Cap. 60 - QUEM MANDA NA NOITE SOU EU

1.6K 196 11
                                    


Enquanto o Fiat Doblò prata atravessava a ponte que ligava Paraíso à Ressurreição, Renato olhava meio constrangido para o motorista do Uber e forçava um risinho e outro. Tudo para tentar disfarçar o humor pouco amistoso de Elvis que, quase deitado no banco de trás do carro, fazia de tudo para evitar que sua fantasia se destruísse.

- Meu Deus, calma aí nessa direção. Eu quero chegar inteiro nessa festa!

- Nós estamos indo a quase dez por hora, Elvis. Se diminuir mais a velocidade, paramos aqui mesmo – protestou Renato.

- Ninguém vai querer ver uma Úrsula com tentáculos murchos...

- Já estamos quase chegando, calma.

Sem demonstrar um pingo de humor, o motorista virou em direção ao bairro de classe média alta de Ressureição.

- A gente não está indo na direção errada? – quis saber Renato. – A festa não é para o outro lado?

- Era – disse Elvis. – Mas parece que a quantidade de convidados saiu do controle e o seu amigo precisou trocar o lugar do evento.

- Meu amigo? – Renato fez uma careta.

Elvis riu.

- Esse tal de Juliano parece ser do tipo que adora ostentar. Pelo visto tá querendo comprar um lugar ao sol na comunidade LGBTQ local, torrando uma boa grana... – Elvis aproveitou um momento em que o carro não balançou tanto para fazer uma selfie. – Vem cá: ela é rica?

Renato franziu a testa.

- Ela quem?

- Essa bicha Juliano.

Renato deu de ombros.

- Não sei. Acho que sim. Os pais dele criam gado ou algo do tipo.

- Bicha do agronegócio? Arrasou. Será que ela vai estar fantasiada de Wendy do Toy Story? – Elvis riu só de imaginar a situação. – Duvido, ela não seria tão sem imaginação.

- Com certeza não seria. Juliano vai querer ser o centro das atenções. Pode apostar.

Os dois amigos estavam distraídos e mal perceberam que o carro havia parado. O motorista, ainda pouco à vontade com aqueles passageiros, apenas olhava de cara amarrada pelo retrovisor. Percebendo que o homem estava a ponto de colocá-los para fora, Renato tomou a dianteira da situação.

- Acho que chegamos, Elvis – disse, enquanto abria sua a porta, saía do carro e ia ajudar o amigo a descer.

Elvis levou demorados cinco minutos para descer do carro sem danificar a fantasia. Cada segundo usado por ele, era um motivo a mais para deixar o motorista visivelmente irritado. Assim que "Úrsula" finalmente deixou o Doblò, o homem pisou no acelerador e partiu sem dizer uma palavra.

- Nossa, que grosso! – disse Renato.

- Ele nem imagina como será minha avaliação sobre esta corrida – revelou Elvis. – Mas não vamos deixar que o humor desse sujeito estrague nossa noite. Nós viemos aqui para brilhar, mana.

Os dois giraram o corpo quase em sincronia. A casa onde a festa estava rolando era mesmo de tirar o fôlego e pelo movimento que havia fora do lugar, ficava claro que aquele evento nunca poderia ter sido realizado em um apartamento.

Ao ver tamanha opulência, Renato sentiu-se oprimido. Ele estava prestes a enfrentar Juliano cara a cara em seu próprio território. Por um segundo, ele preferiu estar em outro ambiente. Em um lugar onde pudesse ficar em pé de igualdade com seu oponente. É a festa dele, com a turma dele. O que eu estou fazendo aqui afinal de contas?. Renato só conseguiu sair do mar de desespero, quando sentiu Elvis puxando seu braço.

- Bicha, acorda! Que foi? Parece até que viu um fantasma. A senhora está bem?

Renato engoliu a seco.

- Estou... – mentiu.

- Que bom, porque eu estou cansada de ficar aqui parada parecendo um poste. Vamos entrar logo e mostrar pra essas bichas de Ressurreição como as gay de Paraíso se divertem.

- Tudo bem...

Sorridente e com uma cara de felicidade capaz de dar inveja a quem ganhou na loteria acumulada, Elvis agarrou a mão de Renato e o puxou em direção a casa.

O pé direito alto dava a ideia de que o sobrado, que já era grande, fosse gigantesco; Elvis e Renato entraram cavando passagem entre os convidados e atraindo vários olhares. Somos carne nova no pedaço, pensou Renato.

- Acho que fomos notadas – Elvis cochichou no ouvido de Renato.

- É... eu tô vendo – concordou Renato, com coração já estava acelerado. Ele nunca fora do tido que se sentia à vontade em lugares fechados e lotados de pessoas estranhas. – Também seria impossível não notar essa sua fantasia.

Elvis sorriu e girou o corpo, fazendo com que seus tentáculos chicoteassem alguns convidados, que se afastaram de mau humor.

- Querida, se não for par causar, eu nem saio de casa – provocou Elvis. – Quer saber? Acho que precisamos beber alguma coisa.

- Concordo com você.

Elvis se virou surpreso para o amigo. Sorriu e balançou a cabeça em sinal de aprovação.

- Mentira? Tô passada com a senhora! Não vai rolar um discurso sobre maioridade ou coisa do tipo?

- Hoje não. Situações desesperadas pedem medidas desesperadas.

- É isso aí, meu garoto! Vamos mostrar pra essa gente como é que se faz.

Elvis, outra vez, grudou na mão de Renato e o puxou para o interior da casa em busca de bebidas, sem se preocupar em esbarrar nos outros convidados. 


Entre Meninos (Romance gay) - Concluído Onde histórias criam vida. Descubra agora