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Miguel não era um ser abelhudo, mas vendo Maria seguir aquele homem não conseguiu desviar seu caminho e se propôs a observá-los de longe. Maria e o revendedor, cujo nome era Caio, seguiram para o refeitório pediram dois cafés e se sentaram numa mesa.

A conversa no início era tensa para Maria, pois se sentia nervosa diante de tanta gentileza por parte do homem, porém com a descontração de Caio logo se sentiu a vontade e as risadas eram dadas abertamente. O revendedor sabia muito bem como conquistar uma mulher por meio do humor e elogios.

— Maria, você trabalha aqui há muito tempo? — Caio perguntou com seu sorriso bajulador.

— Não, tenho poucos meses ainda. — Ela arrumou os óculos no rosto e deu um sorrisinho envergonhado.

— Mas tenho certeza que você pretende passar muito tempo aqui, não é? E se possível for, ganhar uma promoção no futuro.

Maria ficou pensativa sobre a parte de "ganhar uma promoção" nunca havia pensado sobre aquilo. É claro que ela desejava trabalhar especificamente na área dela, mas no atual momento se sentia satisfeita com a sua condição. Era um bom momento de aprendizado.

— Desejo sim trabalhar bastante tempo aqui. A Béni é uma empresa que tem muitas vertentes e a gente sempre está aprendendo alguma coisa — ela disse.

— Sim, e como uma boa funcionária você deseja o bem da sua empresa, não é mesmo? — Ele inclinou a cabeça de lado e semicerrou o olhar para ela. Sem dúvida a estava sondando.

— É claro!

— Olha, se eu fosse você aconselharia o Miguel Cavalcanti a ficar com o nosso maquinário. Eu tenho certeza que vai ser o melhor pra vocês.

Maria murchou um pouco os ombros deixando o ar exalar dos pulmões. Ela deveria mesmo se colocar numa posição favorável acerca de uma das empresas?

— Maria, sei que você é muito inteligente e legal. Pensa nisso! — Ele deu uma piscada para ela. — Agora vou precisar ir. Sua companhia foi ótima no café.

Ele, sem nenhum decoro, pegou a mão dela e beijou, levando o rosto de Maria a arder. Miguel, vendo ao longe, sentiu o sangue ferver por aquela aproximação exacerbada do homem. Ele não esperou mais e seguiu em direção aos dois.

— Atrapalho? — a voz grave dele ressoou por trás de Maria.

Sua assistente deu um salto da cadeira tão abruptamente que seu corpo se chocou com o do chefe e ele cambaleou para trás quase caindo, porém firmou o pé no chão e acabou por segurar Maria, ficando um face a face com o outro. Maria prendeu o ar por uns segundos e sentiu o rosto formigar mais uma vez. Oh, Pai, ela nasceu para passar vergonha!

— Sr. Miguel, mil desculpas! — ela logo voltou a se firmar no chão se afastando rapidamente do chefe.

Miguel se recompôs e arrumou a gravata no pescoço.

— Bom, eu acho que minha hora já deu! Tchau! — Caio deu um aceno com a mão e como um flash saiu da frente dos dois.

Maria se sentiu trêmula diante da situação e começou a andar rapidamente deixando Miguel para trás, mas ele foi atrás dela e chegando num corredor mais vazio ele, sem pensar muito, a segurou pelo braço e a puxou, virando-a para si. Maria engoliu em seco com a reação de Miguel, contudo ele logo retirou a mão dela e deu uns passos para trás. O presidente da Béni estava sério e seus olhos tinham um brilho diferente. Ele já vira antes esses tipos de aproximações, mas dessa vez era com a Maria, dessa vez era diferente!

— Maria — ele declarou num tom de repreensão.

Ela, como uma menina assustada, cruzou as mãos, baixou a cabeça e olhou para o chão.

— Sabe, eu não sou de me incomodar com quem meus funcionários falam ou deixam de falar. Mas eu acho que tenho dever de lhe alertar sobre a bajulação nesse mundo dos negócios.

— Bajulação? — ela disse num tom de voz trêmulo.

— Sim. — Ele passou a mão nos cabelos e respirou fundo. — Só tenha cuidado. — Ele apertou os lábios, pôs as mãos no bolso e saiu do corredor, deixando-a sozinha pensando em muitas coisas.

*
Era uma manhã ensolarada quando Maria entrou na Béni e encontrou logo na recepção, Caio. O homem estava muito bem arrumado naquela manhã e logo que viu a assistente da presidência a abraçou.

— Maria, que bom te rever. Você continua... — ele olhou para ela de cima a baixo e soltou o ar. — Continua simpática, como sempre. — Não tinha outra palavra para expressar.

— Ah! Obrigada! — Ela ajeitou os óculos e sorriu timidamente.

— E então, você falou com o chefe? — Ele, sem pedir licença, colocou o braço nos ombros de Maria, o que causou certo incômodo na jovem.

— Ainda não, mas eu reli sua proposta e realmente acho ela boa.

— Eu sabia que você era muito inteligente. — Ele piscou.

Naquele instante, Miguel chegou na recepção da Béni e deu de cara com a cena de Maria com o braço de Caio ao redor do seu ombro e aquele sorriso barato que o fornecedor tinha. Ele enrugou a testa e franziu o cenho. Respirou fundo e tentou ter domínio próprio.

— Maria, acho que o horário do trabalho começou — ele disse já andando, a passos duros e rápidos, para seu escritório.

Ela se desprendeu do braço de Caio e correu atrás do chefe, enquanto ele abria a porta, ela proferiu:

— Sr. Miguel, eu estava pensando que a melhor decisão seria a compra do Maquinário do revendedor Caio — Maria não se deu conta do humor azedo de Miguel, e ouvi-la falar sobre aquele homem não ajudava em nada.

— E por que ele seria o melhor? — Miguel estreitou os olhos e sentou na cadeira, cruzou as mãos e a esperou falar.

— Ah! Eu estava lendo e pesquisando que as máquinas deles são muito tecnológicas e o preço está dentro do mercado, apesar do 1° fornecedor ser bom, os equipamentos não são os mais atuais — alegou com precisão.

— Não sei, Maria. Não sei mesmo. — Ele respirou fundo e cruzou os braços na frente do peito.

Miguel tinha ficado com tanta raiva das insinuações daquele fornecedor que tinha decidido não aceitar seu produto. Jogar daquele jeito demonstrava um caráter totalmente sem escrúpulos.

— Se o senhor pensar bem vai ver que é a nossa melhor opção. — Ela tirou um envelope da bolsa e estendeu para ele. — As pesquisas que fiz estão aqui. É só analisar.

Ele, um pouco contrariado, aceitou o envelope, e Maria foi para sua sala.

Na hora da reunião os dois fornecedores estavam presentes, e Miguel após analisar bem as propostas de venda e, não podia negar, que se deixou influenciar por Maria acabando por aceitar fechar o negócio com a empresa de Caio. O bonitão quase deu um urro de alegria na sala, mas se conteve. Assim que a reunião acabou ele foi o primeiro a sair da sala, apressado para falar com alguém no telefone.

Maria ficou um pouco embaraçada pelo súbito desinteresse de Caio até mesmo em falar com ela. Uns minutos depois andando pelo andar do refeitório encontrou Caio falando ao telefone.

"Sim, conseguimos!" — ele dizia. — "Ah! E você estava certo, Raul, aquela feia se deixou levar realmente. É só elogiar algo aqui e ali para que venha se derreter. Mulheres como ela se rastejam por atenção. Não foi fácil olhar para aquela criatura, mas no fim valeu a pena!".

Ele não percebeu que Maria o ouvia e, com o coração rasgado e sangrando, saiu correndo.

Tudo Outra VezOnde histórias criam vida. Descubra agora