Capítulo 74

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Deixe sua estrela✨

Na biblioteca, naquela tarde, enquanto coloco os livros devolvidos em ordem, meu corpo parece paralisado, como se estivesse no piloto automático. Pergunto-me se isso é um sintoma do choque. Não posso acreditar que existe um tratamento, um tratamento de verdade, que poderia me ajudar. Sinto um friozinho na barriga só de pensar nisso - uma pontinha de entusiasmo surgindo.

Porém, ela é ofuscada por uma grande emoção - o medo, que parece ter passado de uma simples ansiedade comum para um terror absoluto enquanto estava no consultório da doutora Zhang. E tenho que me fazer a mesma pergunta que ensaiei desde que saí do consultório da médica: realmente quero ser curada? É claro que que sonhava com isso quando era criança, como seria ser normal, ser abraçada e brincar no pátio com as outras crianças no recreio. Mas o que as crianças sabem? Talvez ficar de escanteio tenha me impedido de quebrar o pescoço nas barras do parquinho. Talvez essa alergia tenha, na verdade, me poupado o tempo todo. Talvez seja a coisa - a única coisa - que me impede de me machucar.

Paro de organizar os livros quando me deparo com um que obviamente deixaram cair em uma banheira. Suas páginas estão inchadas e enrugadas, e, para piorar as coisas, a capa está cheia de marcas de dentes. Não consigo acreditar que alguém simplesmente o jogou na caixa de devolução sem dizer nada. Olho ao redor à procura de Louise para lhe mostrar e perguntar oq devo fazer, mas não a vejo em nenhum lugar. Quando passo os olhos na seção infantil, Roger ergue os olhos e faz contato visual.

- Cadê a Louise? - Movo a boca sem emitir som, e ele estende o dedo indicador da mão que está levantada na direção das estantes;especificamente, uma fileira atrás das mesinhas individuais com computador. Olho naquela direção, mas não a vejo. Os assentos ali estão quase vazios, com exceção de Michael, o golfista do travesseiro, que está sempre lá (pensei que Louise estivesse exagerando, mas ele realmente vem todos os dias), e de uma mulher mais velha, papuda e de óculos fundos, sentada a poucos centímetros de distância do monitor.

Ando em direção à estante para a qual Roger apontou e, quando viro a esquina, Louise está ali, curvada, com a cabeça enfiada na prateleira entre duas fileiras de livros.

- Louise? - chamo. Ela se move abruptamente e bate a cabeça no alto da prateleira.

- Aí - exclama e, ainda curvada, olha de soslaio em minha direção, colocando o dedo indicador nos lábios. Com a mesma mão, pede que eu me aproxime. Vou até ela.

- O que está fazendo? - sussurro.

- Olha só - diz, sem som, apontando para o espaço na prateleira entre os livros. Eu me inclino e dou uma espiada, observando a nuca da mulher mais velha à mesinha do computador. De perto, seu cabelo é fino, revelando grandes faixas do couro cabeludo em meio aos tufos de fios brancos sem brilho, cuidadosamente enrolados e penteados no sentido oposto no que imagino ter sido uma tentativa de criar uma aparência mais satisfatória.

Olho novamente para Louise,sem entender.

- Olha para a tela do computador dela - sussurra, enfatizando as palavras enquanto fica indicando com o dedo o formato de cada sílaba.

Volto a olhar e movimento a cabeça para poder ver além do penteado da mulher.

- Oh! - A exclamação inadvertidamente escapa dos meus lábios quando percebo q oq estou vendo é um homem nu em primeiro plano. Especificadamente em região pélvica.

Perto o Bastante para Tocar |Beauany |CONCLUÍDA Onde histórias criam vida. Descubra agora