Cap. 67 - NINHO VAZIO

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Vanda entregou o dinheiro para o rapaz do carrinho de lanches, pediu que ele ficasse com o troco e voltou para dentro do hospital. Passou sorridente pelo segurança na entrada, acenou para as moças no balcão e seguiu pelo corredor. Virou à direita em outro corredor quase interminável e encontrou Joana sentada em um dos bancos de espera. Ela era a única pessoa ali, dando ao lugar um aura de tristeza e abandono.

Vanda sentou-se perto da filha com uma latinha de Coca-Cola na mão. A médica moveu os ombros, tentando relaxar os músculos e jogou o copo vazio de cappuccino na lixeira ao lado. Voltando-se para mãe, sentiu um cheiro que não combinava com aquele refrigerante.

- Mãe, a senhora está bebendo cerveja? - sussurrou.

Vanda deu de ombros.

- Meu neto acordou. Eu precisava comemorar de alguma forma.

- Nós estamos em um hospital, dona Vanda!

- Eu sei. Por isso eu coloquei a cerveja nessa latinha – ela exibiu radiante a falsa Coca-Cola. – E também eu não queria criar atrito com o segurança, sabe? – confidenciou.

- Meu Deus, a senhora não tem jeito mesmo.

- Eu acho um absurdo a gente ter que contrabandear uma cervejinha aqui para dentro. Somos adultos, afinal.

Joana balançou a cabeça em tom negativo. A alguns metros, um rapaz apareceu no corredor, limpando o chão absurdamente branco, enquanto ouvia música em um fone de ouvido. Parecia fora da realidade. Em uma dimensão paralela. O pensamento de Joana voou para longe também.

- O que foi? – Vanda trouxe a filha de volta à realidade.

- O quê?

- Por que você está aí com essa cara de derrotada? O Renato acordou. Ele está bem. Temos que sorrir e não ficar com essa cara morta.

- Eu sei, mãe, eu estou muito feliz pelo Renato... mas...

- Mas o quê? – Vanda a interrompeu. – Ah, já sei... mas a Suzy não está aqui para comemorar.

Joana não disse nada, apenas encarou a mãe. Ela, no fundo, não sabia como defender a filha.

- Joana, você sabe que se a Suzy estivesse aqui, ela não estaria comemorando a recuperação do Renato. Ela estaria com raiva, isso sim.

- Para, mãe. A senhora não tem como saber disso.

O rapaz que limpava o chão parou e mexeu no celular, trocando a música. Vanda bufou impaciente com a filha.

- Eu conheço aquela garota melhor do que você possa imaginar. – Ela fez uma pausa. – Ok. Eu sei que é difícil para você aceitar as coisas do jeito que elas são. Afinal, a Suzy é sua filha. Eu te entendo. Você teve notícias dela? Conseguiu falar com ela, pelo menos?

- Tentei, mas ela continua irredutível. Não quer falar comigo. Ela me culpa por tudo que está acontecendo com o pai dela... sabe como é... essa possibilidade de ele perder o emprego e tudo o mais.

Vanda assentiu.

- Um dia, ela vai cair na real. Dê tempo ao tempo.

- Deus te ouça – disse Joana. – Sabia que ela vai estudar fora?

- Como assim?

- O Manuel conseguiu uma vaga para ela em uma dessas escolas bem exclusivas.

Vanda fez uma careta incrédula.

- Nossa. Como ele conseguiu isso? Tá com dinheiro sobrando, pelo visto.

- É uma escola que pertence a uma entidade religiosa. Você sabe que ele é metido nessas coisas de igreja.

Vanda fez uma careta.

- Pior que sei mesmo. E a Suzy topou?

Joana franziu a testa.

- Segundo o Manuel, ela disse que aceitava qualquer coisa que me mantivesse longe dela. Que ela não quer me ver nunca mais... mas essas são palavras dele, entende?

- Sei como é.

- Eu não sei até onde isso é verdade. Ou o quanto dessa história é uma forma que o Manuel achou de me torturar.

- Não sofra com isso, meu bem. Não perca sua paz interior. Não vale a pena. As coisas sempre se ajeitam.

- Minha filha me odeia, mãe.

Vanda colocou suas mãos sobre as da filha.

- Não odeia não. Como eu já te disse: dê tempo ao tempo.

Entre Meninos (Romance gay) - Concluído Onde histórias criam vida. Descubra agora