Amigos, termo romântico e adeus

433 48 253
                                    

"Come as you are, as you were
As I want you to be
As a friend, as a friend
As an old enemy"

- Come as you are

A noite havia sido fria, então Harry tentava se sentir grato pela luz do sol que alcançou sua janela. No entanto, ele sentia como se suas pernas pesassem toneladas e houvessem fantasmas segurando seu rosto contra o travesseiro.

- Harry! Desce ou vai se atrasar! - Gritou Jane do andar de baixo, e ele apenas se escondeu embaixo de seu cobertor.

Viver com Jane era como beber uma xícara de café bem forte e saber que está envenenada, ele bebia todos os dias, consciente de que aquilo o mataria aos poucos e aceitando seu destino. Afinal, ela era sua mãe e ninguém mais poderia fazer seu café todas as manhãs.

Harry conhecia todos os gostos que aquela xícara podia ter... O amargo da da solidão e culpa quando ela passava o dia na cama ou simplesmente o ignorava, o azedo da ansiedade e medo nos dias em que ela gritava, o doce enjoativo da desconfiança e tristeza quando ela acordava com energia e tentando se convencer de que era feliz, o sabor ácido da raiva quando ela era egoísta e dramática. E o gosto comum do café nos dias em que estava tudo bem, eles riam juntos e conversavam um pouco, sem muita intimidade ou interesse um no outro, apenas fazendo suas respectivas tarefas ou passatempos equanto convivem.

Mas naquele dia, 16 de dezembro de 1993, Jane parecia diferente de tudo o que ele já tinha experimentado.

O garoto desceu as escadas coçando os olhos, seus pés descalços em contato com o piso frio espalhavam arrepios por sua pele. Seus cabelos bagunçados faziam cosquinha em seu nariz, e ele estava pateticamente pensando em Louis Oliver. Mais especificamente em seu cheiro de shampoo caro, e em como estava por toda parte depois que o garoto lhe emprestou uma blusa no dia anterior.

Um sorriso amoado se formou sem sua permissão, ele entrou na cozinha e avistou Jane na frente do fogão, fazendo ovos mexidos.

- O que você ta aprontando aí? - Harry questionou se sentando á mesa.

- Café da manhã - Ela respondeu simplesmente, ainda não havia a falsa doçura em sua voz, aquela que se fazia presente nos dias em que ela fingia ser feliz.

Tinha alguma coisa errada.

- Tomou seus remédios?

- Sim Harry, não precisa cuidar tanto de mim - Seu tom tentava esconder danação, era como se ela quisesse agradar seu filho, apesar de seus sentimentos conflituosos - E você, tomou os seus?

- Não, eu tenho dormido bem sem eles - Respondeu ao abaixar a cabeça, os dedos dos pés encolhidos quando ele começou a sentir o frio daquela manhã de inverno.

- Acho que deveria continuar pelo menos com o das manhãs, já que não consegue se controlar na escola - Alfinetou ela, enquanto passava os ovos prontos para dois pratos de porcelana antiga.

Harry ficou em silêncio, Jane tinha opiniões fortes sobre a expulsão e todas as vezes em que ele faltava ás aulas. Ele deu de ombros e aceitou os comprimidos, porém a verdade era que ele não sabia porque tomava aquilo a tanto tempo.

Desde muito novo, Harry se lembra dos remedios para dormir, e haviam aqueles que ele teve que adicionar em sua rotina depois que Lucy morreu. Contudo, ele nunca tinha visto médico nenhum que pudesse dizer a ele porque ele precisava daquilo, mas sua mãe dizia que seria melhor assim, e em alguns dias ele sentia que realmente era.

Louis não sabia sobre isso, ele com certeza já tinha feito uma nota mental sobre o gosto do beijo de Harry se parecer com hortelã e remédios. Não tem nada no diário sobre os comprimidos, no entanto. Porque ele achava que isso era completamente normal, um fato sem importância que está na vida de toda criança e não vale a pena comentar.

I can't look up to the sky ☆ (l.s.)Onde histórias criam vida. Descubra agora