69 - Rude despertar

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Atenção: esse recorte trata da primeira internação da Lauren pelo distúrbio alimentar. É triste.

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Lauren

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Abri meus olhos. Eles ardiam. Havia muita luz e algo irritante em meu nariz, dentro de meu corpo.

- Lauren? - era a voz de meu pai e virei o rosto para vê-lo com seus olhos inchados de choro - filha...

Ouvi um barulho de sino que doeu no fundo de meus ossos. Eu não conseguia falar nada, minha garganta parecia um deserto.

- Boa tarde, Lauren - um homem de jaleco, certamente um médico que sequer vi entrar na sala, me cumprimentou - fico feliz em ver que está acordada. Sabe por que está aqui?

Neguei com a cabeça.

- Você desmaiou quando saiu do carro quando te deixamos na escola - papai contou. Tentou em vão engolir um soluço e segurar uma lágrima. Me senti partir ao meio por causar isso nele - querida, sentimos tanto, tanto medo de você não acordar mais!

Ouvi um barulho novamente. Uma porta se abrindo e fechando com força, e mamãe surgiu acima de meu rosto, sua mão quente na minha e seu olhar aflito.

- Lauren! - ela exclamou sem nem tentar conter o choro - por favor, por favor, nunca mais faça isso com você mesma! Isso é... porra, Lauren!

Eu nunca vi mamãe tão colérica. Geralmente minha família era muito carinhosa e amorosa. Cresci em um lar seguro.

Olhei para o médico sem entender nada e ele compreendeu minha confusão.

- Você vai ficar bem, mas apenas se seguir um tratamento para seu distúrbio alimentar. Sua família concordou em interná-la, mas gostaria de oferecer essa opção diretamente a você. Prometo que irá para um lugar acolhedor e ficará bem em breve - ele disse.

O quê?

- Não! - consegui expelir as palavras por minha garganta desértica.

Eles estavam malucos! Eu não preciso disso. Internação? Um exagero sem cabimento!

- Lauren - começou o médico novamente, muito sério - você está muito desnutrida. Está dentro do peso mínimo de uma criança de nove anos. Se continuar nesse ritmo, você vai morrer. Você quase não sobreviveu. Teve duas paradas cardíacas a caminho do hospital e um inchaço cerebral da queda que sofreu. Seu corpo não está mais conseguindo funcionar. Precisamos colocar essa sonda de alimentação para que receba nutrientes e sobreviva. Estamos oferecendo que continue viva. Que termine a escolha, siga em frente saudável com sua família e amigos até uma idade avançada.

Isso não era verdade. Digo, não tinha como ser verdade. Eu me olhava no espelho, ok? Eu via como estava grande e horrível.

- Lauren, por favor - olhei para mamãe, que implorava enquanto chorava profundamente.

- Com licença - o médico pediu e se aproximou, pegando meu braço e fechando os dedos em meu bíceps, os dedos se tocando - você vê? Uma pessoa acima do peso não deveria conseguir que minha mão se fechasse.

Olhei para sua mão. Não sei...

Ele tocou minhas costelas sobre a roupa e o cobertor.

- Não poderia sentir seus ossos assim se estivesse acima do peso, muito menos os das suas costas - ele continuou - o espelho nem sempre está certo.

Ele compreendeu exatamente como eu me via, e isso foi assustador.

- Vou deixá-la com sua família, mas pense sobre o que conversamos. Só queremos que fique saudável. A beleza está nisso.

O médico olhou os aparelhos, os líquidos que invadiam meu corpo, meus olhos, meus pais, e saiu.

Olhei mamãe e papai, que choravam.

- Por favor, Lauren - mamãe implorou.

Papai segurou a mão que mamãe não dominava e a apertou. Eles eram muito quentes ou o quarto estava congelando.

- Não pode se entregar aos seus medos, Lolo - ele disse - uma imagem no espelho é só uma imagem no espelho. Crianças más, e eu sei que elas existem, são apenas isso. Você é muito linda e preciosa. E tem tanto para viver ainda! Não nos deixe... não se deixe.

- Você é uma vitoriosa, Lauren - mamãe fungou - desde que soubemos que estava aqui, dentro de mim. Sempre foi nossa garotinha corajosa que consegue tudo. Nossa linda garotinha...

Desviei os olhos para mim mesma, tentando entender e digerir que eu estava me matando sem querer. Me matando para me sentir bonita e suficiente. Acontece que... não tem como ser o suficiente se você está morta.

Talvez, só talvez, eu estivesse no caminho errado.

E eu não queria magoar ninguém. Não queria fazer minha família chorar e passar por um luto doloroso por minha causa. Nenhum filho deveria morrer antes dos pais, é crueldade.

Por isso assenti, concordando, e depois de uma semana em sonda e soro me levaram para uma casa de campo onde estavam outras seis pessoas, uma delas parecendo não ter mais de dez anos, o que era assustador.

Eu ouvi suas histórias e vi seus absurdos. Nenhum deles era coerente o bastante em suas percepções, e depois de uns dias notei que provavelmente todos pensavam o mesmo sobre mim.

Não é que eu conseguisse ser correta no que deveria sempre. Não é como se eu compreendesse o tempo todo que eu precisava dar um passo assustador e contra tudo o que eu fazia por mim. Não é como se eu não tivesse teimado e resistido algumas vezes. Era tudo sempre muito difícil. Comer e deixar o alimento ali, dentro de meu corpo, era um sacrifício tão grande que poderia me esfaquear e a dor não seria tão grande. Tive recaídas e rejeições.

Mas ainda assim, eu continuei. O primeiro motivo foi por minha família, só depois por mim. Eu queria viver, sabe? Terminar a escola, trabalhar em minha Cookies n Coffee, constituir minha própria família. Então eu continuei em meu despertar rude para a vida, porque como mamãe havia dito, eu era uma vitoriosa.

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Eu tinha acabado de assistir "o mínimo para viver" e decidi escrever esse recorte. É um filme bom pra entenderem um pouquinho da visão de pessoas com distúrbios alimentares. Cheguei até a dizer nas fics que ela quase morreu duas vezes por causa disso. Isso aqui foi antes de ela desenvolver tanto bulimia quanto anorexia e compulsão alimentar. E também compulsão por exercícios e estilo de vida saudável, como vimos até em alguns recortes.

E é isso aí. Se cuidem, pessoal.

Abraços e até a próxima.

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