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Miguel fitava atentamente o céu daquele amanhecer. Já fazia mais de duas semanas que Maria partira sem dar adeus, deixando tudo para trás. Mas ele não a culpava. Não podia imaginar o que ela sofreu a vida toda. Aquelas palavras ditas por ela naquela noite de temporal o marcaram para sempre.

"Importante para quem? Meu Deus! Olhe pra mim! Eu sou ridícula. Nem quando quero acertar dá certo. Veja o que aquela mulher falou e sabe o que mais dói? É que ela está certa. Eu não tenho nada a oferecer nem a você e nem a ninguém. Por favor, me deixe."

Ele sentiu sua terrível incapacidade diante de tantos dramas da vida. Ele só podia orar por ela para Deus a curar e a visitar. Que os olhos dela fossem abertos e seu coração sarado. Não podia ser um salvador.

Miguel foi até a saleta dela, encontrando tudo no seu devido lugar. Maria era bem organizada. As recordações de quando ele entrava e era recebido com um sorriso e o famoso "Seu Miguel", fizeram seu coração apertar. Seguindo para trás da mesa dela, ele abriu uma das gavetas para ver se havia algo e, para sua surpresa, tinha um lenço ali. Ele tirou de lá e apertou na mão. Oh! Seu amor doía no peito. O anseio de estar com ela era algo quase desesperador. Mas precisava entender que Maria tinha de viver sua vida, ainda que longe dele. Ele também deveria viver.

Olhou mais uma vez ao redor e observou um quadro pintado na parede, então sua mente despertou. Lembrou de como Linda, sua irmã, era uma exímia pintora. Ele a escondeu por tanto tempo por medo dela ser infeliz, mas isso não a deixaria mais forte e sim, quem sabe, com medo de viver. Maria o ensinou que o mundo era cruel para com as pessoas que não possuíam seus padrões. Mas se tivesse alguém por elas, poderiam florescer.

Ele saiu da sala apressado e resolveu fazer algo. Chamou Liz e lhe passou a devida instrução. Nem se pode dizer o quanto a moça ficou admirada daquilo que ele pediu, mas sem questionar, assentiu. Ao esperar o elevador chegar, ouviu alguém dizer:

— Miguel, que bom revê-lo e ver que a Béni está começando a produção de sua nova coleção. — Era Eduardo, o que fazia fornecimento para o Ateliê de Juan. O rapaz colocou a caixa, que segurava em mãos, no chão.

— É ótimo de verdade! Ainda bem que você não abandonou a empresa como tantos outros fizeram — Miguel disse, relembrando como tantas outras fábricas fecharam as portas para eles só por causa daquela dificuldade, agora marcavam reunião direto para mostrarem seus produtos, mas Miguel rejeitava.

— Não poderia fazer isso. Afinal, a Béni foi uma das empresas que mais deu força para o meu negócio.

— Isso é bom! — Miguel bateu no ombro do rapaz e a porta do elevador se abriu.

Eduardo pegou a caixa novamente e começou a andar em direção ao elevador, mas esbarrou em alguém e para seu desprazer teve de ouvir.

— Mas o que é isso?

— De novo você! — Os dois disseram em uníssono. Era Aretha.

— Como sempre querendo me matar com essas caixas. — Ela passou a mão na cabeça, onde a quina do objeto tinha batido.

Miguel nada ouviu, pois assim que Aretha chegou ele entrou no elevador. E Eduardo, por causa daquele embate, perdeu a chance de partir.

— Como sempre você no meu caminho, garota! — disse o homem irritado.

— Olha não me chama de garota. Que eu não suporto quem me chama assim. — Aretha ficou vermelha de raiva. — Você que é um homem muito ousado e sem senso de direção. Acho que tenho ir a delegacia fazer um pedido de distanciamento.

Eduardo estreitou os olhos.

— Você nunca olha por onde anda! — ele retrucou.

— Olha, não vou nem perder meu tempo mais. Porque nessa sua cabeça quadrada nada pode entrar! — Aretha olhou para ele e suas sardas ficaram mais mais evidente. — Sinceramente! — Bateu o pé no chão e saiu a passos duros, dizendo para si: — Homem turrão!

Tudo Outra VezOnde histórias criam vida. Descubra agora