A noite de sábado estava misteriosamente amena. O frio costumeiro que sempre fazia em Paraíso parecia ter dado um tempo aos moradores, fazendo com que eles deixassem seus casacos em casa. O calor, que era algo raro em Paraíso, costumava mexer com os ânimos dos moradores da cidade. Joana era a prova disso, pensou Renato, enquanto analisava a rua. Antes que ele deixasse o apartamento, ela o parou, aproximou-se e lhe deu um abraço longo e apertado. Repetiu várias vezes que o amava e que tudo ia ficar bem.
- Tudo o quê?
- Tudo... – disse Joana com um tom de voz piedoso e olhar distante.
- Tá bom, mãe – agradeceu Renato, tentando livrar-se do abraço da mãe –, eu acredito na senhora. Agora, deixa eu ir que já estou atrasado.
Joana afastou-se do filho e sorriu para ele.
- Ah, desculpa... vá lá... vá se divertir.
Da janela do ônibus, Renato afastou a lembrança daquela cena estranha à porta de casa e passou a observar a quantidade enorme de turistas superlotando os quiosques da orla do Rio Estige. Com a temperatura que estava fazendo, não seria estranho ver aquelas pessoas entrando nas águas escuras e estranhas do rio mais cedo ou mais tarde.
O ônibus seguiu a avenida da orla e entrou à direita rumo ao Jardim do Edén (o bairro mais nobre de Paraíso). Renato contou três paradas e desceu. Do ponto do ônibus (com certeza, usado apenas pelas empregadas que trabalhavam ali no Edén) à casa de Elvis, ele precisou andar apenas uns cem metros.
Eram 22h em ponto, quando Renato parou diante do enorme portão da residência do amigo. Poderiam passar anos, mas Renato nunca se acostumaria com a ostentação que era a casa de Elvis. Sorrindo, Renato tocou o interfone e não precisou esperar muito para que fosse atendido.
- Pois não? – disse uma voz feminina.
- Oi, boa noite, sou eu, o Renato.
- Oi, seu Renato, o seu Elvis pediu para o senhor entrar... – a voz afetuosa que vinha do interfone era bem conhecida, dona Abadia, que trabalhava com a família de Elvis desde sempre. Ela tinha um sotaque inconfundível e delicioso. Impossível não reconhecer aquele "r" puxado no final do "senhor".
Um estalo fez com que a portão, usado pelos visitantes, se abrisse.
Assim que entrou, Renato empurrou, com cuidado, o portão atrás de si, para que ele se trancasse novamente. Olhando para o alto, viu as luzes coloridas saindo pela janela de Elvis. O amigo havia instalado um jogo de luzes no quarto, transformando-o numa versão miniatura das boates mais fervidas de Paraíso. Exagerado!, Renato sorriu para si mesmo e avançou pelo jardim muito bem cuidado da mãe Elvis. Plantas exóticas, vindas de vários lugares do mundo, eram a grande paixão da juíza Madalena, a mãe de seu amigo.
Mesmo lá de baixo, era possível ouvir a voz da Ludmilla, gritando uma de suas músicas.
- Esta vai ser uma noite daquelas. Prepare-se, Renato – disse a si mesmo.
Abadia estava parada à parta, exibindo um largo sorriso, quando Renato se aproximou.
- Boa noite, seu Renato. Que prazer ver o senhor – disse a mulher, estendendo-lhe a mão. Gesto retribuído com afeto sincero de Renato.
- Prazer é meu. Tava com saudade de você, Abadia? A última vez que estive aqui, você estava de férias. E aí? Se divertiu?
- Muito – respondeu Abadia, dando passagem para o rapaz entrar. – Eu fui visitar minhas irmãs em Brasília e ainda aproveitei para ver minha mãe que mora numa cidade próxima.
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Entre Meninos (Romance gay) - Concluído
Teen FictionQuando a mãe de Renato o avisa de que eles passarão o mês de férias na fazenda da avó, o rapaz fica indignado. Amante de roque, cinema, séries e literatura; Renato é um típico menino da cidade. Passar um período entre vacas e cavalos, no meio do mat...