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Miguel se surpreendeu ao chegar a sua sala depois do almoço e encontrar tanta gente reunida a sua espera.

— Aconteceu alguma coisa para que todas vocês estejam aqui?

— Aconteceu sim, mas é algo bom — Maria falou pelas demais. — Sr. Miguel, eu tomei a liberdade para contar as meninas a situação da empresa — A assistente percebeu que o chefe estreitou o cenho enquanto arrumava a posição na cadeira. — O senhor pode brigar comigo mais tarde, se quiser...

Ela parou um pouco e pensou: "Ai, Deus, não permite não que ele brigue comigo. Foi por uma boa causa". Voltou a sua fala:

— Mas eu estava procurando ajuda e a Liz deu uma ótima ideia. Fala, Liz! — Maria olhou para a menina, incentivando-a.

Liz falou a ideia, e as demais comentaram sobre como tudo poderia funcionar.

— A Béni terá uma empresa que pode ser seu suporte para esses dias difíceis. Depois que se restabelecer é só cancelar.
— Maria disse. — O senhor pode usar o pequeno valor que restou para a nova coleção e fazer como capital da nova empresa.

— Aí é só investir num marketing pesado para a venda da nova coleção — Magnólia declarou com ânimo.

— Você sabe que o capital de uma empresa não deve ser usado para despesas e nem nada assim. E não teríamos outro dinheiro — Miguel refutou, querendo saber até onde eles iriam.

— Eu sei, seu Miguel. — Maria apertou os lábios. — Mas é a única esperança. Pra vencer temos que enfrentar grandes riscos. E só assim o nome da Béni não será diminuído por estar nos mercadões.

Miguel olhou para todos aqueles rostos cheios de expectativa e disse:

— Eu vou pensar bem sobre isso e orar. Em breve terão minha decisão.

O batalhão assentiu e voltando a seus postos, Maria também seguiu para sua sala. Ficando somente Miguel e Bento, que desde que voltou do almoço permaneceu atento aos seus afazeres.

— Você ouviu o que elas disseram? — Miguel perguntou ao jovem.

— Ouvi sim. E se quer saber, é uma ideia muito sensata.

— Por que acha isso? — Miguel virou-se para ele e estreitou os olhos.

— Com uma empresa nova se poderia até fazer empréstimos porque teriam crédito. Além de fazer transações que com o nome da Béni seria mais arriscado.

Miguel mirou o teto pensando. Tinha gostado da ideia e a opinião de Bento também era sóbria. Deveria ele apoiar aquilo?

***

Miguel chegou cedo a Béni com os pensamentos bem acertados sobre o que gostaria de fazer. Na noite passada, ele havia orado, lido as escrituras e ponderado bem sobre a proposta levantada pelo batalhão. Havia tomado uma decisão.

Assim que Maria e Bento chegaram, ele convocou uma breve reunião com a assistente em sua sala. Até Bento esperaria do lado de fora. Maria percebeu o semblante sério do chefe e se sentou com uma certa tensão, não sabia o que esperar daquela repentina reunião. Miguel permaneceu um tempo calado, fazendo com o que o ar de mistério pesasse mais ali dentro.

— Maria, ponderei bastante sobre a ideia dada pelo batalhão. Tem suas vantagens e tem seus riscos — ele falava compassadamente. — Mas eu preciso que uma pessoa em quem eu confio seja responsável por isso. — Ele tinha o olhar firme nela, levando-a até engolir em seco.

— Sim, seu Miguel. Nós encontraremos alguém de segurança — Maria ajeitou os óculos no rosto e entrelaçou as mãos.

— Não encontraremos. Eu já tenho a pessoa certa pra isso!

— Ah que bom! Então é só avisá-la agora.
— Maria sorriu.

— Eu estou avisando neste exato momento — Miguel quase proclamou com sua voz grave.

Maria arregalou os olhos a tal ponto que, se fosse possível, eles cairiam pela face. Uma falta de ar, do nada, começou a aflorar nela e a sua cabeça rodou. COMO ASSIM?! Maria achava que, com certeza, teria um treco alí mesmo. Ela se levantou meio que abrupta e foi logo indagando:

— Eu?... E... Eu? Eu? Mas por quê? — Resolveu parar para dar uma respirada ou era capaz de atropelar todas as palavras de uma vez.

Miguel também se levantou, alinhou o terno e a fitou com bastante atenção.

— Maria, se acalme! — pediu com certa leveza. Ele soltou o ar, olhou para nada específico ao lado e seus lábios se curvaram num casto sorriso. — Sabe, quando eu soube que assumiria a presidência desta empresa eu orei a Deus. Eu orei pedindo alguém de confiança para que eu pudesse contar. Não é fácil, Maria, ter que tomar tantas decisões difíceis. Principalmente quando se tem pessoas querendo sua destruição.

Maria sentiu um certo rubor tomando conta de sua face e, como de costume, arrumou os óculos no rosto para disfarçar o nervosismo.

— E então você apareceu, de uma maneira bem diferente. — Ele olhou para ela. — Foi encharcada de água. Mas me pediu um emprego, quem diria.

Maria deu uma sorriso de canto.

— E por que o senhor me empregou mesmo? — ela ousou perguntar.

Miguel andou para mais próximo dela, ficando a certa distância, mas com muita verdade pronunciou:

— Seu olhar transmitia sinceridade mesmo quando disse que estava apenas brincando. E eu precisava de alguém assim, resolvi testar. Maria, você sempre continuou tendo aquele mesmo brilho no olhar. Mesmo agora eu posso ver sua sinceridade. Isso é um tesouro.

Maria quis chorar com a emoção que aquelas palavras lhe trouxeram. Seu chefe também carregava muita verdade em cada declaração.

— Eu... Eu nem sei o que dizer. — Ela deixou algumas lágrimas cair, mas as enxugou em seguida.

— Por isso que meu desejo é que você assuma essa nova empresa. Eu confio em você, Maria.

Aquilo era uma responsabilidade muito grande para se ter e ela não se achava a altura de tamanha confiança. Ela só era a Maria, a simples menina feia que gostava de estudar. Não era?

— Não sei se posso, seu Miguel.

— Você não estará sozinha. Terá a mim e seus amigos. Eu não tenho outra pessoa em quem confiar, Maria. O que me diz? — Ele estendeu a mão para ela, que ao vê-la aberta em sua direção temeu.

"Oh, Senhor, o que eu faço? Nunca me preparei para isso. E se eu falhar, colocando tudo a perder? Não, não, não! Não vou conseguir!".

— Eu posso colocar tudo a perder... — Mais umas lágrimas caíram.

— Uma vez você me disse que com grandes vitórias vêm grandes riscos. — Vendo o rosto da sua assistente vermelho e inundado de lágrimas, ele ousou se aproximar mais dela. — Eu conto com você para esse risco, o que me diz? — Ele, em um impulso, com o seu polegar enxugou a face dela. — Eu vou estar com você, Maria. Seremos nós dois correndo o risco, e o Senhor conosco.

Ela apertou os lábios, soltou profundamente o ar e disse:

— Venceremos juntos! — Os dois apertaram a mão.

Tudo Outra VezOnde histórias criam vida. Descubra agora