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O mundo pareceu desabar sobre os pés de Maria. Aquelas palavras não soaram doces, mas era como se trouxessem com elas a zombaria e as gargalhadas da gangue de Gael. Aqueles ruídos do seu passado eram tão fortes que a acorrentavam de novo. Não. Aquilo não era verdade mesmo.

Ela o olhou com tanta dor que Miguel não conseguiu decifrar o que de fato acontecia e como a sua declaração pôde a afetar de modo tão cruel. Ele viu o esforço dela para se afastar, correr dele e se isolar de todo o mundo.

"Não acredite. Isso não é nada. Sabe muito bem o que aconteceu com o Otávio" a voz estava de novo ecoando.

Com urgência, Maria olhou para os lados querendo encontrar qualquer pista de pessoas escondidas ali. Não queria mais ser motivo de deboches, vexames e humilhações. Ninguém tinha piedade do seu coração. Ninguém se importava se ela estava sendo dilacerada. Ninguém NUNCA poderia entender o estrago que todas aquelas palavras zombadoras causaram dentro de si. E ela não seria novamente fantoche de ninguém.

— Me solta! — ela exclamou e se afastou abruptamente. — O senhor não podia ter feito isso comigo. Não sou um brinquedo. — A voz dela carregava o peso de toda a dor de anos. — Estou cansada de ser motivo de deboche para alguém; cansada de sempre ser invisível em relação ao que penso e sinto. Não posso mais.

Miguel estava estarrecido com tudo aquilo. Ele queria poder dizer que era verdade. Era a maior verdade de toda a sua vida aquele sentimento. Ele estaria ali com ela para vencer todas as dificuldades. Juntos poderiam ser mais fortes. Mas constatou como sua assistente encontrava-se tão sensível acerca dos sentimentos e angústias que ela simplesmente não entenderia ainda que pintasse as palavras em ouro no céu.

— Maria...

— O senhor não podia fazer isso. Não podia!

Miguel estreitou os olhos e queria sinceramente compreender o real motivo de não poder dizer aquilo.

— Por favor, me deixe em paz. Eu sou uma pessoa. Assim como o senhor e todos. Eu sou alguém — ela falava enquanto as lágrimas caiam abundantemente pela face.

Sua dor era latejante e pulsante. Não a deixava pensar e ponderar sobre o homem a sua frente, nem seu caráter demonstrado em todo o tempo. Maria começou a andar para longe, e Miguel tentou se aproximar, pois tinha medo de que algo ruim a acontecesse.

— Não, não me segue. Me deixa em paz. Que todos me deixem em paz!

E como uma providência divina, um táxi passou por ali, Maria fez parada e após um último olhar ao homem que tanto amava, partiu.

Miguel ficou estático enquanto via o carro se afastar. O que faria? Seu coração pulsava a mais de mil, seus sentimentos estavam confusos e, pela primeira vez diante de todo aquele vendaval que estava sua vida, ele também chorou. As lágrimas foram poucas, mas suficientes para manisfestar os pedaços em que seu coração estava.

E no meio daquele gotejar contínuo apareceu Bento, que não teve medo de se molhar para procurar Maria, mas encontrou apenas Miguel de um modo que não imaginaria.

— Cadê a Maria? — Bento indagou, imaginando que algo entre os dois houvesse acontecido.

— Ela se foi — Miguel disse fechando o punho. Que ódio começava a sentir de si próprio por ter declarado seu amor num momento tão impróprio, segundo seu próprio parecer. — Eu devo ir atrás dela! — Enfim, se moveu dando um passo para ir até seu carro, mas Bento o segurou no ombro.

— Não vá. Não sei o que houve, mas sei quando Maria não quer ver ninguém. Eu vou falar com ela.

— Por que você e não eu? Eu que preciso falar com ela. — Naquele momento, o ciúmes falou mais forte.

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