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      Na segunda de manhã, meu pai estava sentado no rancho da cozinha, olhando para o nada,  com os olhos cheios de lágrimas. Era assim todos os dias... Ele emagreceu alguns quilos, e suas roupas estavam mais largas que de costume, me doía olhar para ele, pensando se eu veria o meu pai forte e determinado de antes.

Me sentei ao seu lado e ele nem se mexeu.

- Oi, pai. – disse baixinho.

Ele não se virou, nem respondeu, ele estava apático. Não sei se ele não notava as pessoas, ou fingia não notar.

Pousei a mão delicadamente em seu braço esperando que ele me olhasse. Mas isso também não aconteceu. Que droga, eu não sabia o que fazer.

- Pai. Posso falar com você? – falei calmamente.

Ele virou o rosto para mim, mas seu olhar vazio me desconcentrou.

- Uns caras do Ivan vão vir dar uma olhada no Lestat para mim, tá? – Minha voz parecia a de uma criança acuada.

Ele só me encarou, e não respondeu.

- Pai, fala comigo... – implorei – Sinto sua falta... – olhar para o rosto dele, e não ver meu pai ali, era muito doloroso. – Você não vai falar comigo, né? – baixei os olhos, respirei fundo, e me levantei.

Como eu queria que ele virasse para mim e me desse uma bronca, que me pedisse explicações do porque viriam ver o Lestat. Eu estava preparada para brigar, mas aquela apatia... Aquilo, destroçava meu coração.

Voltei para o quarto, fechei a porta, e comecei a ler os papéis do Ivan, no meio deles, estava um contrato. Li todas as clausulas, era um bom contrato, o salário era o triplo do salário quase inexistente que eu tinha. Mas as obrigações eram sérias, bem diferentes de brincar de equipe. Assinando aquilo, eu estaria dando adeus a tudo como eu conhecia, mas também estaria entrando no caminho que eu sempre quis...

No meio da tarde, Ivan, Nildo e um cara que eu nunca havia visto na vida chegaram. Ivan me apresentou Ciro, (o cara estranho) ele era nosso maior patrocinador.

Os levei até a garagem do Lestat,  tirei a capa dele. Nildo me deu um abraço enquanto Ivan e Ciro rodeavam Lestat. Em seguida ele pegou a chave comigo, abriu o capô, deu a partida, e Ivan e Ciro conversavam sem parar. Eu estava cada vez mais ansiosa pela resposta.

Nildo desligou o motor, e se juntou a eles na conversa.

Alguns minutos depois, Ciro se virou, saiu da garagem com um breve aceno, e foi embora.

- E então? O que vocês acham? – perguntei quase tremendo.

Nildo sorriu – Você cuidou bem do seu Lestat, Elise. Ele é ótimo.

- Obrigada.

- Elise, vamos calcular os gastos que teremos com ele para saber se vai compensar. Já te adianto que Ciro não ficou muito impressionado. A ideia dele é ter dois 4x4, e seu carro não comporta isso. – Ivan parecia meio decepcionado com a ideia.

- Entendi. – fiquei cabisbaixa na hora.

- Você falou com seu pai a respeito? – Ele ficou mais sério.

- Falei, mas é como falar com o nada... – respirei fundo – Parece que ele está longe, sabe...

- Posso vê-lo, Elise? – Nildo interrompeu meus pensamentos.

- Claro. Vamos lá, talvez ele converse com vocês. – assenti para ele.

Cobri o Lestat, e levei Nildo até a porta da sala onde meu pai estava sentado, e voltei para a calçada para conversar com Ivan.

- Elise, independente do que acontecer com o seu carro, eu quero que você navegue com o Léo. – falou baixo, e eu via nele, que ele realmente queria aquilo.

- Tudo bem. Aliás, eu já assinei o contrato. – sorri para ele.

- Eu sei o quanto você quer isso,  mas de verdade, se isso for causar problemas entre você, e seu pai, eu...

- Ivan, não se preocupe, é a minha vida. E eu sou maior de idade. – o tranquilizei. – Meu pai me deixou, e eu tenho que tomar minhas decisões.

Ele balançou a cabeça para mim, concordando.

- Tudo bem, o Léo disse que vai passar pegar você.

- Tá bom. – concordei e fiquei constrangida, não sei bem o porquê, mas é que eu não estava acostumada com as pessoas falado sério assim comigo.

- Mandei fazer um macacão para você. – Ele sorriu.

Pensei no que ia dizer. – Ivan, se não houver problema, eu quero usar o macacão do Du.

Ele se surpreendeu, e seu olhar baixou com pesar.

- Nem que eu quisesse dizer não, eu conseguiria, Elise. Use. Talvez faça bem a você. – Ele colocou a mão em meu ombro.

- Obrigada, assim eu vou sentir que ele vai estar comigo lá.

- Entendo perfeitamente. Seu irmão vai fazer muita falta, Elise.

Esfreguei os olhos com as costas da mão, e sorri para ele.

Pouco tempo depois, Nildo se juntou a nós, arrasado. Pelo visto, ele também tinha sido afetado pelo olhar perdido do meu pai.

- Ele está pior do que eu imaginei... – Nildo me encarou com lágrimas nos olhos.

- Nem me fale, Nildo... Eu não perdi só o Du. Perdi ele também.

- Ah menina... Eu sinto muito. Que bom que o Léo tá te dando uma força...

- É, tá mesmo, sem ele, sei lá... Acho que estaria pior que meu pai.

Ele afagou meu cabelo. – Ele vai sair dessa, Elise, tenha fé, ele vai se recuperar.

Sorri para ele. - Tomara.

Eles se despediram, e foram embora, me sentei na calçada, incapaz de voltar para dentro. Eu queria tanto que desse certo com Lestat, pelo visto o tal Ciro não tinha ido muito com a cara dele.... Mas só de navegar com o Léo, já era um começo...

Elise (Repostando)Onde histórias criam vida. Descubra agora