Capítulo 17

362 23 1
                                    

Ele

Estou dentro do carro, no estacionamento. Tinha entrado com Honey no hospital, mas meu pai me ligou e como eu queria muito falar com ele sobre o que aconteceu na semana passada, aproveitei que levaram Honey para tirar uma radiografia da mão e vim para o lado de fora conversar com ele, só que a conversa não foi como eu esperava.

Limpo uma lágrima que estava quase escapando de meus olhos ao ouvir uma batida leve no vidro do banco do passageiro, que me tira de meu devaneio, em seguida Honey entra. Seu braço está com uma tala ao envolto da mão direita.

- Tudo bem? - ela pergunta com um olhar meigo.
- Você está com uma mão enfaixada e pergunta para mim se estou bem? - sorrio para ela.

Ela abre um meio sorriso para mim, então o fecha.

- Posso ver que não está bem - diz olhando no fundo de meus olhos.

De alguma forma Honey saber que não estou bem faz com que eu fique pior, não quero que ela me veja assim. Mas parece que não consigo fingir muito bem perto dela. Meus olhos voltam a ficar marejados.

Agora eu sei o que meu pai foi fazer quando disse que precisava resolver umas coisas. Ele foi ver seu médico para saber o resultado dos exames que tinha feito. Exames que eu, seu próprio filho, não sabia que ele tinha feito.

- Está tudo bem - ela diz limpando uma lágrima que caiu em minha bochecha - pode me contar.. se quiser.

Penso um pouco e decido contar a ela. Acho que já tinha decidido que ia contar antes mesmo de pensar, a verdade é que não sei se conseguiria mentir para ela. Afinal, ela mora na minha casa e iria perceber que não estou bem de qualquer forma.

- Meu pai acabou de me ligar. Parece que.. - respiro fundo - ele está com câncer no pulmão. Estágio quatro. Os médicos disseram que as chances dele são baixas, o câncer já atingiu outros órgãos.

Eu estava conseguindo me controlar bem, mas agora contando tudo para Honey parece que tudo é mais real, e algumas pequenas lágrimas começam a cair.
Jamais pensei que choraria por meu pai. Mas também nunca pensei que ele morreria de câncer.
Por mais que meu pai seja cruel quase toda vez que vem me ver, ele é a única família que eu tive durante toda a minha vida. E se já me sinto sozinho mesmo que meu pai esteja vivo, se ele morrer eu realmente não terei mais ninguém.

- Ei, olhe para mim - ela segura em meu queixo com a mão esquerda - vai ficar tudo bem. Vai dar tudo certo. Ele ainda tem chances, certo? Não perca as esperanças, tá bem?

Honey se estica e me dá o abraço mais forte que já recebi em toda a minha vida - mesmo que esteja usando somente um braço.

- Ele é a única família que eu tenho, não posso perdê-lo - eu digo em meio à seu abraço.
- Você não vai perdê-lo, vai dar tudo certo. Ele está vivo, é isso que importa. Significa que ele ainda pode se curar. E mesmo se isso acontecer, mesmo se ele partir..

Me lembro que Honey perdeu seu pai quando era criança, e mesmo que faça muito tempo eu sei que Honey ainda se lembra.

- A dor .. ela vai embora?
- No começo é quase insuportável e parece que não vai passar nunca, mas depois de um tempo.. bom, com o tempo a dor vai ficando menos insuportável, até chegar o dia em que você simplesmente se levanta e percebe que não dói tanto assim. A lembrança é sempre dolorosa, mas com o tempo se aprende a conviver com ela.
- Eu vou ficar sozinho - digo - sempre fui sozinho, mas agora vou ficar mesmo sozinho.
- Ei, olha para mim - ela vira meu rosto para si com sua mão esquerda - você não está sozinho. Você tem seus amigos, que tenho certeza que vão ficar ao seu lado..

Amanhecer AgridoceOnde histórias criam vida. Descubra agora