Léo
— Léo? Você viu a chave do Lestat? Não encontro em lugar nenhum. — Ela andava de um lado para o outro da casa, e eu observava sentado na cama, acariciando nossa filha Pandora, a cachorrinha vira-lata que adotamos depois de encontrá-la numa trilha em Ribeirão Preto.
— Não sei, gordinha, você já olhou no seu quarto? — disse calmamente.
Ela parou e olhou para mim, desconfiada. — E o que minha chave estaria fazendo no meu quarto de livros, Léo?
Revirei os olhos — Por que não vai olhar? — Sorri ao ver Pandora alegre correr atrás dela saindo do quarto.
Contei mentalmente, e ouvi um grito. Nem conseguia parar de rir.
Ela entrou no quarto correndo outra vez, segurando a chave em uma mão, e o panfleto na outra.— O que é isso, Léo? — Ela sorria animada, e quase esfregou o papel na minha cara.
— Meu presente de um ano de casamento, gordinha. — Me levantei para agarrá-la. — Você gostou?
— Cê está falando sério? Meu Deus, a gente vai mesmo para o Dakar? — Ela estava tão eufórica que começou a pular, e a Pandora adorou participar da festa. — A g.e.n.t.e v.a.i p.a.r.a. o DAKAR!!!! — Ela gritou me abraçando. — Como você... Como?
— É no nosso período de férias, e tenho um amigo que vai para lá. Perguntei se a gente podia ir junto, a equipe deles é pequena, mas toparam deixar a gente ir.
Era mais que isso, era um presente para aliviar as tensões do último ano infernal que vivemos... Por vários motivos.
— Por quanto? — Ela ficou séria.
— Não interessa senhorita, só me diz se quer ir ou não, preciso fechar com ele.
— Ai Jesus... Claro que eu quero! — Ela grudou no meu pescoço. — Sabia que você é a melhor coisa que me aconteceu?
— Acho que essa fala é minha. — Eu ri para ela, a apertando ainda mais.
Ela me beijou — Tudo bem, não vou invocar com o valor, que eu sei que deve ser caríssimo, mas eu tenho um... Pedido, então.
Cerrei os olhos para ela — Pedido?
Ela assentiu, meio encolhida. — Sim, vamos passar o réveillon na praia, e direito dessa vez. Eu quero te ajudar...
— Elise, já fizemos isso ano passado, eu estou bem. Você não pode simplesmente esquecer isso?
Ela fez que não com a cabeça, com a cara de sapeca que me derrubava, pegando a pandora no colo, para dar ênfase a cara de dó. — Por favor, Léo, eu só quero...
— Não... Fora de questão Elise, vamos para onde quiser, mas eu...
— Léo... Vai com a Elise. – A Fá entrou no nosso quarto. — Você vai arrastar a menina por esses países esquisitos, o que custa você passar uns dias no litoral.
Fechei a cara para ela. — Eu não vou arrastá-la, Fá, ela está curtindo, acho que mais que eu, mas isso da praia, não vai me divertir. Pelo contrário.
Elise bufou. — Tudo bem, Léo, eu só digo uma coisa... Se eu fosse teimosa como você, ainda seriamos amigos, se é que me entende...
— Elise... — Eu ia resmungar, mas ela me deu um selinho, e se agarrou no pescoço da Fá.
— Fá me ensina a fazer bolo?
— Claro querida. — Elas me ignoraram e saíram do quarto.
— Vem Pandora! Vamos fazer bolo para o papi ficar alegre. Ele está rabugento hoje. — Ela riu.
E a estopa branca traidora a seguiu.
Mas que droga, eu ia mesmo acabar tendo que aceitar aquela viagem idiota.
Nesse tempo, eu pude ver que tudo que eu imaginava viver com ela, não era nem a metade de tudo que estava sendo. Eu não conseguia imaginar nada melhor apesar dos pesares, e a Pandora (sim, esse também é um nome de vampiro) veio para fechar nosso time, para formar nossa família de vez.***
Consegui! A convenci de que ficava apertado demais viajarmos no réveillon, já que antes do dia seis, teríamos que estar no Peru. Mas... Ela marcou para o natal, e ali estava eu, esperando ela acabar de confabular com a Fá para a gente ir. Pleno dia vinte e dois de dezembro... Sim, eu sou um zero à esquerda que faz tudo que ela manda. Às vezes não me orgulho disso...
Terminei de colocar as malas no Lestat, nos despedimos da Fá e da Pandora, que ficou com aqueles olhinhos tristes ao ver a gente indo embora, como sempre.
Descemos a serra, e ela conseguiu uma pousada “pé na areia” onde literalmente, se dormia ouvindo o mar. Se eu conseguisse dormir... Porque com aquele barulho, não tinha jeito.
Eram três da manhã, quando senti a mão fria dela pegar a minha, enquanto olhava pela janela, aquele mar se agitando na escuridão, aquele cheiro de maresia que me desconcentrava. E som. Que agora era real.
Olhei para ela, e ela sorriu para mim. — Está tudo bem, Léo?
— Não, eu queria dizer o contrário, mas não consigo relaxar, não sei...
Ela me puxou pela mão — Vem cá.
Caminhei com ela até a saída da pousada, e ela me levou até perto da água, se virou para mim, e colocou sua cabeça em meu peito.
— Léo, respira fundo. Que cheiro você sente?
Fechei os olhos, passei os braços por ela, e respirei fundo. — Maresia... E o seu.
— Você está com medo? — Ela sussurrou.
— Não.
Ela levantou a cabeça, e olhou para mim. — Então, me deixa te ajudar. Eu já ouvi sua história pela sua mãe, pelo seu pai, pela Fá. E só você tem essa cabeça deturpada que acha que aquilo foi culpa sua.
— Elise...
— Você era um pirralho demoníaco... Mas a morte do seu tio não foi culpa sua. Isso podia ter acontecido, mesmo sem sua arte de criança capeta, Léo. Você tem que superar. Eu quero te ajudar, como você me ajudou, tá? Você só precisa deixar.
Baixei a cabeça. Isso era totalmente diferente. De certa forma a comparação não cabia ali. Mas como sempre, eu sabia que ela só queria cuidar de mim. Ela não fez outra coisa nesse quase um ano, mesmo passando por todas as acusações e até as loucuras da minha mãe.
— O que quer que eu faça, doutora Elise? — Sorri a apertando.
— Nada, só quero que você se sinta bem, não se culpe, e se perdoe, se esse for o caso.
Fiquei calado. Essa Pimentinha... — Tudo bem, Elise... Eu vou tentar.
Ela sorriu de lado para mim — Tentar não, você vai conseguir... Sabe por quê?
Balancei a cabeça negativamente.
— Porque você é bom demais para ficar se remoendo, você me tirou do fundo do poço, me fez acordar, me consertou... Como pode uma coisa que aconteceu há tanto tempo, ainda atormentar a pessoa que você é hoje, Léo?
— Elise, eu sou um tonto... Não quero que se preocupe com as minhas nóias... Eu estou bem. Te juro que não vou mais deixar isso me incomodar.
Ela sorriu para mim. — Então... Que tal um mergulho? Hein, meu maridinho gostoso?
Eu ri. — Sério?
— Claro, não tem ninguém aqui, e de noite não preciso ficar de camiseta. — Ela sorriu me convidando.
— Ai Elise, tratamento de choque esse, né?. — Eu ri.
Ela se soltou de mim, e tirou as roupas entrando na água. Mas o que foi que eu fiz com essa Pimentinha? Meu Deus!
A segui para dentro d’água, desconfortável, mas como sempre, seu jeitinho me tirava o foco. Eu esqueci que estava numa praia, que estava na água de madrugada, eu só queria sentir seu corpo comigo. Aquilo de alguma forma me dava segurança, me acalmava. E mesmo depois de um ano, nada havia mudado. Ela ainda conseguia me deixar com cara de tacho. E me deixar completamente louco!
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Elise (Repostando)
Teen FictionRespondona, grossa, encrenqueira que não leva desaforo para casa, e com ótimo gosto musical. Elise é a faz tudo de uma equipe de Rally. Viajando com seu pai, seu irmão e os caras da equipe desde os 14 anos, ela foi obrigada á se encaixar nesse meio...