Atenção: esse recorte trata da primeira internação da Lauren pelo distúrbio alimentar. É triste.
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Lauren
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Abri meus olhos. Eles ardiam. Havia muita luz e algo irritante em meu nariz, dentro de meu corpo.
- Lauren? - era a voz de meu pai e virei o rosto para vê-lo com seus olhos inchados de choro - filha...
Ouvi um barulho de sino que doeu no fundo de meus ossos. Eu não conseguia falar nada, minha garganta parecia um deserto.
- Boa tarde, Lauren - um homem de jaleco, certamente um médico que sequer vi entrar na sala, me cumprimentou - fico feliz em ver que está acordada. Sabe por que está aqui?
Neguei com a cabeça.
- Você desmaiou quando saiu do carro quando te deixamos na escola - papai contou. Tentou em vão engolir um soluço e segurar uma lágrima. Me senti partir ao meio por causar isso nele - querida, sentimos tanto, tanto medo de você não acordar mais!
Ouvi um barulho novamente. Uma porta se abrindo e fechando com força, e mamãe surgiu acima de meu rosto, sua mão quente na minha e seu olhar aflito.
- Lauren! - ela exclamou sem nem tentar conter o choro - por favor, por favor, nunca mais faça isso com você mesma! Isso é... porra, Lauren!
Eu nunca vi mamãe tão colérica. Geralmente minha família era muito carinhosa e amorosa. Cresci em um lar seguro.
Olhei para o médico sem entender nada e ele compreendeu minha confusão.
- Você vai ficar bem, mas apenas se seguir um tratamento para seu distúrbio alimentar. Sua família concordou em interná-la, mas gostaria de oferecer essa opção diretamente a você. Prometo que irá para um lugar acolhedor e ficará bem em breve - ele disse.
O quê?
- Não! - consegui expelir as palavras por minha garganta desértica.
Eles estavam malucos! Eu não preciso disso. Internação? Um exagero sem cabimento!
- Lauren - começou o médico novamente, muito sério - você está muito desnutrida. Está dentro do peso mínimo de uma criança de nove anos. Se continuar nesse ritmo, você vai morrer. Você quase não sobreviveu. Teve duas paradas cardíacas a caminho do hospital e um inchaço cerebral da queda que sofreu. Seu corpo não está mais conseguindo funcionar. Precisamos colocar essa sonda de alimentação para que receba nutrientes e sobreviva. Estamos oferecendo que continue viva. Que termine a escolha, siga em frente saudável com sua família e amigos até uma idade avançada.
Isso não era verdade. Digo, não tinha como ser verdade. Eu me olhava no espelho, ok? Eu via como estava grande e horrível.
- Lauren, por favor - olhei para mamãe, que implorava enquanto chorava profundamente.
- Com licença - o médico pediu e se aproximou, pegando meu braço e fechando os dedos em meu bíceps, os dedos se tocando - você vê? Uma pessoa acima do peso não deveria conseguir que minha mão se fechasse.
Olhei para sua mão. Não sei...
Ele tocou minhas costelas sobre a roupa e o cobertor.
- Não poderia sentir seus ossos assim se estivesse acima do peso, muito menos os das suas costas - ele continuou - o espelho nem sempre está certo.
Ele compreendeu exatamente como eu me via, e isso foi assustador.
- Vou deixá-la com sua família, mas pense sobre o que conversamos. Só queremos que fique saudável. A beleza está nisso.
O médico olhou os aparelhos, os líquidos que invadiam meu corpo, meus olhos, meus pais, e saiu.
Olhei mamãe e papai, que choravam.
- Por favor, Lauren - mamãe implorou.
Papai segurou a mão que mamãe não dominava e a apertou. Eles eram muito quentes ou o quarto estava congelando.
- Não pode se entregar aos seus medos, Lolo - ele disse - uma imagem no espelho é só uma imagem no espelho. Crianças más, e eu sei que elas existem, são apenas isso. Você é muito linda e preciosa. E tem tanto para viver ainda! Não nos deixe... não se deixe.
- Você é uma vitoriosa, Lauren - mamãe fungou - desde que soubemos que estava aqui, dentro de mim. Sempre foi nossa garotinha corajosa que consegue tudo. Nossa linda garotinha...
Desviei os olhos para mim mesma, tentando entender e digerir que eu estava me matando sem querer. Me matando para me sentir bonita e suficiente. Acontece que... não tem como ser o suficiente se você está morta.
Talvez, só talvez, eu estivesse no caminho errado.
E eu não queria magoar ninguém. Não queria fazer minha família chorar e passar por um luto doloroso por minha causa. Nenhum filho deveria morrer antes dos pais, é crueldade.
Por isso assenti, concordando, e depois de uma semana em sonda e soro me levaram para uma casa de campo onde estavam outras seis pessoas, uma delas parecendo não ter mais de dez anos, o que era assustador.
Eu ouvi suas histórias e vi seus absurdos. Nenhum deles era coerente o bastante em suas percepções, e depois de uns dias notei que provavelmente todos pensavam o mesmo sobre mim.
Não é que eu conseguisse ser correta no que deveria sempre. Não é como se eu compreendesse o tempo todo que eu precisava dar um passo assustador e contra tudo o que eu fazia por mim. Não é como se eu não tivesse teimado e resistido algumas vezes. Era tudo sempre muito difícil. Comer e deixar o alimento ali, dentro de meu corpo, era um sacrifício tão grande que poderia me esfaquear e a dor não seria tão grande. Tive recaídas e rejeições.
Mas ainda assim, eu continuei. O primeiro motivo foi por minha família, só depois por mim. Eu queria viver, sabe? Terminar a escola, trabalhar em minha Cookies n Coffee, constituir minha própria família. Então eu continuei em meu despertar rude para a vida, porque como mamãe havia dito, eu era uma vitoriosa.
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Eu tinha acabado de assistir "o mínimo para viver" e decidi escrever esse recorte. É um filme bom pra entenderem um pouquinho da visão de pessoas com distúrbios alimentares. Cheguei até a dizer nas fics que ela quase morreu duas vezes por causa disso. Isso aqui foi antes de ela desenvolver tanto bulimia quanto anorexia e compulsão alimentar. E também compulsão por exercícios e estilo de vida saudável, como vimos até em alguns recortes.
E é isso aí. Se cuidem, pessoal.
Abraços e até a próxima.
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LIVRO 5 - EXTRA TRILOGIA - Recortes - Histórias Aleatórias Da Trilogia
FanficLeia depois da trilogia! Momentos aleatórios da trilogia de With All My Love que surgem em minha mente vez ou outra, alugando um triplex até que eu coloque para fora. De dentro de mim e diretamente para vocês: recortes da trilogia. Com amor, autora.