Cap. 21 - Aquele beijo

6.4K 664 194
                                    



A reação natural de qualquer animal acuada é o ataque. Isso também é o que se espera de alguém com, como diriam alguns "sangue nos olhos". No fundo, o ser humano é um animal, por isso é natural que ele tenha uma reação reativa ao ser ameaçado. Renato sabia que, às vezes era preciso partir para o enfrentamento, na esperança de sobreviver, no entanto ele também tinha total consciência de que, em muitos casos, fingir-se de morto podia ter um efeito avassalador.

Depois de saber que a mãe estava planejando voltar para seu pai, voltar para aquele homem que ele não suportava mais olhar na cara, seu mundo caiu e ele precisou pensar rápido. O momento de enfrentar a mãe ia chegar, a hora de colocá-la contra a parede era uma questão de tempo. E, principalmente, mais cedo ou mais tarde ele teria que enfrentar o pai. Mas agora, era hora de ficar quieto. Joana estava se sentindo culpada, ele tinha certeza disso, portanto o melhor a fazer era amplificar a sensação de culpa da mãe.

Sabendo de tudo isso, Renato escolheu passar o dia no quarto, não ia falar com ninguém, nenhuma palavra! Ia deixar a mãe louca, pensando as piores coisas do mundo, até que ela – desesperada – pedisse-lhe desculpas e reconsiderasse sua decisão. Aí sim, ele agiria, deixando claro que não queria mais o senhor Manuel em sua vida, nem na vida de Joana. Nunca mais! Estava tudo planejado.

Sim, era um plano perfeito e tudo estava indo muito bem, obrigado. Já eram dez da manhã e ninguém tinha aparecido para lhe chamar para tomar café, ou lhe oferecer uma maçã que fosse.

A fome estava começando a apertar, mais do que isso, estava lhe deixando mal humorado. Entretanto, ele seria forte. Afinal de contas, tudo poderia estar pior, se não fosse a visita de Vanda na noite anterior. Renato nunca fora muito fã da avó (aliás, ele não era grande fã de parente algum), porém ela vinha se revelando um verdadeiro anjo nos últimos dias.

Sua reação inesperada, a dificuldade de lidar com a presença do pai ali na sala, tudo parecia perdido. Por alguns instantes, ele pensou ter estragado as coisas (não teria sido melhor, se tivesse fingido que estava tudo bem?).

Ele estava irritado e, evidentemente, faminto, quando Vanda apareceu no quarto com aquela sopa salvadora.

- Pensei que você pudesse estar com fome – disse ela, quando entrou no quarto.

- Não quero nada, obrigado – respondeu Renato, encolhido na cama e com a cara emburrada.

Vanda colocou a bandeja com a sopa sobre a escrivaninha (o cheiro estava irresistível, droga!), foi até a cama e sentou-se.

- Eu não sou sua inimiga aqui. Não precisa agir assim na minha frente. Eu estou do seu lado.

- Não sei do que você está falando, Vanda.

- Renato, eu também não aprovo essa ideia da sua mãe de voltar para o Manuel. – ela pensou um pouco – Na verdade, se dependesse de mim, ela nem teria se casado com ele há anos atrás. Essa é a verdade.

Vanda sempre fizera um esforço enorme para se aproximar do neto. Ela nunca foi aquele tipo de pessoa que aceita ficar de fora. Desde que se entendia por gente, o rapaz lembra de ter visto a avó tentando penetrar seu escudo protetor. Todas as outras pessoas da família evitavam contatos mais próximos dele, mas Vanda nunca fez isso. Renato estava queimando de raiva por dentro, essa era a verdade, mas talvez estivesse apontando as armas para o inimigo errado.

- Essa sopa parece boa. O cheiro tá ótimo – ele disse.

Vanda sorriu e se levantou.

- E o sabor está tão bom, ou até melhor, do que o cheiro – ela foi até a escrivaninha, pegou a bandeja com a sopa e algumas torradas e entregou ao neto. –Ficar com fome e fraco não vai ajudar em nada. Melhor se alimentar mesmo. Como dizem por aí: saco vazio não para em pé.

Entre Meninos (Romance gay) - Concluído Onde histórias criam vida. Descubra agora