Pé na estrada - 04

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              Imagino que o abrigo possui uma sala de máquinas e nela devo encontrar algumas ferramentas que podem me ajudar a consertar a moto. A porta de entrada desta sala fica à esquerda da cozinha, é um cômodo comprido que fica ao lado da sala de estar. Lá encontro a grande máquina do módulo de energia e os hacks de servidor que armazenam o sistema da casa. Mais ao fundo da sala está um pequeno armário onde se encontram as ferramentas, alguma há de me servir, pego uma pequena caixa que contém a maioria delas e subo de encontro à moto.

            Abro devagar a tampa da entrada do abrigo, observo com cuidado a área em volta antes de sair. Aparentemente está tudo calmo, nenhum sinal dos carniceiros da patrulha, a moto está como eu a deixei. Começo a desmontar e testar suas peças. Enfim identifico o problema, por estar todo preto e com seu aspecto retorcido confirmo que o estator de partida está queimado e pelo jeito o retificador de distribuição elétrica também. Estas peças não são fáceis de conseguir hoje em dia, se tiver sorte, poderei encontrar somente em Nathville, cidade que os habitantes chamam de curral, criada pela Natihvus Corp., para aprisionar os que permaneceram na terra depois da evacuação. Eu prefiro chamá-la de esgoto, pelo péssimo estado e o descaso que a Natihvus trata o lugar onde abriga os refugiados e capturados.

            Só tem um problema, é uma cidade cercada e vigiada todo tempo. Ninguém entra, há não ser pelo portão principal, e depois que está dentro, ninguém sai. (risos) — Como se isso fosse algum problema para mim. Vou preparar minha bagagem e partir hoje mesmo. Retiro as peças danificadas da moto e volto a cobri-la.

            De volta ao abrigo, começo a juntar algumas coisas para a viagem, a bússola, água, hidratante líquido, comidas, enlatados... e minha dupla companheira que nunca me abandona: meu revólver Tupi .42, modelo 2019 e minha faca artesanal, presentes do meu pai, uns dos poucos. Preciso também encontrar roupas que me denunciem menos que o traje. No quarto há um grande guarda roupa. Sem muita dificuldade, encontro roupas que possam me servir. O sapato é um número maior, mas com uma meia a mais vai ficar confortável. Fico feliz em ver o quanto a sorte sorri pra mim as vezes, encontro na gaveta do criado, um antigo Ipod com fones bluetooth, vai tornar a jornada menos tediosa:

            "Vamos ver o que temos aqui... tem uma playlist... "Expresso para Xavi"... Parece que alguém preparou uma viagem musical pra uma viagem espacial, espero que tenha coisa boa."

            Consulto o GPS do computador de braço, para me posicionar em relação ao esgoto. Eu estou a sudeste da cidade, a dois dias e meio a pé. Se conseguir ir em linha reta, talvez leve menos tempo, preciso evitar estradas, para não correr o risco de encontrar os carniceiros.

            Assim que saio, tranco a tampa do abrigo e cubro com terra e galhos secos para garantir que continue intacto. E antes de começar minha caminhada, vejo uma cena que me deixa levemente feliz: O que seria meu jantar é agora minha vizinha, a lebre pasta tranquila, tendo por perto seu amigo porco espinho.

Mundos Entre Luas - A Resistência (CONCLUÍDA)Onde histórias criam vida. Descubra agora