Enquanto o Fiat Doblò prata atravessava a ponte que ligava Paraíso à Ressurreição, Renato olhava meio constrangido para o motorista do Uber e forçava um risinho e outro. Tudo para tentar disfarçar o humor pouco amistoso de Elvis que, quase deitado no banco de trás do carro, fazia de tudo para evitar que sua fantasia se destruísse.
- Meu Deus, calma aí nessa direção. Eu quero chegar inteiro nessa festa!
- Nós estamos indo a quase dez por hora, Elvis. Se diminuir mais a velocidade, paramos aqui mesmo – protestou Renato.
- Ninguém vai querer ver uma Úrsula com tentáculos murchos...
- Já estamos quase chegando, calma.
Sem demonstrar um pingo de humor, o motorista virou em direção ao bairro de classe média alta de Ressureição.
- A gente não está indo na direção errada? – quis saber Renato. – A festa não é para o outro lado?
- Era – disse Elvis. – Mas parece que a quantidade de convidados saiu do controle e o seu amigo precisou trocar o lugar do evento.
- Meu amigo? – Renato fez uma careta.
Elvis riu.
- Esse tal de Juliano parece ser do tipo que adora ostentar. Pelo visto tá querendo comprar um lugar ao sol na comunidade LGBTQ local, torrando uma boa grana... – Elvis aproveitou um momento em que o carro não balançou tanto para fazer uma selfie. – Vem cá: ela é rica?
Renato franziu a testa.
- Ela quem?
- Essa bicha Juliano.
Renato deu de ombros.
- Não sei. Acho que sim. Os pais dele criam gado ou algo do tipo.
- Bicha do agronegócio? Arrasou. Será que ela vai estar fantasiada de Wendy do Toy Story? – Elvis riu só de imaginar a situação. – Duvido, ela não seria tão sem imaginação.
- Com certeza não seria. Juliano vai querer ser o centro das atenções. Pode apostar.
Os dois amigos estavam distraídos e mal perceberam que o carro havia parado. O motorista, ainda pouco à vontade com aqueles passageiros, apenas olhava de cara amarrada pelo retrovisor. Percebendo que o homem estava a ponto de colocá-los para fora, Renato tomou a dianteira da situação.
- Acho que chegamos, Elvis – disse, enquanto abria sua a porta, saía do carro e ia ajudar o amigo a descer.
Elvis levou demorados cinco minutos para descer do carro sem danificar a fantasia. Cada segundo usado por ele, era um motivo a mais para deixar o motorista visivelmente irritado. Assim que "Úrsula" finalmente deixou o Doblò, o homem pisou no acelerador e partiu sem dizer uma palavra.
- Nossa, que grosso! – disse Renato.
- Ele nem imagina como será minha avaliação sobre esta corrida – revelou Elvis. – Mas não vamos deixar que o humor desse sujeito estrague nossa noite. Nós viemos aqui para brilhar, mana.
Os dois giraram o corpo quase em sincronia. A casa onde a festa estava rolando era mesmo de tirar o fôlego e pelo movimento que havia fora do lugar, ficava claro que aquele evento nunca poderia ter sido realizado em um apartamento.
Ao ver tamanha opulência, Renato sentiu-se oprimido. Ele estava prestes a enfrentar Juliano cara a cara em seu próprio território. Por um segundo, ele preferiu estar em outro ambiente. Em um lugar onde pudesse ficar em pé de igualdade com seu oponente. É a festa dele, com a turma dele. O que eu estou fazendo aqui afinal de contas?. Renato só conseguiu sair do mar de desespero, quando sentiu Elvis puxando seu braço.
- Bicha, acorda! Que foi? Parece até que viu um fantasma. A senhora está bem?
Renato engoliu a seco.
- Estou... – mentiu.
- Que bom, porque eu estou cansada de ficar aqui parada parecendo um poste. Vamos entrar logo e mostrar pra essas bichas de Ressurreição como as gay de Paraíso se divertem.
- Tudo bem...
Sorridente e com uma cara de felicidade capaz de dar inveja a quem ganhou na loteria acumulada, Elvis agarrou a mão de Renato e o puxou em direção a casa.
O pé direito alto dava a ideia de que o sobrado, que já era grande, fosse gigantesco; Elvis e Renato entraram cavando passagem entre os convidados e atraindo vários olhares. Somos carne nova no pedaço, pensou Renato.
- Acho que fomos notadas – Elvis cochichou no ouvido de Renato.
- É... eu tô vendo – concordou Renato, com coração já estava acelerado. Ele nunca fora do tido que se sentia à vontade em lugares fechados e lotados de pessoas estranhas. – Também seria impossível não notar essa sua fantasia.
Elvis sorriu e girou o corpo, fazendo com que seus tentáculos chicoteassem alguns convidados, que se afastaram de mau humor.
- Querida, se não for par causar, eu nem saio de casa – provocou Elvis. – Quer saber? Acho que precisamos beber alguma coisa.
- Concordo com você.
Elvis se virou surpreso para o amigo. Sorriu e balançou a cabeça em sinal de aprovação.
- Mentira? Tô passada com a senhora! Não vai rolar um discurso sobre maioridade ou coisa do tipo?
- Hoje não. Situações desesperadas pedem medidas desesperadas.
- É isso aí, meu garoto! Vamos mostrar pra essa gente como é que se faz.
Elvis, outra vez, grudou na mão de Renato e o puxou para o interior da casa em busca de bebidas, sem se preocupar em esbarrar nos outros convidados.
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Entre Meninos (Romance gay) - Concluído
Teen FictionQuando a mãe de Renato o avisa de que eles passarão o mês de férias na fazenda da avó, o rapaz fica indignado. Amante de roque, cinema, séries e literatura; Renato é um típico menino da cidade. Passar um período entre vacas e cavalos, no meio do mat...