Alguma coisa estava acontecendo na casa daquela fazenda. Alguma coisa muito estranha. Renato percebeu que algo estava errado, quando ninguém falou uma palavra durante o almoço. O clima era de velório. O único som que se ouvia na enorme sala de jantar era dos talheres batendo nos pratos. Como se não bastasse o silêncio sepulcral, Vanda e Joana evitavam se olhar, enquanto a médica não tirava os olhos do prato, a fazendeira olhava para um canto e outro da sala, onde a filha não estivesse. Definitivamente, algo não ia bem.
Desde que era muito novo, Renato se lembrava da avó como uma mulher ativa e falante. Vanda costumava aproveitar os momentos que tinha com os netos para contar histórias e mais histórias, era algo que fazia parte dela. Ela era assim. No entanto, naquela tarde, a avó estava estranhamente calada.
Joana parecia distraída, empurrava os pedaços de brócolis no prato de um lado para outro. E o tempo entre uma garfada e outra era cada vez maior. Suzy estava ouvindo música enquanto comia, alheia ao clima pesado. Suzy estava com o celular à mesa e a mãe não tinha falado nada! Realmente, a coisa era muito séria.
- Tá tudo bem, gente? – Renato começou.
- Oi? – perguntou a mãe distraída.
- O que é que está acontecendo aqui?
- Como assim?
- Isso é um almoço ou um velório?
- Tá tudo bem, não se preocupe – disse Joana, sem parecer muito convencida do que falava.
- Vó?
- Sim...
- O que foi que eu perdi?
Vanda olhou para Joana, que balançou a cabeça negativamente. Então, ela voltou-se para o neto e forçou um sorriso.
- Está tudo na mais perfeita paz.
- Não está, não.
- Renato, por favor, não começa – sugeriu a mãe.
- Não começa o quê? Vocês duas estão... sei lá... esquisitas...
- Esquisitas? Não sei do que você está falando – tentou disfarçar Joana.
- Ninguém fala nada, ninguém comenta nada. Vocês duas brigaram?
Joana riu sem graça.
- De onde você tirou uma maluquice dessas?
- Basta olhar para cara de vocês pra ver que tem algo estranho aí.
- Renato, - Joana respirou fundo. – Será que dá pra gente comer em paz, sem discutir? Olha esse almoço maravilhoso – ela apontou para a mesa – que tal a gente aproveitar um pouco?
- Eu já estou aproveitando, falta a senhora e a vovó aproveitarem também.
- Confesso que comi algumas besteiras na cozinha e fiquei um pouco sem fome, mas te garanto que estou aproveitando cada grãozinho, cada folhinha servida aqui nesta mesa.
- Tudo bem... não vou insistir.
- Melhor assim.
O almoço continuou no mesmo clima fúnebre. Joana forçou-se a comer um bife para dar ao filho a ideia de que estava tudo bem, Vanda terminou seu prato de salada e passou direto para duas doses de conhaque. Renato acabou perdendo o apetite depois daquela discussão sem futuro e não tocou no doce de mamão que haviam colocado ali para sobremesa. A única realmente feliz, talvez por não ter presenciado o debate à mesa, era Suzy, que se atracava com dois pedaços generosos de costelinha de porco assada com batatas e cobertos por molho madeira. Observando o apetite da irmã, Renato sacudiu a cabeça e pensou no quão bom era ignorar os problemas ao redor.
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Entre Meninos (Romance gay) - Concluído
Teen FictionQuando a mãe de Renato o avisa de que eles passarão o mês de férias na fazenda da avó, o rapaz fica indignado. Amante de roque, cinema, séries e literatura; Renato é um típico menino da cidade. Passar um período entre vacas e cavalos, no meio do mat...