[Hall Endres]
Não dormi — não por uma escolha minha, claro.
Tive que ficar acordado porque não queria dormir na rua, simplesmente não me sentia seguro em colocar minha mochila como travesseiro enquanto forçava meu corpo a relaxar. Era impossível. Havia frio, havia o terror de ser roubado ou qualquer coisa pior a qualquer momento... simplesmente não consegui, por isso caminhei até achar uma conveniência 24 horas e fiquei por lá. Uma mulher estava no balcão, digitando furiosamente no celular e fiquei com inveja dela por ter com quem conversar mesmo às duas da manhã. Quando me viu entrar, me olhou de modo esquisito — suspeito que não muita gente não compareça lá depois que passa das onze. A cumprimentei com um sorriso amarelo e perguntei se havia café. Ela se virou para a cafeteira elétrica à esquerda e disse, sem me olhar:
— Dois e cinquenta o copo pequeno. Grande, seis.
Na verdade, quando olhei os copos que ela falara, notei que quase não havia diferença entre o copo pequeno e o médio — poucos centímetros, aliás. Pedi dois copos do pequeno e foi quase como se eu tivesse conseguido um médio, só que mais barato.
A mulher, depois de me dar os copos de café — que estavam maravilhosamente perfeitos — perguntou se eu queria bolo ou torradas, ou até um salgado.
Antes que eu pudesse responder, ela apontou para o quadro de piloto pregado à parede à frente. Uma fatia de bolo custava quase oito reais.
— Não, obrigado — e beberiquei mais do meu café, querendo que durasse à noite inteira.
Eu não havia trazido muito dinheiro comigo. Fui demitido do meu antigo emprego em um pet shop por que fiquei doente por uma semana inteira, meu chefe disse que eu deveria ter avisado antes, como se eu pudesse prever que ficaria doente! Aceitei a demissão e o dinheiro do mês, depois disso, parei de procurar emprego por alguns dias para focar de novo na faculdade. O que eu tinha comigo eram exatos setenta e três reais, e eu podia sim, me dar ao luxo de comer um pedaço de bolo ou comprar um inteiro, mas a verdade é que preciso fazer milagre com esse dinheiro e, por ora, não estou tremendo de fome. Talvez eu tente testar meus limites.
Comecei quando fugi, continuei quando ignorei todas as mensagens e ligações de Nicholas que estava preocupado comigo. Agora, bebendo café em uma conveniência com uma mulher fofocando ao celular, eu sinto o peso das minhas ações mais do que nunca e eu poderia me remoer sobre isto, poderia mesmo mas...
Ele não sai da minha cabeça.
O cara que me salvou. Que bom que eu tenho internet no celular, pois pesquisei sobre ele. Sabia quem ele era, esteve em um site de fofocas recentemente por ter sido visto com ninguém mais ninguém menos que Natália Adélia, uma modelo e atriz que era como um anjo. Eles foram vistos juntos em uma daquelas festas chiques que ocorria nos quintais de uma mansão, com luzes penduras, mesas de toalhas brancas e flores para tudo que é lado. Eu poderia até saber o nome dele e que era um homem importante, mas eu não sabia quem ele era de verdade. Só não consigo lembrar do rosto perfeito dele e pensar que... que ele fez o que fez. Quantas pessoas podem impedir outras de se matarem só por estar em um lugar certo na hora certa? Me pergunto se se a situação fosse ao contrário, o que eu faria. O deixaria pular? Continuaria dirigindo como se não o tivesse visto? Não me considero uma pessoa empática e caridosa, mas também sei que não sou uma pessoa ruim — o que me apavora é o fato de que talvez eu não consiga decidir o que fazer porque tenho medo. Medo de ser gentil? Parece loucura, e é, mas tenho medo de arriscar minha vida por outra pessoa e suspeito que isso acaba com todas as minhas chances de me convencer que não sou totalmente ruim.
Esses pensamentos deixam minha cabeça latejando.
Às cinco da manhã eu já tinha bebido cinco pequenos copos de café. A moça disse que não ia me vender mais que isso porque eu já estava tremendo de tanta cafeína que ingeri. Não sabia que ela estava contando ou sequer me notando enquanto eu me sentei em um banquinho que achei no canto da parede. Me distrai olhando para as coisas já que também não podia me dar ao luxo de descarregar meu celular. Saber como vou fazer para carregar a bateria vai ser um desafio. Se bem que, se descarregar não tem problema, não estou esperando a ligação de ninguém. Quando vi o sol nascendo, decidi que precisava chegar a algum lugar e não ficar apenas andando.
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Minha Salvação | Série Irmãos Laurent-(Livro 1) (Romance Gay)
RomanceEm uma ponte no centro da Cidade, todos passam mas ninguém tenta impedi-lo para os que vagam ali ele é apenas mais um fazendo drama com a vida. Hall está prestes a cometer suicídio mas parece que no último segundo quando seus pés já estão em posição...