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A porta dupla do hospital foi aberta meio que abruptamente por Miguel, seguido de sua assistente, pois ele quis que ela fosse junto. Na sala de espera encontrou o Sr. Francisco, pai de Anthony. O senhor estava com os cotovelos apoiados nas pernas e suas mãos entrelaçados de modo que indicava que ele estava orando. Ele abriu os olhos assim que sentiu uma mão em seus ombros e ao erguer a cabeça avistou seu filho na fé.

— Miguel! — o senhorzinho se levantou do assento e abraçou o homem a sua frente.

Eles se conheceram no hospital, e seu Francisco o evangelizou, tornando-se um pai espiritual para o jovem convertido.

— O que aconteceu realmente? Onde ele está? — Miguel indagou.

— Está em cirurgia agora. Ele estava dirigindo em alta velocidade e o carro acabou batendo num muro. — Sr. Francisco suspirou. — Ele também estava bêbado. A tristeza que tomou posse de Anthony esses tempos o deixou ainda mais afundado nesses vícios. Oh, Jesus! — Ele passou a mão entre os fios finos e brancos do cabelo. — Há tanto tempo tenho orado para que esse menino tome jeito, mas parece que desde a morte da mãe dele tudo só piorou. E isso já faz 10 anos.

— As vezes não entendo porque Anthony tem essas atitudes — Miguel também suspirou e acabou se sentando junto com Sr. Francisco.

— Acho que ele faz isso justamente para suprir esse vazio que o consome — Maria falou, fazendo Miguel e o pai de Anthony olharem-na. Na verdade, foi nessa hora que Francisco reparou que havia mais alguém ali.

— O que você quer dizer com isso? — Miguel perguntou.

— Seu Anthony, aparentemente, manifesta que não se sente capaz e acaba se utilizando da prostituição e outros vícios para fugir de seu próprio senso de impotência para as coisas mais sérias e prefere pelo menos ser bom em outras, como mulheres e bebidas. É um modo dele se autoafirmar.

— Está dizendo que meu filho faz essas coisas como meio de se sentir digno de algo? —  Francisco reformulou tudo na mente.

— Ele quer provar para si mesmo que é bom, nem que seja provando isso com muitas conquistas.— Maria quicou os ombros e colocou para fora aquilo que já havia avaliado sobre Anthony, pois viu que quando o roubo na Béni aconteceu ele mudou totalmente o comportamento. — Infelizmente quando fomos enganados, mais uma vez os sentimentos de incapacidade o dominaram e dessa vez o afundaram. Ele tem que aprender que nossa capacidade não vem de nós e, sim, de Cristo.

Maria terminou de falar deixando Miguel e Francisco sem palavras literalmente. Ambos pensaram que haviam orado tanto para entender as motivações de Anthony e precisou alguém vir de fora para praticamente "desenhar" o que já estava tão na cara.

— Quem é você, filha? — Francisco perguntou, com gratidão no olhar.

— Ah! Eu sou a Maria, assistente do Sr. Miguel. — Ela estendeu a mão meio tímida e recebeu o cumprimento por parte do senhor.

— Desculpa não fazer as apresentações.— Miguel olhou para a mão de ambos sendo apertadas e teve uma leve sensação de prazer.

— Você é tão sábia, minha filha. Existem poucas moças na sua idade assim. A maioria está perdendo tempo com coisas inúteis — Francisco declarou com toda aquela sinceramente que os mais velhos possuem. — Gostei de sua escolha, Miguel. — O velho homem mirou o presidente da Béni e seu brilho no olhar denunciava alguma coisa que Miguel não soube traduzir.

Os três ainda estavam sentados quando um médico baixinho e rechonchudo se aproximou e o trio se levantou. O profissional da saúde tirou o óculos e soltou o ar cansado.

— Nós conseguimos estabilizar a hemorragia e agora ele está dormindo. Se quiserem vê-lo, cada um pode ir sozinho por uns cinco minutos.

Francisco foi o primeiro que se preparou para entrar naquele quarto de hospital. O senhor quando viu o filho com a cabeça enfaixada e dormindo sentiu a dor dilacerar seu espírito. Ele só tinha Anthony na terra. Sua esposa havia partido e irmãos também. Não queria ter de enterrar o filho. Oh! Não suportaria mais essa angústia!

— Jesus, não deixa meu filho partir. Por favor, dê mais uma chance para ele. Mude a história de Anthony. Não tenho mais forças para lutar com a vida degenerada dele. — Lágrimas caíram expondo seu grande aperto no peito.

Depois de um tempo, ele saiu e acabou sendo acalentado por Maria enquanto Miguel via o amigo.

— Vai ficar tudo bem, Sr. Francisco. — Ela sorriu com esperança no olhar. — O nosso Deus tudo sabe. Talvez depois disso algo melhor provenha.

Maria desejava aquela esperança de que momentos bons viriam. Apesar de que aquele buraco em que entraram parecia somente piorar.

— Eu achava que Miguel nunca fosse encontrar alguém, sabe. — Francisco falou do nada, e ela arregalou os olhos.— Aquela Marina é muito chata e insensata. Mas confesso que temia que a pressão dos pais deles pudesse acabar o cansando e fazendo-o ceder. — Olhou para Maria com muita atenção — Vejo que Jesus enviou graça.

Maria arrumou os óculos e deu um sorriso amarelo enquanto lançou palavras a Deus em pensamento:

"Oh, meu Deus, ajuda o Sr. Francisco. A idade e o sofrimento estão fazendo-o falar coisas sem sentido. Dê graça!".

Ela, por educação, nada respondeu e apenas assentiu. Querendo entender o porquê do velhinho falar aquilo naquela hora.

— Você pode não entender nada do que estou falando, mas eu não enlouqueci.

Maria apenas sorriu, sentindo realmente que o velhinho endoidou de vez.

— Seu Miguel é apenas meu chefe. — Ela quis encerrar aquele assunto.

Francisco esticou os lábios em um sorriso e não disse mais nada.

Miguel saiu do quarto e viu como Maria estava meio que com as bochechas vermelhas e um sorriso que denunciava um pouco de vergonha. Não entendeu nada.

— Acho bom irmos. Amanhã viemos de novo — Miguel disse e os dois assentiram.

Ambos deixaram Francisco na sua pequena casa e voltaram para a empresa, já era hora do almoço. Ao saírem do carro, Maria bateu de frente com Caio. Ele parecia que estava esperando.

— Caio, o que faz aqui?

Miguel bateu a porta do carro de modo feroz quando o viu.

— Eu vou mesmo ter que chamar a polícia? — Ele foi andando logo na direção do homem.

— Não, eu só quero ajudar — Caio manisfestou sua intenção mesmo que a cara de Miguel fosse nada amigável.

— Ajudar com o quê? — o chefe de Maria perguntou entre os dentes. Aquele homem o trazia sempre grande irritação.

— Acho que ele pode ajudar sobre a empresa fantasma. Não era isso que você queria falar naquele dia? — Maria expressou, após entender que o homem parecia mesmo carregar arrependimento.

— É isso mesmo. Eu sei quem enganou vocês e quem o ajuda está mais perto do que vocês pensam — Caio proferiu, fazendo Maria e Miguel trocarem olhares.

Aquilo tinha ficado realmente intrigante.

— E quem fez isso? — Maria questionou.

— Não é bom conversarmos no meio da rua — Caio olhou para os lados, como se temesse por algo.

— Então vamos para o meu escritório — Miguel falou.

— Lá também não é bom. Já sei onde podemos ir. Vamos!

Caio seguiu à frente, levando Miguel e Maria se entreolharem sobre aquele mistério, mas seguindo-o por trás.

*

Capítulo postado com sucesso. Um pouco tarde, mas tá valendo!

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