.

Resolvi continuar perambulando pelo jardim e certo momento me distraí com algumas borboletas sobrevoando as margaridas, foi quando alguém acabou esbarrando em mim.

— Ah não! —A moça já conhecida por mim levou as mãos a boca fazendo uma reverência desajeitada. — Perdão, alteza! Ai, eu só faço trapalhadas.

— Está tudo bem, acontece. — Ri um pouco da situação, sempre tinha alguma confusão envolvendo nossos encontros. Olhando bem, recentemente sempre que conhecia alguém novo algo de errado acontecia.

Abaixei-me para pegar o pequeno caderno da moça que havia ido parar no chão com o impacto, como ele estava aberto acabei vendo seu conteúdo.

— Que lindo! — exclamei impressionada com o belo vestido desenhado ali. — Você que fez?

— Muito obrigada, princesa, fui eu sim. — Observei as bochechas de Trícia ficarem da cor de seus cabelos.

— Posso ver os outros? — pedi e ela assentiu. — Qual a origem desse talento?

— Bom, minha avó é uma costureira de mão cheia, ela me ensinou a costurar desde que eu pude segurar uma agulha, mas eu aprendi a desenhar com uma professora muito querida da Escola de Arte.

— Você estudou por quanto tempo lá? — perguntei curiosa lhe devolvendo o caderno.

— Dois anos, saí a pouco tempo, quando vim trabalhar aqui — explicou com um sorriso triste.

— Por que você teve que desistir?

— Meu pai perdeu o emprego então todos nós tivemos que nos mobilizar para manter a casa. Minha tia trabalha aqui a muitos anos e conseguiu uma vaga para mim.

— Sinto muito, deve ter sido difícil deixar de fazer o que gosta — lamentei, mas a moça balançou a cabeça colocando um sorriso mais verdadeiro no rosto.

— Vale a pena fazer sacrifícios por quem a gente ama, seria muito egoísmo não ajudar quando eu posso e, na verdade, não parei de fazer o que gosto, ainda desenho nas horas vagas e ajudo minha avó com as encomendas. Aliás, esse vestido que a senhorita viu eu desenhei para minha prima que vai casar no sábado.

Uma luzinha acendeu na minha cabeça ao recordar do festival no sábado e me fez pensar em uma boa forma de ajudar à ela e a mim.

— Trícia, posso lhe pedir algo? — indaguei com a mente fervilhando de idéias.

— O que quiser! — respondeu prestativa.

— Quero que faça um traje para mim.

— Eu? Mas a senhorita é a princesa! Nunca fiz nada para realeza, sinceramente o vestido da minha prima é a roupa mais elegante que já fiz — pronunciou com nervosismo.

— Não quero algo requintado, preciso que seja confortável para cavalgar porém bonito o suficiente para usar em uma festa — expliquei, mas a garota continuou me olhando confusa. — É que eu estou cansada das minhas roupas de montaria, são pesadas e desconfortáveis, além de não combinarem muito comigo. Vamos, diga que aceita.

— Só se tiver sua ajuda, porque eu não faço idéia de como fazer algo à altura.

— Combinado! — Sorri satisfeita, minha cabeça já imaginava muitas possibilidades, aquele festival seria incrível!

Graça, margaridas e cháOnde histórias criam vida. Descubra agora