63 - Bicudinho

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Voltei rápido, hein.

Boa leitura!

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Camila

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Ele esperneou e gritou.

- Bear, eu não posso deixar você comer cocô de porco! - insisti, mas ele continuou gritando e chorando como se o mundo fosse acabar.

Fiquei chocada com seu sofrimento e quase tentada a deixar ele comer a caca de Lucas.

Seria muito errado?

- Coisinho... - tentei e ele berrou - e se a gente for brincar?

Ele berrou e se jogou no chão. Seu rosto estava vermelho como um tomate porque é tão rechonchudo quanto, e completamente molhado de lágrimas e meleca.

Certo. O que a Lauren faria?

Até tentei pensar, mas o barulho de seu desespero travava meu cérebro.

Lauren tinha ido buscar a pequenininha na casa dos filhos do corretor de imóveis e estava demorando até demais.

Eu não sabia o que fazer. Esse mini ser humano se esgoelando e se debatendo no chão era completamente estranho, pequeno e assustador.

Desisti.

Sentei ao lado dele e esperei, minhas mãos brincando com um ursinho que combinava com sua roupa enquanto tentava pensar em algo em meio ao desespero dele e meu.

Temi que se machucasse e temi que eu o machucasse se tentasse qualquer manobra.

O criaturinho não falava quase nada, então nem dava para sentar e trocar uma ideia de forma que nós dois entendessemos. A tradutora da maior parte dos códigos de Bear era Lauren, que estava em sua segunda experiência com bebês.

Eu era uma mãe horrível!

Meu filho estava se debatendo no chão e chorando como se estivesse morrendo porque eu não conseguia convencer ele a não comer cocô de porco.

Meus olhos arderam e percebi que comecei a chorar quando tudo ficou borrado.

Que inferno!

Por que eu concordei em termos outro filho? Eu sou péssima com crianças!

Não que eu não o amasse, mas eu era um desastre como mãe.

Como eu poderia acalmar essa criança, meu Deus?

Eu deveria deixar ele comer cocô para entender que não é legal?

Mas e se ele gostasse e eu fosse responsável por viciar nosso filho em cocô de porco?

Meu coração pareceu se apertar. Era eu chorando de um lado e Bear do outro.

Ouvi a porta e as vozes animadas que se mativeram por um segundo, mas não consegui me acalmar e fingir que estava lidando bem com o problema.

- Cake, suba - ouvi Lauren mandar antes de sentir sua presença perto de nós - o que aconteceu, amor? Vocês se machucaram?

Ela também não mexeu com Bear antes de falar comigo.

- Ele quer comer o cocô do Lucas! - contei, soluçando que nem uma idiota de tanto que chorava - eu não sei o que fazer!

Lauren sentou entre nós e me puxou para deus braços.

- Tudo bem. Tudo bem - murmurou - é assim mesmo, eles choram como se o mundo estivesse acabando, mas passa. Você não fez nada de errado, pelo contrário.

Seu tom era reconfortante, mas não era uma verdade.

- Chorando com ele? - o tom simplesmente me escapou, mas Lauren ignorou.

- Não, amor. Ficando ao lado dele - me disse enquanto acariciava meus cabelos - vamos ficar aqui juntinhos.

- Mas ele não para...!

- Vai parar - Lauren garantiu - Bear, a mamãe e eu estamos aqui com você para quando quiser um abraço.

Como ela conseguia ficar calma?

- Eu sou uma mãe horrível! - chorei, me segurando para não dizer que não deveríamos ter tido outro filho para não magoar Lauren com algo que era unicamente drama.

- Não, não é - Lauren ainda estava calma - venha, ofereça a ele um abraço.

Minha esposa secou as lágrimas de meu rosto com carinho e paciência como apenas ela era capaz.

Eu queria me jogar de um precipício.

Respirei fundo algumas centenas de milhares de vezes e pisquei até o chorão entrar em foco.

- Bear, você quer um abraço? - ofereci - eu estou aqui para quando quiser um abraço de mãe. Eu...

Olhei para Lauren, me sentindo um tanto tímida em ser vulnerável com uma criança quando eu sempre dou uma de durona e até indiferente e distante.

Ela assentiu como se soubesse de tudo o que eu estava sentindo, mas eu preferi fingir que estávamos sozinhos e Lauren estava só dentro de mim me encorajando. Era íntimo.

Me voltei para Bear, me inclinando um pouco em sua direção ignorando seus gritos.

- Ei, a mamãe está aqui - lembrei de Lauren acalmando as crianças justamente porque ela estava ali me acalmando - eu sei que dói não ter o que queremos e... tudo bem ficar chateado, mas se você quiser podemos nos abraçar ou... vou ficar com você até se sentir melhor.

Esperei.

Bear continuou chorando, o que era uma agonia porque parecia que toda minha vulnerabilidade tinha sido em vão.

Senti que não prestava como mãe nem tentando com todas as minhas forças.

Olhei para Lauren, que balançou a cabeça indicando que eu tinha ido bem.

Se ela dizia, então devia estar certa.

Fiquei quieta, mas com o coração explodindo observando o coisinho chorar e espernear até que...

Ele parou.

Bear puxou uma longa respiração, como se estivesse tentando sugar o juízo para dentro do corpo, e aí parou.

Observei o garoto sentado olhando para o chão com um biquinho idêntico ao de Lauren. Impossível dizer que não eram mãe e filho.

Ainda assim, o que me surpreendeu foi que ele realmente parou de chorar. E o que me surpreendeu ainda mais foi que... eu estava cantarolando.

Nem percebi, mas era aquela musiquinha besta do "cabeça, ombro, joelho e pé".

Parei na hora. Sei lá, fiquei com vergonha.

Só observei o bicudinho respirar fundo e soluçar ameaçando voltar a chorar, então cantarolei de novo e...

Bear se atirou em meus braços!

O abracei de volta, cantarolando porque aquilo pareceu ser o que tinha ajudado a acalmá-lo e ele ficou ali, em meus braços como se eu tivesse feito a coisa certa o tempo todo.

No fim, eu não precisei deixar que ele comece caca, apenas que tivesse seu momento de frustração. Quando se sentiu pronto o coisinho simplesmente recorreu a mim.

Era isso.

Talvez eu tivesse encontrado um jeito de nos comunicarmos.

- Eu te amo, coisinho - sussurrei para ele porque apenas ele importava.

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Até mais!

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