~Clara~
Como de costume fui até aquela sala, andava pensativa pelos corredores, meus passos eram lentos e firmes, a porta enorme impunha a face de uma fortaleza impenetrável, estendi a mão na maçaneta, porém, não consegui abrir a porta, um sentimento de melancolia invadia meu peito, eu sabia a visão que me esperava do outro lado e também me sentia culpada por toda aquela situação. Na minha mão direita levava uma flor vermelha para ele, era o mesmo roteiro que estive atuando nos últimos quinze anos então por que me sentia tão triste?
Enquanto estava parada criando coragem para abrir a porta ouvi a voz de Heiko, suas palavras encheram meus olhos de lágrimas, ele já está velho o suficiente para saber da verdade, entretanto nunca pensei que ele poderia falar algo como aquilo.
- Ela vai aceitar o pedido do Eric, por quê? Por que de todas as criaturas meu primo, filho da tia Mey e tio Calebe, tantos mortais e seres sobrenaturais, por que ele deseja justamente ela?- ele deu uma pausa longa e silenciosa- Spike me contou que o mesmo aconteceu com você e a mamãe, no inicio eu não entendi os seus motivos de ter entregado sua família de bandeja ao seu rival, mas agora eu entendo...
A voz de Heiko ficou embargada enquanto ele abafava seus soluços, eu levei minha mão a boca, estava completamente comovida com a situação, enquanto ele prosseguiu:
- Dói tanto pai... Eu não queria sentir isso, mas eu não me arrependo de amar a filha de Grell. Foi algo tão bom de sentir... Como você conseguiu suportar essa tristeza por tanto tempo? Machuca a ver sorrindo para ele, depois que percebi os verdadeiros sentimentos da ceifadora pelo meu primo me sinto insuficiente, as poesias que escrevi repleto de alegria para ela, agora, me fazem chorar, aliás a mamãe ainda guarda um poema que você escreveu para ela, você também era doce com as palavras quando estava apaixonado... Não consigo me conformar que você escolheu vegetar dessa maneira, queria ter tido mais conversas contigo. Sinto que me entenderia perfeitamente agora.
Depois de um tempo Heiko saiu, tivemos uma breve conversa e consegui induzi-lo a acreditar que eu havia acabado de chegar e não tinha ouvido sua triste confissão. Logo nos separamos e eu entrei.
Peter continuava ali, a tinta dos seus cabelos aos poucos saia revelando a beleza dos seus fios prateados, as flores que lhe dei nunca murcharam, havia pingos escuros que manchavam a tampa do caixão de cristal, Heiko tinha se debruçado ali e chorado todas as suas mágoas durante um bom tempo, mesmo antes de eu chegar.
- Seu filho é um menino tão doce, não esperava que ele herda-se a maior qualidade do pai, uma coisa eu concordo, não é fácil aceitar sua escolha, mas... Obrigada, por tudo, mesmo que sua risada exagerada fazendo falta, meus vinhos não somem mais, esse caixão aprisiona todo o aroma que você deixava pelo castelo, não te ouço mais reclamar quando chamo o Max de querido.- fiz uma pausa para enxugar minhas lágrimas.- Ontem, quando fui ao mundo dos mortais ver Elizabeth, me peguei parada na porta esperando sua voz pedindo para me acompanhar, e o silêncio cortou meu coração.
Levantei a tampa do caixão e depositei a flor junto com as outras, dei um leve beijo em sua testa, depois sai da sala mais abalada do que nunca.
~Sebastian~
Que ardência é essa no meu pulso? Parece até que lancei minha mão no fogo. Clara entrou em nosso quarto massageando o pulso, eu não entendia como aquilo era possível. A chamei para conversar e não tínhamos a mínima ideia do que aquilo poderia significar até que um choro suave foi ouvido. Clara saiu correndo pelos corredores, eu soltei meu livro e a acompanhei, suas mãos apertavam o vestido com força enquanto seus cabelos esvoaçavam e, por mais trivial que aquilo fosse, o momento era completamente mágico aos meus olhos.
O choro vinha da porta da frente, conferi minhas vestes antes de abrir a porta, assim que o fiz o espanto estampou o rosto de Clara, na porta estava Ezael, nos braços tinha uma criança e a notícia que ele trouxe fez minha esposa cair em prantos.
- Elena se foi...
- Como?!
- Ela se foi poucos minutos depois de dar a luz a essa garotinha, ela disse que você deveria criá-la e...- Ezael enxugos suas lágrimas com o dorso da mão e acalmou sua respiração para finalmente continuar- Peço que cuide de nossa sobrinha, sendo esse o último pedido de Elena.
Entregou a pequena em meus braços e em seguida ele desapareceu, a criatura sorria para mim com seus cabelos brancos e olhos azuis acinzentados, olhei para Clara, seu rosto estava frio, sem o mínimo traço de sentimentos, era assim que prestava luto, quando seu nome não tinha ligação com a causa da morte.
- Seu nome será Alva.- disse fazendo cafuné na cabeça da bebê.
Clara olhou para mim e vi nascer em sua face um sorriso singelo, delicado e brilhante, com a voz cheia de leveza ela elogiou:
- Alva Sonniger Morgen Michaelis, é um lindo nome.
Deixei escapar a dúvida que falava mais alto em minha mente:
- Mas como a criaremos? Ela é um anjo puro...
Minha esposa riu, depois explicou-me:
- A maldade do nosso mundo não penetra no coração dos inocentes, enquanto ela se ver como anjo, assim ela será.
Olhamos novamente para nossos pulsos e o nome Alva ganhava forma em uma delicada caligrafia. Agora eu tinha a minha menininha, pequena e linda Alva.
Eu realmente sou um demônio de sorte.

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Por Ela
أدب الهواة"Desde que Lizy contratou aquela mulher misteriosa para ser sua dama de companhia ela anda diferente." - Ciel. Elizabeth, uma jovem garota de 17 anos prestes a se casar com o rapaz a quem seu pai prometera a sua mão quando ainda era apenas um bebê. ...