Renato tocou a tela do Kindle para mudar a página. No canto inferior direito, dava para ver que a leitura havia avançado bem. Ele já havia lido 91% do livro Memoria de Maria Moura. No início, quando a professora de literatura disse qual seria a obra do bimestre, ele fez uma careta. Nunca tinha lido nada de Rachel de Queiroz e o pouco que a professora falou sobre a escritora não lhe tinha chamado a atenção. Ele chegou a torcer para que o livro indicado fosse algum da Lygia Fagundes Telles (que ele não conhecia também, mas lhe parecia mais interessante). No final das contas, não veio o romance que ele queria; então, o negócio era ler o que precisava ser lido.
Habituado a ler desde muito cedo, Renato era rápido na atividade, especialmente quando lia algo que gostava. Assim que pegou um exemplar físico do clássico de Rachel de Queiroz na biblioteca e sentiu o calhamaço nas mãos, ele avaliou que levaria uma eternidade para ler aquilo, uma vez que não estava muito a fim de mergulhar naquele universo.
Ledo engano, os primeiros trinta minutos – ainda na própria biblioteca – em que esteve com o livro foram suficientes para que ele avançasse por mais de cinquenta páginas. No final desse tempo, Renato se surpreendeu com o livro e se viu apaixonado pela protagonista da obra e pelo clima de suspense criado ao redor daquela gente sertaneja. Talvez sejam os vários peões que compõem a trama que estejam me prendendo neste livro, pensou e conteve o riso. Não queria chamar atenção ali naquele espaço de silêncio e reflexão.
O livro que trouxera emprestado da biblioteca da escola estava repousando sobre a mesinha de cabeceira, enquanto ele usava o leitor digital para fazer marcações na leitura. Renato havia acabado de destacar um trecho que considerou interessante, quando seu celular vibrou ao lado na cama. Por um segundo, seu coração acelerou. A esperança de que fosse uma mensagem de Wesley fez seu corpo tremer. Ele agarrou o aparelho com rapidez e sua virtual felicidade se desfez na mesma velocidade. Não era uma mensagem do seu amado (a última vez que eles haviam se falado fora há dois dias ou mais); na tela do celular, tinha uma mensagem da sua mãe, avisando-o que o jantar estava servido.
- Pelo visto, a gente virou mesmo uma família moderna, dessas que trocam mensagens pelo WhatsApp ao invés de conversar pessoalmente – disse a si mesmo, sem desviar o olhar da tela do smartphone. – A que ponto chegamos, senhor Graham Bell!
Faminto, Renato correu até o banheiro para lavar as mãos e seguiu em direção à sala de jantar.
Nos últimos dias, Joana vinha se esforçando para seus dotes culinários melhorar (ele sempre fora uma péssima cozinheira e sabia disso) e Renato era obrigado a admitir que a mãe estava conseguindo avançar no assunto. Avançar de forma surpreendente. Se antes sua mão não era capaz nem mesmo de fazer ovos mexidos, reduzindo os jantares da família à comida congela ou macarrão (na maioria das vezes instantâneo), agora ela conseguia preparar arroz, feijão, salada, babata frita e um bife saborosos. Mesmo que demorasse uma eternidade e seguisse cada passo sugerido por uma senhora no YouTube. Sem problemas, afinal quem nunca precisou de um bom tutorial para realizar uma atividade complexa?
- Parece que você pegou mesmo gosto pela coisa – disse Renato ao sentar-se à mesa.
- Estou tentando, o arroz ainda não está perfeito, mas eu chego lá – brincou Joana.
- Está tudo maravilhoso, meu amor – afirmou Manuel, segurando a mão da esposa e beijando-a. Renato precisou fazer um esforço extra para não deixar escapar uma careta de nojo daquela cena patética.
- Eu acho isto aqui bem melhor do que comer lasanha de micro-ondas – garantiu Suzy, espetando o bife e retirando um pedaço generoso para colocar na boca. – Já tava enjoada de pizza também!
- Suzy, nada de falar de boca cheia – repreendeu Joana, sem parecer ríspida.
Manuel olhou a filha com afeto, um afeto genuíno na opinião de Renato. Se tinha alguém ali naquela casa que o pai amava de forma enlouquecedora era a filha. Talvez ele sentisse no ar a energia ruim de Suzy; afinal, em vários aspectos, eles eram iguais.
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Entre Meninos (Romance gay) - Concluído
Teen FictionQuando a mãe de Renato o avisa de que eles passarão o mês de férias na fazenda da avó, o rapaz fica indignado. Amante de roque, cinema, séries e literatura; Renato é um típico menino da cidade. Passar um período entre vacas e cavalos, no meio do mat...